O texto desse versículo é: “A ninguém devais coisa alguma, a não ser o amor com que vos ameis uns aos outros; porque quem ama aos outros cumpriu a lei”.
Este mandamento é singular, pois o ensino em toda a Bíblia visa o comportamento dos credores, com respeito à compaixão que devem ter para com os seus devedores. Ele abrange o cumprimento de todas as obrigações do crente como devedor, sejam elas civis, morais, financeiras ou de qualquer outra espécie, em consonância com os versículos precedentes (obrigações civis) e o restante do versículo (obrigação moral).
Analisaremos a seguir as dívidas que um crente está sujeito a ter aqui no mundo, e que deverão ser prontamente pagas em conformidade com este mandamento. Sem dúvida haverá várias outras em função das nossas circunstâncias, mas espero que estas sirvam de exemplo:
Todo cidadão está sujeito a obrigações civis, que variam entre os países. O versículo em pauta vem logo após uma exortação para que essas obrigações sejam cumpridas: “Toda alma esteja sujeita às autoridades superiores; porque não há autoridade que não venha de Deus; e as autoridades que há foram ordenadas por Deus. Por isso, quem resiste à autoridade resiste à ordenação de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos a condenação” (Romanos 13:1,2). O cumprimento das leis do país em que vive é uma obrigação de todo o crente (desde que não firam os mandamentos de Deus). “A quem temor, temor, a quem honra, honra” (Romanos 13:7). A regularização dos seus documentos, os serviços diversos como o militar, júri, participar nas eleições, e outros mais, são obrigações civis no Brasil.
As obrigações financeiras exigem muita atenção, pois o seu cumprimento é geralmente uma das principais medidas para se avaliar a honestidade e integridade de uma pessoa. O crente deve primar por cumprir estas obrigações, e é lamentável ouvir o número de casos em que o testemunho de crentes, que aparentam ter boa maturidade, tem sido comprometido por dívidas não pagas.
Empréstimos são parte da economia doméstica, geralmente necessários para se obter casa-própria e aquisição de bens mediante cartão de crédito, bem como aos comerciantes, fazendeiros, produtores, etc, para desenvolverem as suas atividades.
Curiosamente alguns têm interpretado Romanos 13:8 como uma proibição à contratação de empréstimos e apenas isso. Não encontramos alguma diretiva condenando o ato de contratar um empréstimo, como se fosse um pecado. Na lei dada através de Moisés, que “é santa; e o mandamento, santo, justo e bom” (Romanos 7:12), os empréstimos são normalmente regulados, o que não aconteceria se fossem pecado (p.ex. Êxodo 22:25, Deuteronômio 24:6, 10-13).
Um empréstimo consiste em trocar um compromisso por um benefício. Este intercâmbio é normal e legítimo, havendo uma recompensa ao credor pelo tempo decorrente entre o empréstimo e o reembolso. Há séculos existe a interveniência facultativa de terceiros, como os bancos, para dar maior garantia ao credor ao assumir eles próprios o risco de inadimplência pelo devedor.
O crente estará em falta se assumir um compromisso, ou tomar emprestado, se não tiver condições de cumpri-lo em seu vencimento. É a falta do pagamento na data contratada que o tornará “devedor” no sentido deste mandamento.
Assim também contrai-se dívida se as contas dos serviços, como aluguel, luz, água, gás, telefone, escola, etc., não forem pagas em seu vencimento.
Outras obrigações usuais são os impostos - federais, estaduais e municipais. Nem sempre as autoridades dispõem de todos os dados para o lançamento dos impostos e taxas, e neste caso pedem ao contribuinte que forneça algumas informações. Vem aqui a tentação de mentir, prática por demais comum no mundo. O crente deve resistir a essa tentação, não só por ser pecado de mentira e mesmo de roubo, mas também em coerência com o ensino do Senhor Jesus, quando lhe perguntaram se era lícito dar tributo ao imperador romano, e Ele respondeu: “Dai, pois, a César o que é de César e a Deus, o que é de Deus.” Às vezes as próprias autoridades civis exorbitam ao que lhes permite a legislação, e neste caso é justo que se tomem as medidas legais pertinentes, como mandado de segurança, etc. Uma vez estabelecido o valor correto, este deve ser pago para não se ficar em dívida.
Na maioria das vezes a dívida financeira ocorre devido a imprudência ou desleixo do devedor que gasta mais do que recebe. Um crente deve cuidar dos seus bens como bom administrador daquilo que Deus lhe confiou, e uma boa administração consiste em equilibrar a receita com a despesa, deixando uma margem para os imprevistos. Mas pode ter outras causas, sobre as quais ele não tem controle. Não é portanto justo julgar mal a pessoa que se encontra insolvente, sem conhecer bem a causa.
O crente, no entanto, peca se ficar em dívida financeira. Sua obrigação é a de liquidá-la, cumprindo assim com o mandamento em Romanos 13:8, usando de todos os meios disponíveis, como negociar um refinanciamento, obter um empréstimo (desde que possa pagá-lo em seu vencimento), vender seus bens, hipotecar sua casa, reduzir seus gastos, etc.
Se ainda assim estiver em apuros, ele deve levar o assunto à direção da sua igreja, para que lhe dêem assistência. Enquanto a dívida persistir, ele estará em pecado e é melhor que ele próprio confesse o seu estado logo para que o assunto seja resolvido da melhor maneira possível. Se ele silenciar, o assunto virá eventualmente ao conhecimento público quando ele sofrer as sanções legais, para prejuízo do seu testemunho pessoal e, por conexão, do da igreja também.
Estas são dívidas que surgem em vista de nosso relacionamento pessoal com outras pessoas. Promessas, por exemplo, são obrigações que devem ser cumpridas, senão serão mentiras. Não juramos, para não sermos condenados por perjúrio, mas nos limitamos ao “sim, sim” e “não, não” (Tiago 5:12). Quantas crianças aprendem a desconfiar dos seus pais e outros adultos pelas promessas vazias que lhes são feitas! O ditado popular diz que “promessa é dívida”, e é uma dívida fácil de adquirir, mas muitas vezes difícil de pagar! A integridade moral exige que não façamos qualquer promessa que não tenhamos os meios, ou a intenção, de cumprir. Uma vez feita, que seja cumprida sem vacilação.
“Se anuncio o evangelho, não tenho de que me gloriar, pois me é imposta essa obrigação; e ai de mim se não anunciar o evangelho!” (1 Coríntios 9:16). Esta foi também uma obrigação declarada pelo apóstolo Paulo. Temos o dever de proclamar o Evangelho ao mundo perdido, como luzes na escuridão. Há muitas formas de fazê-lo, pessoalmente, junto com outros irmãos, em trabalhos da igreja, em apoio aos evangelistas, programas de rádio, impressos, etc.
A única dívida permitida é “o amor com que vos ameis uns aos outros”. Essa é a dívida que incorremos quando recebemos a Cristo como nosso Salvador e Senhor, pois é o Seu grande mandamento para nós e é uma obrigação constante. Devemos estar sempre pagando esta dívida, mas ela nunca nos será quitada.