Agnes (Ana) teve a gentileza de fazer este relato para publicação, e diz: “O meu pai sempre tem prazer em contar como foi o seu chamado para o campo missionário e vou tentar reproduzir sucintamente, usando as suas próprias palavras”:
Eu me converti aos doze anos, depois de ouvir uma mensagem onde o pregador citou o versículo: “o meu Espírito não agirá para sempre no homem” (Gn. 6:3), e como era a terceira vez que Deus me convencia do pecado e da necessidade do arrependimento para a conversão, senti naquela noite como se fosse 'agora ou nunca' e me entreguei ao Senhor Jesus como meu Salvador.
Nestes anos todos, fui infiel muitas vezes, tive dias de fraqueza espiritual, mas nunca, nunca duvidei da minha salvação. Cresci junto com meus irmãos (que eram quatro, mais uma irmã) e os jovens da igreja, freqüentando todas as reuniões e participando, na medida do meu crescimento, de todas as atividades da igreja local - Shiloh Hall, Glasgow, Escócia.
Junto com um grupo de amigos fazíamos pregações ao ar livre no centro de Glasgow, e eu era um dos ”Acampantes da Tenda Verde do Evangelho“, passávamos parte das nossas férias armando a nossa barraca em algum lugar de praia ou em alguma vila no campo e não só descansávamos, mas também pregávamos o Evangelho.
Namorei uma jovem, amiga desde a infância, a Leila Crawford, e já durante o namoro conversávamos sobre o desejo de servir ao Senhor onde Ele nos mostrasse, com algum interesse no exterior, mais especialmente Índia ou África. A Leila então resolveu estudar enfermagem sentindo que com isto estaria mais preparada para servir ao Senhor. Casamo-nos em 1936, eu trabalhava como vendedor, montamos o nosso lar em um apartamento muito bonitinho e continuamos muito felizes trabalhando e ajudando os irmãos de Shiloh Hall nas diversas atividades.
Certa noite, depois de uma reunião, voltávamos a pé para casa na companhia de outra irmã de mais idade, que a certa altura nos disse: "Willie, eu sempre achei que você estaria ocupado no serviço do Senhor". As suas palavras tiveram um forte impacto, mas eu ri e respondi: “Eu estou ocupado no serviço do Senhor”, ao que ela retrucou seriamente: “Você sabe muito bem o que eu quero dizer”. E eu sabia mesmo! Aquela noite eu e Leila conversamos e oramos mais uma vez colocando-nos à inteira disposição do Senhor.
Porém, em vez de as portas se abrirem diante de nós, aconteceu o contrário e eu contraí uma enfermidade, muito séria para a época - tuberculose! E agora, Senhor? O que fazer? O que será do nosso chamado?
Começou então um período de tratamento muito sério, no qual fui muito ajudado pela minha esposa e sua família, ficando hospedado por alguns meses na fazenda dos seus pais onde o ar era mais puro. Durante todo este período tínhamos sempre em mente que o Senhor nos chamara, e que este era apenas um período transitório de espera e de treinamento para o serviço que viria a seguir.
Finalmente o médico deu o diagnóstico de que eu estava curado e as portas começaram a se abrir novamente. Ouvimos, certo dia, o relatório de um missionário que trabalhava na Argentina e o nosso coração foi tocado, mas o caminho não se abriu para aquele país, embora as nossas atenções já estivessem voltadas para a América do Sul. Logo depois veio às nossas mãos um livro chamado “Aventuras com a Bíblia no Brasil" escrito por F.C.Glass, contando a sua experiência como colportor e suas aventuras distribuindo e vendendo Bíblias.
Nesta época, também tivemos o privilégio de receber em nossa casa para um fim de semana o Sr. John Murray, convidado pela igreja local para uma série de reuniões especiais. Esta era a sua primeira viagem de volta à Escócia, bastante doente devido à verminose que o atacara. Falou-nos do trabalho no interior de Minas Gerais, em Ituiutaba, e da necessidade de mais obreiros naquele grande país.
Mais ou menos na mesma época ficamos conhecendo o Sr. Edward Hollywell, que servia ao Senhor em São Paulo, que também nos contagiou com seu entusiasmo pelo trabalho do Senhor naquele país tão grande e para nós praticamente desconhecido. Sentimos então com certeza que o Senhor nos chamava para o Brasil. Era uma convicção serena que resultou em paz e alegria interior. Durante todo este tempo os irmãos de Shiloh Hall nos deram todo o seu apoio em ajuda e oração.
Começamos os preparativos e depois de alguns meses partimos da Central Station em Glasgow, no dia 25/03/1938, quando um grupo grande de irmãos (umas duzentas pessoas) foi se despedir de nós. Enquanto o trem lentamente deixava aquela plataforma os nossos jovens corações batiam mais fortes sentindo já a saudade que seria nossa companheira pelo resto dos nossos dias e ao mesmo tempo a força e o poder que o Senhor nos dava, junto com o desejo ardente de levar a gloriosa mensagem do Evangelho àqueles que não a conheciam. Enquanto o trem ganhava velocidade ouvíamos cada vez mais longe as vozes que cantavam, até que o único som era o do trem que nos levava para cada vez mais longe dos nossos queridos, e o nosso coração se elevava ao Senhor em oração para que Ele nos abençoasse e nos usasse no Brasil.
Partimos de Londres no dia seguinte a bordo do navio Highland Monarch. Enquanto observávamos a terra se distanciar cada vez mais, que desolação encheu o nosso coração. Ansiedade, saudade, expectativa... Fortalecemo-nos, porém, no Senhor lembrando que Ele estaria conosco onde quer que fôssemos, e o que poderíamos desejar mais? Chegamos a Santos depois de 22 dias de viagem, após termos passado por Recife e Salvador onde a beleza deste país, já amado por nós, acabou de nos conquistar.
Em São Paulo, fomos recebidos pelos irmãos Sr. Edward Hollywell e Sr. Frederick Smith, com quem ficamos hospedados por alguns meses aguardando a direção do Senhor quanto ao próximo passo. Depois de uma passagem rápida por Ituiutaba, fomos para São Joaquim da Barra onde pudemos ver almas salvas e uma igreja estabelecida. Depois da morte do Sr. Alexandre Simpson em 1950 mudamo-nos para Uberaba, onde estou até hoje, sempre na dependência da direção do Senhor.
NR. Este amado irmão foi levado ao céu pelo Senhor para estar em Sua presença em 15 de agosto de 2005.