No tempo de Cristo, Samaria era uma de três províncias romanas, situada entre as outras duas, Judéia e Galiléia. Originalmente era apenas uma cidade, fundada por Omri, um rei de Israel que fez dela a nova capital do seu reino dele; seu nome vem de Semer, o homem de quem comprou o outeiro sobre o qual foi edificada. (1 Reis 16:24).
O reino no norte de Israel então passou a ser conhecido também como Samaria; depois que a maioria da população sobrevivente foi levada ao exílio, os assírios repovoaram seu território com estrangeiros e lhes enviaram um sacerdote judeu para os ensinar como adorar o SENHOR, mas eles adotaram uma religião mista (2 Reis 17:24-41). O casamento entre esses estrangeiros e os judeus restantes resultou em uma raça mista, impura na opinião dos judeus que moravam no reino sulista.
Os judeus de raça pura odiavam essa mistura de raça chamada samaritana porque sentiam que os judeus que casaram com estrangeiros haviam traído o seu povo e a sua nação. Os samaritanos tinham construído um templo para si no Monte Gerizim, e embora tivesse sido destruído 150 anos antes, ainda adoravam ali.
A cidade de Samaria foi reconstruída por Herodes o Grande e chamou-a Sebaste (forma grega de Augustus) em honra do imperador que a deu para ele. No Novo Testamento a cidade é mencionada só no capítulo 8 de Atos, onde se lê que Filipe desceu para a cidade de Samaria e pregou ali.
Os judeus evitavam viajar pela região de Samaria e isto só era necessário para ir e voltar diretamente do norte da Judéia para o sul da Galiléia. A maioria seguiria uma rota pelo litoral, ou por Perea, referida no Novo Testamento como “a região além do Jordão”. Mas o Senhor precisou passar por Samaria, porque Ele quis alcançar uma certa mulher e o seu povo.
O poço de Jacó estava na propriedade inicialmente possuída por Jacó (Gênesis 33:18, 19). Os poços eram quase sempre situados fora da cidade ao longo da estrada principal, e duas vezes por dia, de manhã e à noite, as mulheres vinham retirar água. A sexta hora era o meio-dia de acordo com o horário judeu, e, como o Senhor era perfeitamente humano, Ele estava cansado com a Sua viagem e sedento.
Que contraste fazia esta mulher com o homem religioso, Nicodemus, no capítulo precedente! E como nosso Senhor lidou diferentemente com ela: foi severo e duro com ele, mas gentil e humilde com ela: pediu-lhe um favor, apelando para a sua compaixão!
Seus discípulos tinham ido comprar comida na cidade, e o fato que eles estavam comprando dos samaritanos também revelou a Sua rejeição total do preconceito judeu que considerava impura a comida do samaritano.
Sendo da raça mista menosprezada, a mulher ficou surpresa quando este judeu lhe pediu que lhe desse água do seu pote, e lhe disse assim.
Na Sua resposta Ele se referiu:
Ao dom de Deus, isto é, a Sua missão (capítulo 3:16, 2 Coríntios 9: 15).
À Sua identidade: não só um judeu, pois sabia que era o Filho de Deus, o Messias.
A água viva: isto é água corrente, como num rio ou numa nascente, ou um poço bem suprido por fontes. Este poço onde se encontravam era um tipo de cisterna na qual se juntava água provinda de chuva e orvalho, não suja, mas parada, inferior à de uma verdadeira fonte, que era sempre preferida (Gênesis 26:19; Levítico 14:5; Números 19:17). Naturalmente Ele estava se referindo ao Seu ensino, à salvação e ao Espírito Santo (Jeremías 2:13; Zacarias 13:1; 1 Coríntios 10:4; Apocalipse 7:17; 22:17).
O poço de Jacó tem mais de 30 metros de profundidade, e um balde de couro ficava ao lado para ser baixado com uma corda feita de cabelo de cabra, mas o Senhor não tinha corda, por isso a mulher perguntou como Ele podia obter a água viva de que estava falando? Seria Ele maior do que pai Jacó? Naturalmente, ela só estava pensando em água literal.
O Senhor esclareceu que Ele daria água melhor do que a do poço: quem dela bebesse nunca mais, jamais, teria sede (implicitamente declarando que Ele era superior a Jacó); mas se tornaria nele uma fonte de água que salta (borbulhando) até a vida eterna.
Teria a curiosidade da mulher sido despertada sobre este tipo novo de água ou teria ela pensado que Ele falava bobagem? Ela referiu-se meio ironicamente a essa água, e como poderia poupá-la da dificuldade de vir ao poço diariamente. Ela não prestou atenção às últimas palavras “até a vida eterna”, mas estava evidentemente confusa e, mais ainda, curiosa.
Jesus neste ponto virou totalmente a conversa dizendo-lhe com severidade: “Vai, chama o teu marido e vem cá.” Ele ia convencer a mulher do seu pecado e culpa, sem o que ela não poderia entender o uso de água como metáfora para extinguir uma sede ou necessidade espiritual. Ela primeiro tinha que reconhecer que era pecadora.
Ela se fez petulante outra vez, dizendo que não tinha marido. A palavra grega traduzida “marido” quer dizer tanto homem como marido. Ela tinha o seu “homem”, mas não era legalmente seu marido. Esse duplo sentido ocultou a decepção.
Para grande surpresa dela, Ele discerniu o verdadeiro sentido do que ela dizia, e leu o seu coração como somente Ele pode fazer, um dom sobrenatural sobre o qual João fala frequentemente (capítulo 1:48; 2:24; 5:20). “...Porque você teve quatro homens”, Ele disse, usando a mesma palavra que ela e acrescentando “e o que você tem agora não é seu marido” (no sentido de “marido legal”); “isso disseste com verdade”. Ela obviamente percebeu que Ele tinha um conhecimento sobrenatural da sua situação (vv. 19, 39).
Mais reverente agora, ela admitiu que Ele era um profeta, e mudou o assunto para o de uma notória disputa teológica sobre o lugar em que se deveria adorar: “nossos pais (Abraão e Jacó) adoraram neste monte (Gerizim), mas vós (os judeus), dizem que em Jerusalém é o lugar onde se deve adorar”.... Ela pensou que, sendo um profeta, talvez Ele gostaria de discutir assuntos religiosos e assim afastar a sua atenção da situação dela. Segundo a tradição dos samaritanos (não confirmada na Bíblia), Abraão teria levado Isaque para sacrificá-lo nesse monte, onde fez um altar, e Jacó teria tido o seu notório sonho da escada que ia até o céu também no cume deste monte.
Mas o Senhor lhe disse que estava chegando a hora em que o Pai não seria adorado em nenhum desses lugares. Ela não tinha dito Quem seria adorado, e Ele assim O declarou como sendo “o Pai”.
Os Samaritanos rejeitavam os livros dos profetas e os Salmos, deprivando-se assim de um conhecimento mais completo de Deus, enquanto que os judeus, o “povo escolhido”, tiveram revelações mais completas de Deus (Salmo 147:19; Romanos 9:3-5); mas mesmo assim os judeus, como um povo, não reconheceram Deus em Cristo (capítulos 1: 11, 26; 7:28).
A salvação é para o mundo inteiro (capítulo 3:17), mas vem dos judeus. Este tremendo fato nunca deveria ser esquecido, não importando o quanto os judeus provaram ser imerecedores desse privilégio. O Messias, o Filho de Deus, era um judeu.
O que interessa não é onde, mas como adoramos e deveria ser na realidade, no espírito do homem, em sinceridade, e assim em verdade. Tudo isso de acordo com o Espírito Santo (Romanos 8:5) que é o Espírito da verdade (capítulo 16:13). Aqui o Senhor disse a última palavra em adoração: o Pai se revelou no Filho, que é a verdade (capítulo 14:6, 9) e busca aqueles que O adorarão, uma doutrina que percorre todo o Evangelho (capítulos 3:16; 6:44; 15:16; 1 João 4: 10).
Deus é Espírito, como Deus é Luz (1 João 1:5) e Deus é Amor (1 João 4:8), e igualmente não se pode trocar a ordem para “o Espírito é Deus”, “a Luz é Deus” e “o Amor é Deus”. A incorporalidade de Deus é declarada claramente bem como a personalidade de Deus. Tudo isso foi exposto pela primeira vez em três palavras.
Talvez procurando terminar essa conversa, a mulher replicou que quando o Messias viesse, ele explicaria todas essas coisas. Sem dúvida, para a sua surpresa, em linguagem clara Jesus então declarou que Ele próprio era o Messias (ver também o capítulo 9:37).
4 E era-lhe necessário passar por Samária.
5 Chegou, pois, a uma cidade de Samária, chamada Sicar, junto da herdade que Jacó dera a seu filho José;
6 achava-se ali o poço de Jacó. Jesus, pois, cansado da viagem, sentou-se assim junto do poço; era cerca da hora sexta.
7 Veio uma mulher de Samária tirar água. Disse-lhe Jesus: Dá- me de beber.
8 Pois seus discípulos tinham ido à cidade comprar comida.
9 Disse-lhe então a mulher samaritana: Como, sendo tu judeu, me pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana? (Porque os judeus não se comunicavam com os samaritanos).
10 Respondeu-lhe Jesus: Se tivesses conhecido o dom de Deus e quem é o que te diz: Dá-me de beber, tu lhe terias pedido e ele te haveria dado água viva.
11 Disse-lhe a mulher: Senhor, tu não tens com que tirá-la, e o poço é fundo; donde, pois, tens essa água viva?
12 És tu, porventura, maior do que o nosso pai Jacó, que nos deu o poço, do qual também ele mesmo bebeu, e os filhos, e o seu gado?.
13 Replicou-lhe Jesus: Todo o que beber desta água tornará a ter sede;
14 mas aquele que beber da água que eu lhe der nunca terá sede; pelo contrário, a água que eu lhe der se fará nele uma fonte de água que jorre para a vida eterna.
15 Disse-lhe a mulher: Senhor, dá-me dessa água, para que não mais tenha sede, nem venha aqui tirá-la.
16 Disse-lhe Jesus: Vai, chama o teu marido e vem cá.
17 Respondeu a mulher: Não tenho marido. Disse-lhe Jesus: Disseste bem: Não tenho marido;
18 porque cinco maridos tiveste, e o que agora tens não é teu marido; isso disseste com verdade.
19 Disse-lhe a mulher: Senhor, vejo que és profeta.
20 Nossos pais adoraram neste monte, e vós dizeis que em Jerusalém é o lugar onde se deve adorar.
21 Disse-lhe Jesus: Mulher, crê-me, a hora vem, em que nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai.
22 Vós adorais o que não conheceis; nós adoramos o que conhecemos; porque a salvação vem dos judeus.
23 Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem.
24 Deus é Espírito, e é necessário que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade.
25 Replicou-lhe a mulher: Eu sei que vem o Messias (que se chama o Cristo); quando ele vier há de nos anunciar todas as coisas.
26 Disse-lhe Jesus: Eu o sou, eu que falo contigo.
Evangelho de João, capítulo 4, versículos 4 a 26