Depois da calorosa despedida em Mileto, Paulo e os seus companheiros velejaram para a ilha de Cós onde passaram a noite. Essa ilha é famosa por ser onde nasceram Hipócrates (o "pai da medicina") e Apeles (pintor grego). Além de uma escola de medicina, tinha também um grande comércio, com muitos judeus.
No dia seguinte eles continuaram sudeste para a ilha de Rodes, chamada a "ilha de rosas". Também famosa pela grande estátua do deus Hélios, considerada uma das sete maravilhas do mundo antigo. A ilha está na entrada para o Mar Egeu e teve uma grande universidade, especialmente para retórica e oratória, e muito comércio.
Deixando o cabo ao norte da ilha, velejaram para o leste a Pátara, um porto de mar da Lícia no litoral sul da Ásia Menor por onde passavam muitos navios o ano todo.
Ali deixaram o pequeno navio costeiro que haviam usado, e passaram para um navio mercante de maior porte, que atravessou o mar aberto até Tiro, uma das cidades principais da Fenícia, marginando a ilha de Chipre.
O navio provavelmente carregava grãos de cereais e frutas, e levou sete dias para deixar a sua carga antes de continuar sua viagem. Em Tiro havia discípulos, que hospedaram Paulo e seus companheiros enquanto esperavam a partida do seu navio. Paulo já tinha passado por ali anteriormente (cap. 15:3) e assim os conhecia.
O Espírito Santo já tinha prevenido Paulo que prisões e tribulações o esperavam em Jerusalém (Atos 20:23). Em Tiro, novamente, os discípulos, pelo Espírito, recomendavam a Paulo que não fosse a Jerusalém.
Apesar desta nova advertência, Paulo sentiu que era seu dever continuar viagem até lá. Evidentemente Paulo interpretou a ação do Espírito Santo como apenas uma informação aos discípulos, e julgou que eles o estavam recomendando para não ir porque não queriam que enfrentasse o perigo que o ameaçava ali.
Portanto, embarcaram novamente assim que o navio estava pronto para partir. Todos os discípulos, com esposas e filhos, os acompanharam até a praia, e ali se ajoelharam e oraram, em uma demonstração eloqüente do seu amor cristão.
A próxima escala foi no porto de Ptolemaida, onde saudaram os irmãos e passaram com eles um dia. Essa é a cidade hoje conhecida como Acre, perto de Haifa. É a antiga Aco, cujos habitantes não foram expulsos no tempo dos juízes (Juízes 1:31). Era o melhor porto da Palestina, rodeado por montanhas, e recentemente foi capturado pelos judeus sendo anexado ao Estado de Israel em 1948.
Os viajantes partiram no dia seguinte, e afinal desembarcaram no porto de destino, Cesaréia. Esta era uma das cidades mais importantes do império romano, sendo naquele tempo a capital política da Judéia. Foi construída por Herodes o Grande que lhe deu o nome de Cesaréia em honra ao imperador Augusto. A maioria dos habitantes eram gregos. Esta é a terceira vez que vemos Paulo em Cesaréia (veja cap. 9:30 e 18:22).
Ali morava Felipe, "o evangelista". Felipe é o segundo na lista dos primeiros diáconos da igreja de Jerusalém (cap. 6:5), fez trabalho evangelístico em Samaria depois da morte de Estêvão, e anunciou o Evangelho ao ministro Etíope (Cap. 8). Foi chamado de "evangelista", assim como João foi conhecido como "batista" (Marcos 1:4), para distingui-lo de outro do mesmo nome, que era apóstolo. Felipe hospedou todos em sua casa.
O termo "evangelista" usado aqui foi também usado por Paulo (Efésios 4:11, 2 Timóteo 4:5) e significa uma pessoa usada pelo Espírito Santo para viajar levando a mensagem do Evangelho a indivíduos, grupos e trabalhos das igrejas. Estão entre as classes especiais de ministros dados às igrejas, assim como os temos hoje.
Felipe tinha quatro filhas solteiras que profetizavam. Não consistia necessariamente em revelar acontecimentos futuros, como fez Ágabo enquanto Paulo e os seus companheiros estavam lá, mas seu dom as habilitava a edificar, exortar e consolar a igreja, o que era mais importante do que falar outras línguas (1 Coríntios 14:1-4). A profecia de Joel, em seu capítulo 2 ver. 28, fala sobre filhas que profetizarão nos últimos tempos (Joel 2:28), e foi lembrada por Pedro no dia de Pentecoste.
Paulo ensinou que as mulheres devem cobrir a cabeça ao profetizar (e orar), aparentemente em público, o que parece discordar com suas instruções para as mulheres manterem silêncio na igreja (1 Coríntios 14:34-40, 1 Timóteo 2:8-15). Reconciliamos estes ensinamentos entendendo que o dom de profecia das mulheres deverá ser exercido em reuniões que não sejam de toda a igreja, como reuniões de senhoras, escola dominical, etc.
Durante a estada de Paulo em Caesarea, desceu da Judéia um certo profeta, como as filhas de Felipe, chamado Ágabo. Decerto foi o mesmo que foi a Jerusalém de Antioquia e predisse que haveria uma grande fome por todo o mundo, que aconteceu durante o reinado de Cláudio (cap. 11:28).
Ágabo tomou a cinta de Paulo e atou seus próprios pés e mãos com ela. Era uma ação dramática, simbólica, como fizeram muitos profetas antes dele, para representar e enfatizar a sua mensagem. O Senhor Jesus havia falado a Pedro, anos atrás, que outros cingiriam as mãos de Pedro, significando que perderia a sua liberdade (João 21:18).
Ágabo profetizou, pelo Espírito Santo, que em Jerusalém os judeus iam prender Paulo e entregá-lo nas mãos dos gentios.
Seus companheiros de viagem, e os irmãos de Cesaréia, temeram por Paulo e lhe rogaram, com lágrimas, que não subisse a Jerusalém.
Em nenhuma das vezes em que o Espírito Santo preveniu Paulo que estaria em perigo quando fosse a Jerusalém houve alguma instrução da parte dEle para não prosseguir na viagem até lá. Ao contrário, Paulo se sentia impelido pelo seu espírito (subordinado ao Espírito Santo) a ir, talvez mesmo contra seu próprio bom-senso. Paulo não nos revela a luta que estava travando em si mesmo por causa disto, mas a insistência dos seus irmãos o feria muito.
Paulo então disse que se magoava com o comportamento deles, e que estava pronto não só a ser preso, mas mesmo a morrer em Jerusalém pelo nome do Senhor Jesus.
Como Paulo não se deixava persuadir, eles enfim se resignaram dizendo que a vontade do Senhor fosse feita e se calaram. Estariam eles sendo usados por Satanás para tentarem Paulo? Ou estaria Paulo resistindo ao Espírito Santo?
Sem dúvida seus companheiros o amavam e queriam que Paulo ficasse longe do perigo que havia sido previsto. Mas Paulo lhes mostrou que tinha um dever a cumprir, e que estava pronto a arriscar a própria vida, se fosse necessário, para que o Senhor Jesus fosse servido e honrado.
Isto nos faz lembrar que, em circunstâncias semelhantes, quando o Senhor Jesus voltava pela última vez a Jerusalém, os Seus discípulos lhe disseram "Rabi, ainda agora os judeus procuravam apedrejar-te, e voltas para lá?" e Ele lhes respondeu no sentido que sabia o que estava a fazer (João 11:8).
Os acontecimentos que se seguiram provaram que este era o caminho que Deus havia planejado para que Paulo testemunhasse do Senhor Jesus, não somente em Jerusalém, mas também em Roma (cap. 23:11).
1 E assim aconteceu que, separando-nos deles, navegamos e, correndo em direitura, chegamos a Cós, e no dia seguinte a Rodes, e dali a Pátara.
2 Achando um navio que seguia para a Fenícia, embarcamos e partimos.
3 E quando avistamos Chipre, deixando-a á esquerda, navegamos para a Síria e chegamos a Tiro, pois o navio havia de ser descarregado ali.
4 Havendo achado os discípulos, demoramo-nos ali sete dias; e eles pelo Espírito diziam a Paulo que não subisse a Jerusalém.
5 Depois de passarmos ali aqueles dias, saímos e seguimos a nossa viagem, acompanhando-nos todos, com suas mulheres e filhos, até fora da cidade; e, postos de joelhos na praia, oramos,
6 e despedindo-nos uns dos outros, embarcamos, e eles voltaram para casa.
7 Concluída a nossa viagem de Tiro, chegamos a Ptolemaida; e, havendo saudado os irmãos, passamos um dia com eles.
8 Partindo no dia seguinte, fomos a Cesaréia; e entrando em casa de Felipe, o evangelista, que era um dos sete, ficamos com ele.
9 Tinha este quatro filhas virgens que profetizavam.
10 Demorando-nos ali por muitos dias, desceu da Judéia um profeta, de nome Ágabo;
11 e vindo ter conosco, tomou a cinta de Paulo e, ligando os seus próprios pés e mãos, disse: Isto diz o Espírito Santo: Assim os judeus ligarão em Jerusalém o homem a quem pertence esta cinta, e o entregarão nas mãos dos gentios.
12 Quando ouvimos isto, rogamos-lhe, tanto nós como os daquele lugar, que não subisse a Jerusalém.
13 Então Paulo resppondeu: Que fazeis chorando e magoando-me o coração? Porque eu estou pronto não só a ser ligado, mas ainda a morrer em Jerusalém pelo nome do Senhor Jesus.
14 E, como não se deixasse persuadir, dissemos: Faça-se a vontade do Senhor; e calamo-nos.
Atos capítulo 21, versículos 1 a 14