Mais uma vez são usadas as palavras "meus irmãos": o que segue é claramente dirigido aos crentes em Cristo, na maior parte judeus quando a carta foi escrita, logo as referências são freqüentes à lei de Moisés.
Somos proibidos de ter, ou habitualmente manter, a fé de nosso Senhor Jesus Cristo em acepção de pessoas. O Senhor Jesus é chamado aqui simplesmente "a Glória": as palavras "o Senhor da" não estão no texto grego. Ele é a Presença de Deus entre nós, o que era chamado no hebraico a Glória (Shekinah) de Deus. (Veja também Romanos 9:4; 1Coríntios 4:6; Efésios 1:17; Hebreus 1:3.) A fé é o volume de verdade que Ele nos deu, não a nossa confiança ou dependência dele.
A acepção de pessoas consiste em ser parcial para certas pessoas, e é uma expressão hebraica que significa "levantar o rosto numa pessoa", ser favorável e parcial a ela. O esnobismo e distinções de classe são totalmente inconsistentes com o ensino cristão. Em outro lugar somos ensinados que se dê o respeito devido aos governantes, mestres, anciãos e pais, mas aqui se condena a deferência dada a pessoas por causa da sua maneira de vestir ou aparência física.
A lei era clara: "Não fareis injustiça no juízo; não aceitarás o pobre, nem respeitarás o grande; com justiça julgarás o teu próximo." (Levítico 19: 15).
Encontramos ilustrações deste princípio nos versículos dois e três, que são auto-explicativos. A palavra grega traduzida ajuntamento no versículo 2 é sinagoga, o lugar onde os crentes se encontravam. Foi chamado sinagoga entre alguns crentes até o meio do século 4. No início a igreja local era liderada por anciãos e diáconos, e os crentes se reuniam e adoravam de maneira semelhante aos judeus em suas sinagogas.
Parece quase incrível que dentro de um ajuntamento cristão um tratamento tão diferencial pudesse ser dado às pessoas apenas por causa da sua maneira de vestir. Talvez esteja havendo algum exagero apenas para enfatizar o argumento, que consiste em mostrar que estamos inclinados a fazer julgamento do valor de uma pessoa apenas com base em sua aparência exterior, não só como se veste, mas também a sua raça, a cor da sua pele, cabelo ou olhos e mesmo o sotaque quando fala. Tal discriminação é contrária aos princípios cristãos, e se nós a fazemos nós nos tornamos em juízes com maus pensamentos.
Nos seguintes versículos desta seção, somos ensinados como devemos tratar as pessoas que se encontram em circunstâncias extremas na sociedade, os ricos e os pobres. Tem a ver com a atitude de Deus para com as riquezas e a pobreza: não é a mesma que a do mundo.
Quatro fortes razões nos são dadas por que é incompatível ao crente honrar o rico e desprezar o pobre:
Desprezar os pobres, como uma classe, é desonrar pessoas que são honradas por Deus. Deus escolheu os pobres deste mundo para serem ricos na fé e herdeiros do reino que Ele prometeu àqueles que O amam. Não lemos que Deus escolheu todos os pobres, apenas que Ele escolheu gente pobre para ser rica por causa da sua fé e para estar entre os herdeiros do reino (como no capítulo 1:9; veja também Lucas 6:20; Coríntios 1:26 - 28). Um crente pobre é certamente desprezado em algumas igrejas, e no entanto ele pode ser o homem mais rico espiritualmente naquela igreja. A Bíblia diz muito sobre o mau trato pelos ricos e poderosos dos pobres, e por isso terão que responder a Deus. Deus tem interesse e consideração pelos pobres, evidenciados claramente quando seu Filho tomou nossa humanidade e viveu entre nós. Os pobres podem ser ricos em coisas espirituais, e isso é o que nos importa ver. No reino ocuparão posições de riqueza, de autoridade e de glória. É conseqüentemente tolice tratar mal agora aqueles que estão destinados a ser exaltados no reino perene de Cristo.
Mostrar deferência aos ricos, como classe, é honrar aqueles que tipicamente fazem mau uso do poder que a sua riqueza lhes dá para oprimir seus concidadãos e para os arrastar aos tribunais para lhes fazerem pagar por aquilo que tiveram que lhes tomar emprestado. Naqueles dias os crentes pobres estavam sentindo pressão dos judeus ricos que eram seus senhores, e estavam recebendo tratamento áspero dos juízes ante os quais eram levados para as sanções da lei.
Honrar os ricos é ser parcial àqueles que habitualmente usam palavreado mau ou áspero envolvendo o nome de Cristo. Estão inchados por causa da sua auto-importância e difamam o bom nome pelo qual somos chamados. Possivelmente este é o nome de Cristo (Atos 11:26; 26:28; 1 Pedro 4:14, 16). Era blasfêmia falar contra Cristo como alguns judeus e Gentios faziam (Atos 13:45; 18:6; 26:11; 1 Coríntios 12:3; 1 Timóteo 1:13). Alternativamente, os crentes são os batizados no nome do Senhor Jesus, e este é o nome pelo qual os ricos blasfemam por hábito, e não só eles. As características que acompanham as riquezas não honram geralmente ao Senhor Jesus.
Qualquer discriminação quebra a lei real segundo a Escritura "Amarás a teu próximo como a ti mesmo". É real porque nos foi dada pelo nosso Rei e é o resumo de todas as leis concernentes ao nosso comportamento para com os homens. Significa cuidar dos que nos cercam da mesma forma como cuidamos de nós próprios. Nossa natureza humana é egocêntrica e favorecemos os ricos esperando ser beneficiados com nossa proximidade deles, e desprezamos os pobres porque eles nada têm para nos oferecer. Da parábola do Bom Samaritano aprendemos que nosso próximo é todo aquele com quem nos deparamos e que precisa da nossa ajuda.
Ser parcial é cometer pecado, que é não alcançar o padrão que Deus espera de nós. Sua lei também nos condena porque a quebramos: a lei está compreendida neste mandamento portanto ao desobedecê-lo infringimos a lei toda. Algumas ações podem ser pecaminosas apenas por serem injustas, mas se existe lei contra elas se tornam em transgressões.
Qualquer transgressão da lei resulta em condenação, não importando se o restante da lei tem sido obedecida. Parcialidade é pecado porque é injusta mas também é uma transgressão porque a lei a proíbe.
Todo mundo é transgressor da lei de Deus, porque ninguém pôde obedecer a todas as suas cláusulas durante sua vida inteira. É como os elos de uma corrente. Se quebrarmos um elo, a corrente toda estará rompida. É por isso que o Senhor Jesus veio ao mundo e viveu uma vida singular, livre de pecado, perfeitamente atingindo o padrão de justiça requerido por Deus. Isto também significa que nunca transgrediu a lei pois ela éjusta. Todos os que crêem nele e confiam nele são vestidos com a Sua justiça, por que Ele se deu a Si mesmo como sacrifício pelo nosso pecado e isso é aceitável a Deus.
A lei de Moisés era a lei de servidão, e os crentes não estão mais debaixo dela como regra de vida, segundo lemos no ensino do Novo Testamento, por exemplo: "não estais debaixo da lei, mas debaixo da graça" (Romanos 6:14); "agora, estamos livres da lei" (Romanos 7:6); "vós estais mortos para a lei pelo corpo de Cristo" (Romanos 7:4).
Agora estamos sob a lei da liberdade e devemos falar e fazer como quem será julgado por ela. A lei da liberdade significa liberdade para fazer o que é reto. A lei da servidão nos tornou em transgressores porque éramos incapazes de obedecer todos os seus estatutos, e trouxe a condenação, mas a lei da liberdade nos livra de condenação e nos permite viver uma vida de retidão com o poder do Espírito Santo.
Cristo, não a lei, é o padrão do crente e determinados princípios da lei são de valor permanente. Sob a lei da liberdade seremos premiados por obedecê-los e daí o julgamento a que seremos submetidos. Achamos esses princípios no Novo Testamento - por exemplo, nove dos dez mandamentos. O que não se encontra ali diz respeito à obrigatoriedade da observância do sábado, pois foi dada como sinal aos judeus apenas e não é repetida no Novo Testamento para ser observada pelos crentes.
1 Meus irmãos, não tenhais a fé de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor da glória, em acepção de pessoas.
2 Porque, se no vosso ajuntamento entrar algum homem com anel de ouro no dedo, com vestes preciosas, e entrar também algum pobre com sórdida vestimenta,
3 e atentardes para o que traz a veste preciosa e lhe disserdes: Assenta-te tu aqui, num lugar de honra, e disserdes ao pobre: Tu, fica aí em pé ou assenta-te abaixo do meu estrado,
4 porventura não fizestes distinção dentro de vós mesmos e não vos fizestes juízes de maus pensamentos?
5 Ouvi, meus amados irmãos. Porventura, não escolheu Deus aos pobres deste mundo para serem ricos na fé e herdeiros do Reino que prometeu aos que o amam?
6 Mas vós desonrastes o pobre. Porventura, não vos oprimem os ricos e não vos arrastam aos tribunais?
7 Porventura, não blasfemam eles o bom nome que sobre vós foi invocado?
8 Todavia, se cumprirdes, conforme a Escritura, a lei real: Amarás a teu próximo como a ti mesmo, bem fazeis.
9 Mas, se fazeis acepção de pessoas, cometeis pecado e sois redargüidos pela lei como transgressores.
10 Porque qualquer que guardar toda a lei e tropeçar em um só ponto tornou-se culpado de todos.
11 Porque aquele que disse: Não cometerás adultério, também disse: Não matarás. Se tu, pois, não cometeres adultério, mas matares, estás feito transgressor da lei.
12 Assim falai e assim procedei, como devendo ser julgados pela lei da liberdade.
Tiago capítulo 2:1 a 12