O sentido etimológico da palavra portuguesa “seita”, traduzido da antiga literatura romana e pré-cristã, era “partido” ou “escola filosófica”, segundo o dicionário de Houaiss. Houaiss ainda nos informa que na atualidade ela tem os seguintes sentidos:
Doutrina ou sistema que se afasta da crença ou opinião geral e, por derivação:
o conjunto das pessoas que seguem essa doutrina ou sistema;
grupo de dissidentes de uma religião ou de uma comunhão principal;
grupo de indivíduos partidários de uma mesma causa; partido, bando, facção.
Teoria de um mestre com inúmeros seguidores;
Sociedade cujos membros se agregam voluntariamente e que se mantém à parte do mundo.
Nas versões do grego original do Novo Testamento existem as palavras hairesis e hairetikos, que literalmente se traduziriam respectivamente por “uma escolha” e “aquele que escolheu”, mas seus significados passaram a abranger também aquilo que é escolhido, um modo de vida escolhido e eventualmente uma opinião levando a um partido religioso.
É neste último sentido que hairesis é seis vezes traduzida no Novo Testamento para a palavra “seita”, todas no livro de Atos, sendo três vezes para os fariseus e saduceus (Atos 5:17, 15:5, 26:5), e três vezes para os cristãos, denominados “seita dos nazarenos” pelos judeus e gentios daquela época (Atos 24:5,14, 28:22).
Nesse contexto, “seita” é um partido religioso formado em uma divisão resultante da predileção de um grupo por determinada conduta e doutrina, ou da perversão de um ensino, geralmente esperando obter uma vantagem pessoal. Isso contrasta com o poder unificante da verdade, quando acolhida em sua totalidade.
Mas as palavras hairesis e hairetikos se encontram também em outros lugares do Novo Testamento com referência a doutrinas erradas e perniciosas, e crenças divergentes da legítima fé. Nestes casos elas não são traduzidas como “seita” em nossas Bíblias (trad. Almeida), mas ficaram as palavras gregas ligeiramente transformadas em “heresias” (1 Coríntios 11:19; Gálatas 5:20; 2 Pedro 2:1) e “herege” (Tito 3:10).
Este é o sentido bíblico da palavra “seita” que vamos estudar, e obviamente “verdade” é só o ensino bíblico: a Bíblia é a revelação de Deus feita a nós pela inspiração do Espírito Santo nos homens santos que escreveram essa profecia, como ensina Pedro: “nenhuma profecia da Escritura é de particular interpretação; porque a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo” (2 Pedro 1:20-21).
Mas Pedro acrescenta: “Entre vós haverá também falsos doutores, que introduzirão encobertamente heresias de perdição e negarão o Senhor que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina perdição. E muitos seguirão as suas dissoluções, pelos quais será blasfemado o caminho da verdade; e, por avareza, farão de vós negócio com palavras fingidas; sobre os quais já de largo tempo não será tardia a sentença, e a sua perdição não dormita” (2 Pedro 2:1-3).
As heresias estão incluídas entre as obras da carne em Gálatas 5:20, e “os que cometem tais coisas não herdarão o Reino de Deus” (v.21). Elas já se tornavam evidentes no início da igreja de Cristo, como veremos no próximo capítulo, dando motivo para a preocupação dos apóstolos que transparece em suas epístolas.
O Senhor Jesus profetizou o crescimento da cristandade e a chegada das seitas em seu meio:
“Outra parábola lhes disse: O Reino dos céus é semelhante ao fermento que uma mulher toma e introduz em três medidas de farinha, até que tudo esteja levedado” (Mateus 13:33). Na Bíblia, fermento invariavelmente é figura de algo mau, e seria surpreendente se aqui fosse diferente. Não é o fermento que é semelhante ao Reino dos céus, mas o que acontece na parábola. O Senhor advertiu seus discípulos contra o fermento dos fariseus e dos saduceus, referindo-se à sua doutrina (Mateus 16:6,11,12) e também contra o fermento de Herodes (Marcos 8:15):
os fariseus acrescentavam sua tradição, que exigia do povo mais obrigações do que as requeridas pela lei de Moisés, e eram notórios pela sua hipocrisia, ritualismo, falsa piedade e intolerância;
os saduceus, aristocratas entre os sacerdotes, aceitavam o Torá (pentateuco) mas rejeitavam todas as demais Escrituras. Negavam a imortalidade da alma, a ressurreição dos mortos e a existência de anjos;
os herodianos apoiavam o poder político de Herodes e a cultura greco-romana, e se destacavam pelo seu ceticismo, imoralidade e mundanismo.
O fermento é maldade e malícia em 1 Coríntios 5:6-8, e ensino falso em Gálatas 5:9.
A primeira parábola prevê as seitas surgindo na cristandade por influência externa, satânica, enquanto a segunda nos previne sobre a corrupção interna com heresias dando origem às seitas, corrupção essa que eventualmente irá contaminá-la toda.
É notável como essas mesmas características são facilmente encontradas hoje nas seitas do cristianismo, em cumprimento a essas duas parábolas.
Fomos prevenidos, logo não devemos nos admirar com a grande variedade de instituições tomando toda a espécie de denominação, algumas enormes e poderosas, todas se dizendo cristãs, mas ensinando coisas completamente alheias à Palavra de Deus.
Por outro lado, devemos nos considerar muito felizes por termos facilmente à nossa disposição a própria fonte de toda a legítima doutrina cristã, a Palavra de Deus, barata em forma de papel, e gratuita em forma eletrônica na Internet.
Nos próximos estudos desta série vamos procurar examinar algumas das principais seitas em seu aspecto histórico e doutrinário à luz dessa mesma Palavra de Deus.