Os sacerdotes, o capitão da guarda do templo e os saduceus foram atraídos por aquela multidão que se reunira para ver o milagre que havia sido realizado e agora ouvia a explicação de Pedro.
Os sacerdotes tinham uma influência especial na política do país e muitos eram parentes do sumo sacerdote. O capitão da guarda do templo obedecia às suas ordens. Os saduceus eram membros de uma seita religiosa judaica poderosa que não acreditava na ressurreição dos mortos. Esses líderes religiosos eram os que tinham mais a ganhar financeiramente ao cooperar com os romanos (os fariseus não estavam no grupo, e sabemos que alguns dos seus líderes se haviam convertido, como José de Arimatéia e Nicodemos).
O que Pedro dizia muito os indignava, pois foram eles que haviam planejado a apreensão e incentivado a crucificação do Senhor Jesus. A notícia que estava divulgando no templo, dando seu testemunho pessoal da ressurreição do Senhor Jesus, era especialmente nociva para eles pois, se fosse verdade, o crime que haviam cometido ficaria provado (eram duas testemunhas, ele e João), e perderiam toda a sua autoridade. Precisavam calar os dois apóstolos, portanto prenderam os dois até o dia seguinte, pois já estava anoitecendo, e não era permitido ter uma reunião do sinédrio para fazer julgamento à noite.
Não obstante, perto de cinco mil homens dentre a multidão, que ouviram o testemunho de Pedro e a sua explicação sobre o cumprimento das profecias na pessoa de Jesus Cristo, creram.
No dia seguinte, realizou-se em Jerusalém uma grande reunião das três classes que compunham o tribunal superior, ou sinédrio: as autoridades (chefes dos sacerdotes que eram saduceus), os escribas (geralmente fariseus), e os anciãos (presbíteros, líderes do povo) na seguinte proporção: 24 sacerdotes, 24 anciãos, e 22 escribas.
Anás era sumo-sacerdote, posição vitalícia segundo a lei mosaica (Números 35:25), mas as autoridades romanas nomearam seu genro Caifás para tomar o seu lugar no ano 14 A.D., após apenas 7 anos.
Supõe-se que João era filho de Anás, e Alexandre era um homem de destaque naquele tempo, segundo o historiador Josefo. Os outros, que “eram da linhagem do sumo sacerdote”, desejando continuar em seu agrado, decerto iriam aprovar o que ele determinasse.
Iniciaram a inquisição indagando dos apóstolos “Com que poder ou em nome de quem fizestes vós isto?” Foi semelhante à pergunta que os chefes dos sacerdotes e os líderes religiosos haviam feito ao Senhor Jesus poucas semanas antes: “Com que autoridade fazes tu estas coisas? e quem te deu tal autoridade?” (Mateus 21:23).
O Senhor Jesus, o Filho de Deus, era Ele próprio a autoridade soberana no templo e a Sua resposta sábia confundiu essas pequenas “autoridades”. A pergunta feita aos apóstolos implica que deveriam estar agindo em função ou em lugar de alguém que tinha um poder superior. Sem dúvida isto era realmente a verdade, o que Pedro, cheio do Espírito Santo, prontamente esclareceu em poucas palavras. Era uma oportunidade excelente para expor o Evangelho pela terceira vez, agora para as autoridades civis e religiosas do país.
Foi um discurso curto e direto, dirigido aos que haviam crucificado o seu querido Mestre. Declarou que ele e João haviam sido trazidos perante o tribunal para:
Prestar contas sobre um benefício feito a um enfermo. Não disse, mas ficou claro que não eram malfeitores, mas benfeitores, portanto não poderiam sofrer castigo. Além disso, essas autoridades podiam ver o mendigo diariamente na porta do templo, e não o curaram, porque não podiam.
Declarar como se dera a cura. Um médico dificilmente é chamado a um tribunal para informar como cura os doentes, pois curar não é crime.
Não obstante, Pedro prosseguiu com a sua “defesa” informando ao tribunal e a todo o povo de Israel (representado pelo tribunal):
A cura se dera em nome de Jesus Cristo, o nazareno, “aquele a quem vós crucificastes e a quem Deus ressuscitou dentre os mortos”.
Ao dizer Jesus Cristo, Pedro está esclarecendo que Ele é o Messias das profecias (Cristo é o equivalente em grego de Messias). Eles não podiam negar que O haviam crucificado. E que Deus O havia ressuscitado dentre os mortos Pedro podia declarar com certeza, pois O vira e estivera com Ele.
Jesus Cristo era “a pedra que foi rejeitada por vós, os edificadores, a qual foi posta como pedra angular”. Esta é uma profecia no Salmo 118:22, que aqueles judeus religiosos deviam conhecer muito bem. Provavelmente não compreendiam o seu sentido, dado o contexto que fala sobre a “porta do Senhor” e da salvação, que, agora sabemos, tratam do Senhor Jesus. Ele foi rejeitado e morto pelos religiosos judeus, os “edificadores”, mas Deus O ressuscitou e colocou sobre todas as coisas, e a Sua igreja está sendo construída sobre Ele, a “pedra angular” indispensável, sobre a qual se baseia toda a sua estrutura. Pedro discorre sobre este assunto em sua primeira epístola (2:1-8).
Não há salvação em nenhum outro porque “debaixo do céu nenhum outro nome há, dado entre os homens, em que devamos ser salvos.”
Com estas palavras vibrantes Pedro terminou a sua defesa diante do tribunal. A transformação operada naquele pescador galileu, que três vezes havia negado com juramento ser discípulo do Senhor, foi impressionante. A sua declaração simples e clara, sem rodeios, havia em poucos minutos provado a sua inocência e ainda revelado a grande culpa dos líderes judeus que ocupavam o tribunal.
A intrepidez com que Pedro se apresentou diante daquelas “autoridades” ilustres mereceu a admiração delas, e a sua convicção evidenciou que ele e João haviam estado com Jesus ressurrecto.
A transformação em Pedro foi devida não só à absoluta certeza que agora tinha sobre a identidade e a posição do Senhor Jesus, mas também à ação do Espírito Santo que o enchia. Ainda hoje o Espírito Santo transforma os homens e mulheres para que estejam aptos a exercer sua função na igreja, seja na obra missionária, no ministério, no apoio dos trabalhadores, etc.
O homem que fora curado também estava em pé com Pedro e João, testemunha inegável do milagre sobrenatural feito em nome do Senhor Jesus, e o tribunal era forçado a aceitar mais essa evidência que o testemunho de Pedro era verdadeiro. Era agora impossível negar os fatos.
As “autoridades” ordenaram que os três “réus” fossem retirados do recinto do sinédrio a fim de que elas pudessem deliberar sobre o que fazer diante destas circunstâncias imprevistas.
Sua preocupação maior era que chegasse ao conhecimento de todos aquilo que Pedro e João proclamavam, ou seja, a identidade de Jesus Cristo e a Sua ressurreição, evidenciando o grande pecado que havia sido cometido pelos líderes do povo.
Não podiam encarcerá-los sem condenação, e não podiam condená-los por terem feito uma cura nem por darem testemunho daquilo que viram e ouviram.
Decidiram soltá-los com uma admoestação severa para que se calassem e nunca mais mencionassem o nome de Jesus. Foram proibidos de falar ou ensinar em Seu nome.
Pedro e João lhes responderam que julgassem eles mesmos se era justo aos olhos de Deus obedecer a eles e não a Deus, pois não lhes era possível deixar de falar do que viram e ouviram.
As “autoridades” continuaram a ameaçá-los, mas tiveram que deixá-los ir porque todo o povo estava louvando a Deus pelo acontecimento. O homem que havia sido curado tinha mais de quarenta anos de idade e era portanto bem conhecido em público por ali.
1 Enquanto eles estavam falando ao povo, sobrevieram-lhes os sacerdotes, o capitão do templo e os saduceus,
2 doendo-se muito de que eles ensinassem o povo, e anunciassem em Jesus a ressurreição dentre os mortos,
3 deitaram mão neles, e os encerraram na prisão até o dia seguinte; pois era já tarde.
4 Muitos, porém, dos que ouviram a palavra, creram, e se elevou o número dos homens a quase cinco mil.
5 No dia seguinte, reuniram-se em Jerusalém as autoridades, os anciãos, os escribas,
6 e Anás, o sumo sacerdote, e Caifás, João, Alexandre, e todos quantos eram da linhagem do sumo sacerdote.
7 E, pondo-os no meio deles, perguntaram: Com que poder ou em nome de quem fizestes vós isto?
8 Então Pedro, cheio do Espírito Santo, lhes disse: Autoridades do povo e vós, anciãos,
9 se nós hoje somos inquiridos acerca do benefício feito a um enfermo, e do modo como foi curado,
10 seja conhecido de vós todos, e de todo o povo de Israel, que em nome de Jesus Cristo, o nazareno, aquele a quem vós crucificastes e a quem Deus ressuscitou dentre os mortos, nesse nome está este aqui, são diante de vós.
11 Ele é a pedra que foi rejeitada por vós, os edificadores, a qual foi posta como pedra angular.
12 E em nenhum outro há salvação; porque debaixo do céu nenhum outro nome há, dado entre os homens, em que devamos ser salvos.
13 Então eles, vendo a intrepidez de Pedro e João, e tendo percebido que eram homens iletrados e indoutos, se admiravam; e reconheciam que haviam estado com Jesus.
14 E vendo em pé com eles o homem que fora curado, nada tinham que dizer em contrário.
15 Todavia, mandando-os sair do sinédrio, conferenciaram entre si,
16 dizendo: Que havemos de fazer a estes homens? porque a todos os que habitam em Jerusalém é manifesto que por eles foi feito um sinal notório, e não o podemos negar.
17 Mas, para que não se divulgue mais entre o povo, ameacemo-los para que de ora em diante não falem neste nome a homem algum.
18 E, chamando-os, ordenaram-lhes que absolutamente não falassem nem ensinassem em nome de Jesus.
19 Mas Pedro e João, respondendo, lhes disseram: Julgai vós se é justo diante de Deus ouvir-nos antes a vós do que a Deus;
20 pois nós não podemos deixar de falar das coisas que temos visto e ouvido.
21 Mas eles ainda os ameaçaram mais, e, não achando motivo para os castigar, soltaram-nos, por causa do povo; porque todos glorificavam a Deus pelo que acontecera;
22 pois tinha mais de quarenta anos o homem em quem se operara esta cura milagrosa.
Atos, capítulo 4 vs. 1 a 22