Na manhã de 03 de maio de 1987, passou tranquilamente para a presença do Senhor o nosso mui amado irmão Richard Dawson (Ricardo) Jones, na provecta idade de 92 anos.
Richard Dawson Jones nasceu na Inglaterra, na cidade de Nottingham, a 17 de abril de 1895, e desde pequeno ouvia a leitura da Bíblia e as pregações na igreja onde assistia juntamente com seus pais. Freqüentava assiduamente a Escola Dominical onde, mais tarde veio a lecionar para uma classe de jovens.
Porém, não tinha a experiência do novo nascimento. Talvez em conseqüência da instrução secular que recebera, pois formou-se professor, tinha dúvidas sobre a inspiração plena das Sagradas Escrituras e mesmo sobre a divindade do Senhor Jesus Cristo.
Durante a chamada "Primeira Grande Guerra" (1914 a 1918), nosso irmão foi convocado pelo exército britânico e, talvez pensando no perigo de perder a vida, começou a pensar seriamente na vida espiritual. Para ele tudo girava em torno de um só ponto: é Cristo o verdadeiro Filho de Deus? Se a resposta a essa pergunta for positiva, tudo o que Ele falou a respeito de Si próprio é verdade e temos de aceitá-Lo e obedecer ao que Ele manda.
Passou algum tempo perturbado com esta dúvida, até que reconheceu que Cristo era de fato, o Filho de Deus, era Deus em carne, que viera ao mundo e morrera para salvá-lo, e confessou-O como Senhor da sua vida. Surgiu-lhe, então, um problema de consciência: como cristão, não queria pegar em armas, embora entendia ser o seu dever servir a sua Pátria. Ingressou, então, na Cruz Vermelha, para, ao invés de tirar , ajudar a preservar as vidas dos seus semelhantes.
No campo de batalha conheceu um jovem chamado William Thomson, de quem tornou-se grande amigo. Este, um cristão fiel, era um dos líderes do trabalho de estudo bíblico e oração entre os soldados.
Durante esses estudos nosso irmão Ricardo foi vendo dirimidas, pela iluminação do Espírito Santo, todas as dúvidas ainda remanescentes em sua mente. Compreendeu que o próprio Senhor Jesus afirmou ser o Velho Testamento a Palavra de Deus que não pode falhar, sendo, portanto, tal como o Novo Testamento, digno de nossa absoluta confiança. Foi instruído também sobre o batismo, ao qual todos os verdadeiros cristãos devem ser submetidos após a sua conversão, e deu alegremente este passo de obediência.
Ao voltar da guerra, foi recebido na casa de oração de "Clumber Hall", em Nottingham, de onde mais tarde, sentindo-se chamado pelo Senhor, foi recomendado para a obra missionária.
Casou-se no dia 5 de julho de 1924 com a irmã Mary Ellen Jones (1899-1982) e dessa união nasceram os filhos Ricardo David, William Paulo e Grace Minnie.
Foi no dia 14 de novembro de 1925 que nosso irmão, juntamente com sua jovem e linda esposa, embarcou no porto de Liverpool rumo ao Brasil. Frio intenso, garoa e nevoeiro davam ao ambiente um toque de profunda tristeza enquanto, ao som do hino "The Solid Rock" (A Rocha Inabalável), despediam-se dos amados irmãos e familiares.
Mas a certeza do chamado do Senhor e da Sua presença constante trouxe conforto ao jovem casal, abrasou-lhes os corações e deu-lhes forças para renunciarem a tudo pelo gozo de levarem a mensagem do Senhor além das fronteiras da sua pátria.
Desembarcaram no Rio de Janeiro em 04 de dezembro de 1925 e ali foram recebidos pelo irmão Edward Percy Ellis (1879-1963). Durante um curto estágio no Rio de Janeiro buscavam a direção do Senhor sobre o lugar onde Ele queria enviá-los e, de modo quase inexplicável, acabaram chegando a Uberaba, que era, naquele tempo uma pequena cidade do Triângulo Mineiro. Ali desembarcaram em setembro de 1926. Enfrentando muita oposição, nosso irmão testificou e pregou, e pela graça de Deus formou a igreja que ainda hoje lá está reunindo-se à Rua da Constituição, 52.
Em janeiro de 1942 nosso irmão mudou-se para a cidade de Piracicaba-SP e, em março de 1948 para São Paulo-SP. No ano de 1957 retornou a Piracicaba, onde permaneceu até o fim de sua carreira.
Seu profícuo ministério foi desenvolvido em várias áreas: o púlpito, a página escrita, o rádio e a comunicação pessoal. Conhecedor profundo da Palavra de Deus e consumado mestre na exposição da mesma, o irmão Ricardo foi instrumento nas mãos do Senhor para edificar inúmeras igrejas e crentes individualmente pelo seu magistral ensino, bem como para conduzir muitas almas aos pés do Salvador.
Seu coração de pastor estava sempre preocupado com o bem estar do povo de Deus, tanto no aspecto espiritual quanto temporal. Em Uberaba, São Paulo e Piracicaba, cidades de topografia acentuadamente acidentada, nosso irmão andou muito, com a sua perna inchada, juntamente com a sua esposa, para levar uma palavra de amor, conforto e orientação aos membros da família de Deus.
Enquanto tinha possibilidades físicas atendia a convites para ministrar a Palavra de Deus em conferências ou retiros bíblicos, tendo viajado em vários estados do Brasil com esta finalidade. Sua voz penetrou em muitos lares, através do rádio, levando a mensagem do Evangelho. Possuindo uma "pena de habilidoso escritor" muito contribuiu com os seus escritos para a propagação do Evangelho e para a instrução e edificação dos fiéis.
Em 1940 fundou "O Despertador", um veiculo de propaganda evangélica que circulou por algum tempo. De 1948 a 1956 assumiu a direção do periódico evangelístico "O Gladiador", fundado por um grupo de jovens da igreja em Vila Clementino em São Paulo.
Nessa época introduziu no Brasil os cursos bíblicos Emaús, agora tão conhecidos e difundidos. E os periódicos de edificação cristã "Vigiai e Orai", "A Senda do Cristão", como também a revista missionária "IDE", tiveram o privilégio de publicar os seus sábios e edificantes artigos.
Durante muitos anos colaborou com a revista da Escola Dominical-RJ para a qual escrevia um trimestre por ano. Nos seus últimos anos escreveu vários comentários sobre as epístolas, com os quais têm sido beneficiados inúmeros crentes do Brasil, Portugal e outros países de língua portuguesa.
Nosso irmão permaneceu ativo até a sua última semana sobre a terra, quando deu um estudo bíblico, tomou parte ativa na reunião de oração, atendeu visitas e escreveu cartas. E até os últimos instantes de sua vida em seu leito no hospital, estava evangelizando o médico que o atendia.
Este escriba estava com ele até quase os últimos momentos de sua vida e dele recebeu a incumbência de transmitir a seguinte mensagem: "Transmita o meu amor à igreja. Diga-lhes que estou bastante lúcido e consciente da minha partida. Não parto com tristeza, nem pesar, mas vou alegre e feliz, não por deixá-los, mas porque vou para meu Senhor. Não é que eu mereça isto, mas o Senhor me salvou há muitos anos atrás, lavando-me com Seu sangue e perdoando os meus pecados, garantindo-me assim um lugar na Sua presença. Transmita o meu amor também a todos os irmãos e companheiros com quem tive o privilégio de manter comunhão em todos esses longos anos". Sem dúvida nenhuma, a sua partida foi um grande desfalque nas fileiras da Milícia Cristã.
Damos graças ao Senhor pela vida do nosso amado irmão Ricardo e pelo extraordinário exemplo que nos deixou. Piedade, altruísmo e simplicidade eram traços marcantes no seu caráter. Só a eternidade poderá revelar em sua plenitude os frutos do seu profícuo trabalho no Brasil nos 62 anos de sua permanência entre nós.
Quem escreve estas linhas foi, talvez mais do que ninguém, abençoado através do ministério daquele irmão, o qual foi para ele um pai amoroso, um amigo fiel, um mestre competente, um conselheiro sábio e um companheiro leal. Brevemente "Aquele que há de vir virá e não tardará" (Hebreus 10.37). Então encontrar-nos-emos novamente, para nunca mais nos separarmos. Aleluia! Maranata! VEM SENHOR JESUS!
("Vigiai e Orai" - No.59 - junho de 1987)
Nota do redator:
"Nós O amamos, porque Ele nos amou primeiro" (1a. João 4.19).
"Observando-vos em vossas boas obras" (1a. Pedro 2.12).
"Assim como o corpo sem o espírito está morto, assim também a fé sem obras está morta" (Tiago 2.26).
Que a nossa fé seja viva e operante, produzindo os frutos que serão para a glória de Deus.