O Senhor continuou a Sua viagem para o interior da Galiléia, depois da interrupção em Sicar.
O ditado “que um profeta não recebe honra na sua própria pátria” (provérbio grego) é semelhante ao que o Senhor falou sobre Nazaré (Marcos 6:4, Mateus 13:57, Lucas 4:24). Provavelmente é mencionado aqui para explicar porque, tendo deixado a Judéia porque era muito popular ali (vs.1-3), Ele foi para a Galilélia onde ainda não tinha ministrado e onde aparentemente não tinha tanta fama como na Judéia e agora em Samária.
Entrando agora pelo interior da Galiléia chegou à cidade de Caná e foi bem recebido porque tinham ido à festa da Páscoa em Jerusalém e testemunhado as coisas que havia feito ali, como a purificação do templo, sinais miraculosos, etc. Decerto muitos ainda se lembravam também do seu primeiro sinal em Caná, quando havia transformado água em vinho numa festa de casamento.
Ouvindo que Jesus se encontrava em Caná, um homem de confiança do rei Herodes, oficial desse tetrarca na cidade de Cafarnaum, uns 30 quilômetros ao leste de Caná, subiu até lá para falar com Ele. O motivo era que seu filho estava à morte, e logo que chegou implorou a Jesus, chamando-o respeitosamente de “Senhor”, para voltar com ele e curar o seu filho, com isso demonstrando que cria no Seu poder.
O Senhor então lhe disse “Se não virdes sinais e prodígios, de modo algum crereis”. Como a declaração está no plural, pode ser uma censura ao povo em geral, retratando a sua teimosia de recusar absolutamente em crer que Jesus era o Messias sem pessoalmente ver “sinais e prodígios”: eles tinham ouvido os que foram a Jerusalém falar sobre os milagres incríveis que Elehavia feito, mas tinham que ver tudo com os seus próprios olhos. Mais tarde Ele diria: “Bem-aventurados os que não viram e creram” (cap. 20:29). Além de um favor a um oficial do rei, a cura que estava para fazer era um sinal para todo o povo, mas diferente dos demais pois não iriam vê-la: a cura se realizaria à distância.
O oficial, impaciente, rogou Lhe que descesse depressa até sua casa em Cafarnaum, antes que seu filho morresse. Como Marta e Maria mais tarde, (cap.11:21, 32), pensava que, uma vez morto, seria tarde demais. A resposta do Senhor foi “Vai, o teu filho vive”, significando que estava curado. Não havia necessidade que o Senhor fosse até Cafarnaum, uma cura efetiva e imediata foi feita à distância por Ele.
Lembra-nos o caso da cura de Naamã, o general da alta confiança do rei da Síria, que foi ao rei de Israel à procura da cura da sua lepra. O profeta Eliseu interveio, mas não falou com ele, apenas mandou-lhe um recado para que mergulhasse sete vezes no ínfimo Rio Jordão para ser curado. O general protestou contra essa indignidade, mas mediante a persuasão dos seus servos obedeceu, e Deus curou sua lepra, à distância do profeta.
Jesus também não queria angariar honras e reconhecimento por parte das autoridades, apenas disse ao oficial “vai, o teu filho vive”. O oficial creu na palavra do Senhor Jesus e não discutiu: partiu de volta para casa em obediência ao Seu mandado. No caminho de volta a Cafarnaum seus servos lhe trouxeram a notícia confirmando a cura do seu filho, que se deu exatamente na hora em que o Senhor havia dito que seu filho vivia.
Com esta prova o oficial creu, não mais só na palavra de Jesus (ver. 50), mas na Sua identidade de Filho de Deus, e toda a sua família também, sendo este o primeiro exemplo registrado na Bíblia de uma família inteira que creu em Cristo simultaneamente, como o carcereiro de Filipos (Atos 16:34) e Crispo (Atos 18:8).
O Senhor Jesus nos evidencia, através deste sinal, que realmente é o Filho de Deus e que Deus não está limitado pelo espaço físico em que vivemos. Assim como este oficial, e Naamã, aprendemos que o nosso Deus está sempre presente, que ouve nossas petições e nos atende quando obedecemos à Sua palavra, porque cremos nEle, a todo o tempo e em qualquer lugar do mundo.
As palavras “depois disso” (também cap. 3:22 e 6:1) não querem dizer que o que se segue aconteceu imediatamente depois. Este Evangelho não é um relato completo das obras do Senhor (cap. 21:25).
O Senhor Jesus havia subido a Jerusalém para uma festa dos judeus, não identificada no texto. É provável que tenha sido a segunda páscoa, pois a primeira e as outras duas são identificadas (capítulos 2:13 e 23; 6:4; 12:1).
Por causa da destruição do templo em 70 d.C., até recentemente não havia certeza sobre onde se situava o tanque de Betesda (“casa de misericórdia”) mencionado aqui, mas finalmente foi localizado e escavado perto de uma igreja construída pelos cruzados. Era uma espécie de piscina para nadar ou mergulhar, com cinco grandes alpendres em volta, onde um bom número de pessoas podiam se reunir.
Esse tanque era conhecido como um lugar onde ocorriam milagres de cura. Em torno dele ficavam muitos doentes que esperavam ser curados mediante um movimento milagroso da água, sendo alguns cegos, outros mancos e ainda outros estavam ressicados (enfraquecidos, atrofiados).
Nada se sabe sobre o mensageiro de Deus (ou anjo) que causava o movimento, nem se esses esperados milagres podiam acontecer a qualquer tempo, ou apenas em determinadas ocasiões, como em dias de festa. Mas só era curado o primeiro doente a entrar no tanque cada vez que se agitava a água.
É um perfeito quadro do pecador que, em seu desamparo espiritual, cegueira, claudicação e inutilidade procura uma solução para o vazio em sua alma através de rituais religiosos, práticas de caridade, cultos onde outros a dizem ter encontrado.
Encontrava-se ali um homem que sofria de uma enfermidade debilitante já por trinta e oito anos. Decorrido todo esse tempo é de se pensar que a esta altura estaria acomodado à sua situação, sem mais esperança de cura. Mas o fato de estar ali revelava que ainda esperava por um milagre.
O Senhor, é claro, conhecia tudo sobre ele e lhe perguntou se queria ser curado. Foi uma pergunta estranha para se fazer a um homem enfermo. Obviamente queria ser curado, mas percebemos pelo menos três motivos para que fosse feita:
Para trazer esperança ao homem. A crendice popular era que, cada vez que a água jorrava dessa fonte intermitente, havia poder curador na água para quem entrasse primeiro no tanque. O obstáculo físico deste enfermo o impedia de entrar antes dos outros, e, quem sabe, ele agora esperava que este homem bondoso que lhe fazia a pergunta poderia lançá-lo depressa no tanque na próxima oportunidade.
Para desviar os seus olhos do tanque, pois quem faria uma pergunta daquelas? Existe muita gente hoje que fica só esperando que alguma coisa aconteça em suas vidas. Mas estão destinadas a ter um desapontamento amargo, porque estão esperando com seus olhos fixos na coisa errada, na pessoa errada, no acontecimento errado.
O Senhor queria que ele admitisse a necessidade desesperada de cura e sua total incapacidade de consegui-la. É o mesmo com a salvação. O Senhor sabe que precisamos desesperadamente ser salvos, mas Ele espera ouvir a confissão dos nossos próprios lábios que estamos perdidos, que precisamos d’Ele e que O recebemos como nosso Salvador. Não nos salvamos pelo nosso próprio esforço, mas devemos primeiramente admitir nossa incapacidade para depois ser salvos.
A resposta que o homem deu revelou o seu desespero: não tinha ninguém que, ao ser agitada a água, o pusesse no tanque e outro entrava antes dele enquanto ia. Da mesma forma nos decepcionamos se pensarmos que temos condições para nos salvar da nossa culpa interior com nossos próprios recursos.
O homem estava assentado ou reclinado sobre a sua cama, que seria uma almofada ou colchão leve. O Senhor Jesus lhe disse, simplesmente: “Levanta-te, toma o teu leito e anda.” Sem argumentar que estava impossibilitado, ele se esforçou e teve sucesso, pois foi imediatamente curado. Aqui aprendemos que, quando somos salvos, em um ato de fé, não só nos levantamos em obediência ao nosso Salvador, mas passamos a andar em nova vida, fazendo a Sua vontade.
O Salvador nunca manda alguém fazer qualquer coisa sem lhe dar o poder de fazê-lo. Assim que falou, a saúde e o vigor fluiram para o corpo daquele inválido. Não foi uma recuperação gradual mas foi uma cura imediata, fazendo com que seus membros, que se achavam enfraquecidos ou mesmo atrofiados durante anos, voltassem à normalidade. Em seguida, houve obediência imediata à palavra do Senhor, pois ele tomou o seu leito e andou. Que emoção deve ter sido para ele fazer isso depois de trinta e oito anos de doença!
Cristo não se identificara ao homem antes de se retirar, por haver muita gente naquele lugar. Mesmo que já tivesse ouvido falar d’Ele, o homem nunca O havia visto, portanto não podia ter certeza que fora curado por Ele. Mas o Senhor sabia da disposição da sua alma e o favoreceu com a cura, assim como fez com um homem cego num caso semelhante (João 9:36). Deus nos conhece mesmo antes de nós O conhecermos (Gálatas 4:9). A cura não dependeu da fé do curado.
O Senhor não queria se dar a conhecer no meio daquela multidão. O motivo não é dado, mas obviamente Ele tinha um plano definido para a Sua conduta entre o povo, e esta não era hora apropriada para manifestar a Sua presença entre eles. Deixou que o milagre despertasse a curiosidade do povo, e era um sinal que lembrariam para provar a Sua identidade divina em ocasião mais oportuna.
Este milagre aconteceu no sétimo dia da semana, que era dia de descanso (ou sábado). Os judeus eram proibidos pela lei de Moisés de trabalhar nesses dias. Os religiosos judeus acrescentaram a sua própria definição detalhada do que era e o que não era proibido fazer. Esta foi a primeira das transgressões incorridas pelo Senhor em Jerusalém das regras instituidas por eles, dando origem a muita controvérsia (cap. 9:14, 16). A polêmica se espalhou à Galiléia quando Cristo voltou para lá (Marcos 2:23-3:6; Mateus12:1-14; Lucas 6: 1 -11).
O homem que havia sido curado era um judeu, mas assim mesmo não hesitou em levar seu colchão, seguindo as instruções do Senhor Jesus, apesar das tradições judaicas. Isto logo foi notado pelos líderes religiosos, que o repreenderam por estar carregando um fardo no sábado. A obediência às instruções do Senhor Jesus com frequência traz complicações para o crente em seu relacionamento com o mundo, mesmo o mundo religioso que segue convenções, tradições e ensinamentos humanos.
A resposta que lhes deu foi simples e direta: “Aquele que me curou, esse mesmo me disse: Toma o teu leito e anda”. Quem tinha tal poder sobre a natureza, deveria também ter autoridade para superar um costume ditado pela tradição dos homens. Para o crente, salvo pela sua fé em Cristo, o Seu comando supera todas as convenções humanas.
O fato que o homem foi encontrado no templo, que era, simbolicamente, a casa de Deus para os judeus, nos indica que era um homem piedoso e foi lá que o Senhor Jesus apareceu diante dele novamente para se identificar como Jesus que o havia curado. Mandou que não voltasse a pecar, para que algo pior não lhe acontecesse. Assim indicou que a sua enfermidade teria sido causada por pecado, embora nem sempre seja assim.
Não pecar é o padrão da santidade de Deus. O pecado tem fatalmente o resultado de morte espiritual e isso seria muito pior para o homem do que a enfermidade da qual havia sido curado, pois a morte espiritual leva à angústia e à sentença da ira eterna de Deus. O Senhor Jesus simplesmente não poderia ser Deus, se só mandasse “peque o menos possível”. Mas Ele veio para buscar e salvar o que se havia perdido, e esse homem teria acesso à salvação pela graça mediante a sua fé em Cristo, em virtude da obra de propiciação que Ele fez mais tarde.
Esta foi a primeira das transgressões das regras do sábado dos judeus incorridas pelo Senhor em Jerusalém, que deram origem a tanta amargura (cap. 9:14, 16). Essa controvérsia se espalhou à Galiléia quanto Cristo voltou para lá (Marcos 2:23-3:6; Mateus12:1-14; Lucas 6: 1 -11).
43 Passados os dois dias partiu dali para a Galiléia.
44 Porque Jesus mesmo testificou que um profeta não recebe honra na sua própria pátria.
45 Assim, pois, que chegou à Galiléia, os galileus o receberam, porque tinham visto todas as coisas que fizera em Jerusalém na ocasião da festa; pois também eles tinham ido à festa.
46 Foi, então, outra vez a Caná da Galiléia, onde da água fizera vinho. Ora, havia um oficial do rei, cujo filho estava enfermo em Cafarnaum.
47 Quando ele soube que Jesus tinha vindo da Judéia para a Galiléia, foi ter com ele, e lhe rogou que descesse e lhe curasse o filho; pois estava à morte.
48 Então Jesus lhe disse: Se não virdes sinais e prodígios, de modo algum crereis.
49 Rogou-lhe o oficial: Senhor, desce antes que meu filho morra.
50 Respondeu-lhe Jesus: Vai, o teu filho vive. E o homem creu na palavra que Jesus lhe dissera, e partiu.
51 Quando ele já ia descendo, saíram-lhe ao encontro os seus servos, e lhe disseram que seu filho vivia.
52 Perguntou-lhes, pois, a que hora começara a melhorar; ao que lhe disseram: Ontem à hora sétima a febre o deixou.
53 Reconheceu, pois, o pai ser aquela hora a mesma em que Jesus lhe dissera: O teu filho vive; e creu ele e toda a sua casa.
54 Foi esta a segunda vez que Jesus, ao voltar da Judéia para a Galiléia, ali operou sinal.
1 Depois disso havia uma festa dos judeus; e Jesus subiu a Jerusalém.
2 Ora, em Jerusalém, próximo à porta das ovelhas, há um tanque, chamado em hebraico Betesda, o qual tem cinco alpendres.
3 Nestes jazia grande multidão de enfermos, cegos, mancos e ressicados [esperando o movimento da água.]
Joh 5:4 [Porquanto um anjo descia em certo tempo ao tanque, e agitava a água; então o primeiro que ali descia, depois do movimento da água, sarava de qualquer enfermidade que tivesse.]
5 Achava-se ali um homem que, havia trinta e oito anos, estava enfermo.
6 Jesus, vendo-o deitado e sabendo que estava assim havia muito tempo, perguntou-lhe: Queres ficar são?
7 Respondeu-lhe o enfermo: Senhor, não tenho ninguém que, ao ser agitada a água, me ponha no tanque; assim, enquanto eu vou, desce outro antes de mim.
8 Disse-lhe Jesus: Levanta-te, toma o teu leito e anda.
9 Imediatamente o homem ficou são; e, tomando o seu leito, começou a andar. Ora, aquele dia era sábado.
10 Pelo que disseram os judeus ao que fora curado: Hoje é sábado, e não te é lícito carregar o leito.
11 Ele, porém, lhes respondeu: Aquele que me curou, esse mesmo me disse: Toma o teu leito e anda.
12 Perguntaram-lhe, pois: Quem é o homem que te disse: Toma o teu leito e anda?
13 Mas o que fora curado não sabia quem era; porque Jesus se retirara, por haver muita gente naquele lugar.
14 Depois Jesus o encontrou no templo, e disse-lhe: Olha, já estás curado; não peques mais, para que não te suceda coisa pior.
Evangelho de João, capítulo 4, do versículo 43 ao 5, versículo 9