O capítulo 18 do Evangelho de Mateus trata de assuntos relevantes à igreja, onde ela aparece pela segunda vez em apenas duas das ocasiões em que é especificamente mencionada nos Evangelhos.
Depois de informar aos Seus discípulos que o maior no reino dos céus é aquele que se torna humilde como uma criança, o Senhor Jesus determina o procedimento que o crente deve tomar quando se sentir ofendido ou prejudicado por outro irmão.
Vejamos o que o Senhor Jesus está ensinando nesta passagem: “Ora, se teu irmão pecar contra ti, vai e repreende-o entre ti e ele só; se te ouvir, ganhaste a teu irmão. Mas, se não te ouvir, leva ainda contigo um ou dois, para que, pela boca de duas ou três testemunhas, toda palavra seja confirmada. E, se não as escutar, dize-o à igreja; e, se também não escutar a igreja, considera-o como um gentio e publicano”.
É simples, e consiste em três passos:
Procurar o irmão que o ofendeu e repreendê-lo em particular, estando presentes apenas os dois. O sigilo deste encontro é importante, pois permite que haja explicação, perdão e reconciliação se o ofensor reconhecer a sua culpa e remediá-la, evitando a divulgação com suas repercussões nefastas. O ofensor neste caso se sentirá agradecido pela atenção que lhe foi dada, e os laços de união fraternal serão fortalecidos entre os dois: o ofendido terá ganho o seu irmão.
Se, porém, este primeiro passo não surtir efeito porque o ofensor se recusa em atender ao irmão ofendido, este deverá novamente procurar o ofensor levando agora mais um ou dois irmãos para servirem de testemunhas em novo encontro. Possivelmente, com isto, o ofensor se arrependa e o assunto possa ser resolvido sem maiores problemas.
Finalmente, se o ofensor continuar empedernido, não dando ouvidos à queixa, o assunto será levado à igreja, tendo agora testemunhas da sua falta. Se mesmo assim ele se recusar a dar satisfação ele deverá ser considerado como “gentio e publicano”, ou seja, ímpio e pecador, indigno de pertencer à igreja de Deus.
A obediência a este mandamento do Senhor é vital para a saúde espiritual da igreja, e para a comunhão dos seus membros.
No entanto, esse procedimento espiritual se opõe aos instintos carnais do homem e por isso nem sempre é adotado. Na maioria das vezes é completamente olvidado, não só pelo crente que se sente ofendido, mas até pelos irmãos responsáveis pela direção da igreja onde se reúne.
O crente ofendido às vezes não toma providência nenhuma, mas guarda rancor contra o irmão que o ofendeu. A Bíblia nos ensina: “Irai-vos e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira” (Efésios 4:26): a ira é uma emoção natural que deve ser controlada, senão pode nos levar a agir de forma irracional da qual nos arrependeremos depois. Ela nunca deve ser fomentada e alimentada de forma a se tornar em rancor - isso é cometer pecado, pois “não se ponha o sol sobre a vossa ira” (Efésios 4:26). O rancor prejudica nossa saúde física e espiritual, bem como nosso relacionamento com os irmãos.
Muitas vezes o irmão visado, o “ofensor”, não se dá conta que prejudicou ou ofendeu o outro até que seja procurado por ele. Se o ofendido não quiser procurá-lo, então que perdoe aquele seu irmão e esqueça o assunto, como o Espírito Santo recomenda, nas palavras de Paulo: “Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de entranhas de misericórdia, de benignidade, humildade, mansidão, longanimidade, suportando-vos uns aos outros e perdoando-vos uns aos outros, se algum tiver queixa contra outro; assim como Cristo vos perdoou, assim fazei vós também” (Colossenses 3:12,13).
Se, ao contrário, o crente que se sente ofendido abre a sua boca para espalhar a outros a sua denúncia contra o ofensor, ou leva o assunto à igreja sem ter primeiro cumprido com o procedimento ordenado pelo Senhor, ele estará incidindo em maledicência (Colossenses 3:8), mesmo que tenha sido realmente injustiçado.
O que se deve fazer ao ofendido faltoso neste caso encontra-se em Gálatas 6:1: “Se alguém for surpreendido em alguma falta, vós, que sois espirituais, corrigi-o com espírito de brandura; e guarda-te para que não sejas também tentado”. Trata-se de uma falta, um tropeção: a igreja deve corrigi-lo, consertá-lo, usando de mansidão, que é fruto do Espírito Santo. Uma repreensão, uma advertência, um aconselhamento feitos com mansidão serão geralmente o suficiente. Estejamos atentos para não sermos tentados também.
Existe a maledicência contumaz, uma característica pessoal que põe em dúvida se houve um novo nascimento. Quando ela se manifesta, a Bíblia nos diz: “não vos associeis com aquele que, dizendo-se irmão, for … maldizente … com o tal nem ainda comais” (1 Coríntios 5:11), e também “haverá homens amantes de si mesmos, … caluniadores, … obstinados, orgulhosos, mais amigos dos deleites do que amigos de Deus, tendo aparência de piedade, mas negando a eficácia dela. Destes afasta-te” (2 Timóteo 3:1-5).
O que fazer neste caso está bem claro nestes versículos: “não vos associeis”, “com o tal nem ainda comais” e “afasta-te”. Isto se torna necessário a fim de que o mal não se propague na congregação, como uma “raiz de amargura” (Hebreus 12:15), resultando em murmurações e contendas dentro do povo de Deus (Filipenses 2:14). É um triste fato que freqüentemente constatamos: aprecia-se mais ouvir falar o mal do que o bem de outras pessoas, ou seja “as palavras do maldizente são como deliciosos bocados, que descem ao íntimo do ventre” (Provérbios 26:22).
Finalmente, observemos sempre o grande e principal mandamento que nos deixou o Senhor: “Um novo mandamento vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis” (João 13:34). Ele foi ecoado por Paulo e Pedro: “Amai-vos cordialmente uns aos outros com amor fraternal, preferindo-vos em honra uns aos outros” (Romanos 12:10), e “Purificando a vossa alma na obediência à verdade, para caridade fraternal, não fingida, amai-vos ardentemente uns aos outros, com um coração puro” (1 Pedro 1:22).
Obedecendo a este mandamento, estes problemas deixarão de existir, para a felicidade de todos os envolvidos.