A descrição da Sua detenção aqui é diferente da que é dada nos outros Evangelhos:
Os primeiros três Evangelhos focalizam em Sua humanidade, a Sua natureza humana, e sobre os Seus sofrimentos. Quando se aproximava de Jerusalém, Ele afirmou que estava indo lá para morrer, mencionando os maus tratos nas mãos dos gentios, e que ressuscitaria corporalmente.
No Evangelho de João, o foco é sobre a divindade de Jesus. Como Deus homem neste Evangelho, a ênfase aqui está sobre a Sua glória, que figura na Sua detenção, na Sua morte e na Sua ressurreição, em conformidade com Suas frequentes declarações que estava voltando para o Pai. Nestas passagens vamos encontrar uma mistura de Sua majestade e da Sua mansidão.
Ele parece ter passado as noites sob o céu aberto (Lucas 21:37). Nesta passagem mais uma vez ele deixou Jerusalém e cruzou o ribeiro Cedron para chegar ao jardim de Getsemane sobre o monte das Oliveiras, onde era seu costume ir (Lucas 22:39).
O ribeiro Cedron ("vazão hibernal dos Cedros") escorre apenas após as chuvas pesadas do inverno na parte oriental de Jerusalém, entre a cidade e o Monte das Oliveiras, mas o pequeno vale em que corre leva seu nome. O rei Davi atravessou este vale descalço e chorando, quando fugia de Absalão, que o traiu com Aitofel (2 Samuel 15:23, 30), e mais tarde teve más associações ao se tornar o depósito de todas as formas de impurezas e ser usado como o cemitério comum da cidade.
A oração e o sofrimento extremo do Senhor no jardim não é mencionado neste evangelho, pois João se ocupa com a Sua glória e a Sua divindade, deixando que os outros evangelhos salientem a Sua humanidade.
Judas sabia que o Senhor tinha por hábito ir ao jardim de Getsemane à noite, por isso propôs aos sacerdotes mostrar onde Ele se encontraria a sós durante a festa no seu lugar habitual de oração, em troca de 30 moedas de prata (Mateus 26:15). Todos sabiam que Ele tinha realizado milagres, mas pensavam que, se Judas levasse com ele muitos homens armados, Jesus poderia ser capturado às escondidas. Portanto enviaram com ele um destacamento de soldados com seu comandante e alguns guardas do templo, levando tochas, lanternas e armas. Um destacamento é a décima parte de uma legião e consistiria de aproximadamente quinhentos homens.
De Sua parte, nesta última noite, o Senhor foi novamente a este lugar a fim de dar aos Seus inimigos a oportunidade de apanhá-lo. Ele sabia que queriam prendê-lo, mas tinham medo do povo e não ousavam tocar nEle no templo ou nas ruas de Jerusalém. Em incidentes anteriores, quando os inimigos do Senhor Jesus tentavam cercá-lo, Ele se escondia, porque ainda não era a hora certa. Ele podia simplesmente desaparecer de forma sobrenatural quando necessário. Mas desta vez o Senhor estava prestes a Se entregar sem oferecer resistência, assumindo o caráter de Cordeiro de Deus: ". . . como a ovelha que é muda perante os seus tosquiadores, assim ele não abriu a boca" (Isaías 53:7).
João não menciona o beijo dado por Judas como um sinal para os soldados e policiais. Provavelmente aconteceu antes versículo 4. O Senhor dirigiu-se ao ajuntamento e perguntou a quem procuravam - sabendo muito bem a resposta, naturalmente. Ele não era um simples homem fraco que tinha sido apanhado por alguns religiosos astutos e pelo poder de Roma, como algumas pessoas gostariam de sugerir. Se Ele não tivesse se rendido voluntariamente, todas as armas daqueles homens teriam sido absolutamente inúteis e sem valor, como descobriram imediatamente.
Eles disseram que procuravam Jesus o nazareno: Jesus vem de um nome hebraico que significa o Salvador, enquanto que Nazaré vem do grego Separado, como Sagrado, ou "renovo" no hebraico, outro nome para o Messias (Jeremias 23:5; 33:15; Zacarias 3:8; 6:12). O nome que lhe deram claramente representa quem Ele era realmente.
O Senhor identificou-se imediamente dizendo "EU SOU". A reação dos homens foi de terror, porque “Eu Sou” é o nome sagrado de Deus para os judeus. Naquele instante a glória de Deus naquele Homem se revelou em suas mentes (capítulo 1:14).
Mesmo nesta hora, quando Jesus se submetia como o Cordeiro de Deus, Ele manifestou a Sua divindade, e eles recuaram e caíram por terra. Não se prostraram para adorá-lo, mas caíram para trás de medo e absoluta consternação. Agora perceberam que Ele estava totalmente em comando da situação, e não podiam detê-lo sem a Sua autorização. Decerto houve uma total confusão por um momento. Eles não estavam vendo apenas Jesus de Nazaré, mas o Deus homem, o Senhor da glória.
Jesus tomou a iniciativa, repetiu a pergunta, eles medrosamente deram a mesma resposta, e Ele confirmou o que havia dito. Ele estava com a autoridade agora, permitiu que O prendessem mas ordenou que deixassem os seus discípulos ir. O Senhor tinha dito que não perderia nenhum dos que o Pai que lhe havia dado (capítulo 17:12), salvo o filho da perdição para que se cumprisse a Escritura. Este foi Judas, que também estava presente e muito em breve iria se suicidar (Mateus 27:5). Ninguém podia tocar nos Seus discípulos sem a Sua autorização. Normalmente teriam sido apreendidos e trazidos como testemunhas ou cúmplices, mas os soldados agora obedeciam a maior autoridade do próprio Senhor, e não os prenderam.
Mesmo quando Simão Pedro truculentamente tomou a sua espada e feriu Malco, o servo do sumo sacerdote, decepando-lhe a orelha direita, eles o deixaram ir. O Senhor imediatamente curou a orelha de Malco (Lucas 22:51) e repreendeu Pedro. Este discípulo impulsivo e franco provavelmente estava indignado. Perguntara anteriormente ao Senhor porque não podia acompanhá-lo para onde ia, e declarou que daria a sua vida por Ele. Tinha sido sincero. Mas o Senhor disse que ele não se conhecia, e que negaria ao seu Senhor aquela noite.
Como Pedro, é tão fácil fazer promessas e dedicar e rededicar as nossas vidas ao Senhor. O problema é que não podemos preenchê-las na nossa própria força. É apenas o poder do Espírito Santo que nos permitirá apresentar os nossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o nosso culto racional (Romanos 12:1).
A hora de Cristo tinha chegado, e Ele estava pronto para beber do cálice que o Pai lhe havia dado. Existem vários "cálices" mencionados nas Escrituras, por exemplo:
o cálice da vergonha (Habacuque 2:16), o cálice do espanto e assolação (Ezequiel 23:31-33), o cálice da embriaguez (Zacarias 12:2),
o cálice do julgamento (Salmo 75:8), ou cálice do castigo, do furor de Deus, de estremecimento (Salmo 11:6, Isaías 51:17, Jeremias 25:15, 49:12),
o cálice da salvação (Salmo 116:13), o cálice da herança (Salmo 16:5), o cálice da alegria (Salmo 23:5), o cálice da consolação (Jeremias 16:7),
o cálice da nova aliança no sangue de Cristo (Lucas 22:20) também chamado o cálice de bênção (1 Coríntios 10:16), e o cálice do Senhor (1 Coríntios 10:21).
O cálice que o nosso Senhor iria beber foi-lhe dado pelo Pai, e foi aquele cálice terrível, o cálice do julgamento que Ele suportou por nós na Cruz. Era totalmente repulsivo para Ele, porque seria feito pecado em nosso lugar, e seria separado do Pai para tomar sobre Si a punição, mas Ele o tomou voluntariamente, obedientemente. Aqueles que não confiam nele vão beber o cálice do julgamento eles próprios. O cálice do juízo também virá sobre o mundo (Apocalipse 15), sobre os seguidores da besta (Apocalipse 14:10), sobre a Grande Babilônia (Apocalipse 16:19) e sobre a Babilônia Religiosa (Apocalipse 18:6,7).
1 Tendo Jesus dito isto, saiu com seus discípulos para o outro lado do ribeiro de Cedrom, onde havia um jardim, e com eles ali entrou.
3 Ora, Judas, que o traía, também conhecia aquele lugar, porque muitas vezes Jesus se reunira ali com os discípulos.
3 Tendo, pois, Judas tomado a coorte e uns guardas da parte dos principais sacerdotes e fariseus, chegou ali com lanternas archotes e armas.
4 Sabendo, pois, Jesus tudo o que lhe havia de suceder, adiantou-se e perguntou-lhes: A quem buscais?
5 Responderam-lhe: A Jesus, o nazareno. Disse-lhes Jesus: Sou eu. E Judas, que o traía, também estava com eles.
6 Quando Jesus lhes disse: Sou eu, recuaram, e cairam por terra.
7 Tornou-lhes então a perguntar: A quem buscais? e responderam: A Jesus, o nazareno.
8 Replicou-lhes Jesus: Já vos disse que sou eu; se, pois, é a mim que buscais, deixai ir estes;
9 para que se cumprisse a palavra que dissera: Dos que me tens dado, nenhum deles perdi.
10 Então Simão Pedro, que tinha uma espada, desembainhou-a e feriu o servo do sumo sacerdote, cortando-lhe a orelha direita. O nome do servo era Malco.
11 Disse, pois, Jesus a Pedro: Mete a tua espada na bainha; não hei de beber o cálice que o Pai me deu?
Evangelho de João, capítulo 8, versículos 1 a 11