A Páscoa judaica no tempo em que o Senhor Jesus a celebrou com Seus discípulos consistia de um ritual inexistente quando foi instituída quase quinze séculos antes por Moisés.
Seguiu uma tradição oral antiga, que não consta da Bíblia, portanto temos que nos informar com os rabinos judeus que, entre AD 100 e 210, editaram e compilaram o chamado Misná incorporando os mais antigos comentários rabínicos conhecidos.
Mesmo assim, já haviam decorrido muitos anos e é possível que haja alguma discordância, o que explica algumas diferenças nas minúcias do ceremonial daquele tempo.
Sem ter uma base infalível como a Bíblia para nos ensinar sobre isso, vou me limitar à essência, tirada da explicação dada pelo casal de judeus convertidos Ceil e Moishe Rosen em seu livro "Cristo na Páscoa."
Os participantes reclinavam à mesa, costume babilônico dos homens livres, e servos ou escravos os serviam. A cerimônia incluia abluções e determinadas orações. Era obrigatório beber pelo menos quatro cálices de vinho tinto misturado com água morna, símbolo de alegria e representando o sangue do cordeiro que fora sacrificado e cuja carne era comida.
Para comer, além do cordeiro assado, das ervas amargosas e de pães asmos (sem levedo), símbolo da aflição (Deuteronômio 16:3) mandados por Moisés, havia outros alimentos cerimoniais na mesa. Água salgada ou vinagre era usada para mergulhar as ervas uma só vez, e também usavam uma mistura doce de maçãs e nozes, na qual mergulhavam as ervas e o bocado de pão antes de comer.
A ordem do culto era a seguinte:
1. Oração de consagração da refeição antes do primeiro cálice vinho, recitada pelo anfitrião (Lucas 22:17-18).
2. Primeira lavagem das mãos (João 13:4-5).
3. Mergulho da erva na água salgada ou vinagre, que era então passada por ele a todos os participantes.
4. Vinho é despejado no segundo cálice, depois de removida a comida.
5. Seção de perguntas pelos filhos ao pai sobre o significado da páscoa, quando em família, e lembrança da história do povo desde o chamado de Abraão até a saída do Egito e a entrega da Lei.
6. A comida volta à mesa, o pai continua a falar, explicando os elementos: o cordeiro, as ervas amargosas e os pães asmos que estavam para comer.
7. Canto dos salmos 113 e 114, e o segundo cálice é bebido.
8. Lavagem das mãos pela segunda vez, como ato de respeito pelo pão.
9. O anfitrião parte um dos pães em sinal de humildade, lembrando que os pobres só têm migalhas de pão para comer. Depois dá graças reconhecendo que Deus dá o alimento, e pelo mandamento que o pão não deve conter levedo.
10. O anfitrião dá um pedaço do pão partido, depois de mergulhado em ervas amargosas e mistura doce, a cada um dos participantes (Mateus 26:21, João 13:26, 27b e 30a).
11. A carne do cordeiro é comida (Depois disto, o Senhor outra vez tomou pão, deu graças e deu aos Seus discípulos dizendo: "Isto é o meu corpo, que por vós é dado; fazei isto em memória de mim" Mateus 26:26b; Lucas 22:19; 1 Coríntios 11:23-24).
12. O anfitrião despeja o terceiro cálice de vinho (Lucas 22:20; 1 Coríntios 11:25) e todos recitam a bênção de após-refeição, e cantam um corinho especial para o vinho no terceiro cálice, e todos bebem
13. Os salmos 115 a 118 são recitados, e todos bebem o quarto cálice.
14. Encerramento com um cântico ou hino (Mateus 26:30).
É de se notar que as palavras do Senhor Jesus eram chocantes: "isto é o Meu corpo" e "este é o novo testamento do Meu sangue", e que, ao interromper a ordem do ritual, no fim, Ele estava quebrando o costume de não se comer mais nada depois de comida a carne do cordeiro.
Com a Sua autoridade, Ele estava introduzindo uma comemoração inteiramente nova, aproveitando os símbolos usados na Páscoa, que representavam a Sua própria morte.
Os Evangelhos somente mencionam o primeiro e o terceiro cálice, que eram considerados os mais importantes na páscoa dos judeus de acordo com sua antiga tradição. O primeiro era especial porque consagrava todo o ritual que se seguia. O terceiro tinha dois nomes: "Cálice de Bênção", porque era bebido depois da "bênção", e "Cálice de Redenção" porque representava o sangue do cordeiro pascal. São os nomes mencionados em 1 Coríntios 10:16 e Mateus 26:28.