Este acontecimento teve lugar no terceiro dia desde a partida para a Galiléia, quando Felipe fora chamado para se juntar aos primeiros discípulos do Senhor Jesus, André e Simão Pedro (Capítulo 1: 40-43), uma semana depois que João Batista tinha sido interrogado por mensageiros dos judeus (Capítulo 1: 19). O Senhor e esses discípulos, a quem se juntou Natanael (também chamado Bartolomeu) haviam chegado a Caná da Galiléia, a cidade de Natanael (João 21: 2), e compareceram a um casamento ao qual haviam sido convidados.
Os casamentos naqueles dias envolviam festas ao longo de uma semana. Realizavam-se banquetes para muitos convidados e a semana era dedicada para celebrar a vida nova do casal. Muitas vezes a cidade inteira era convidada, e todos viriam, pois era considerado um insulto recusar um convite de casamento.
José, o marido de Maria, provavelmente já havia morrido. Maria, a mãe de Jesus (nunca chamada pelo seu nome neste Evangelho), deve ter sido amiga íntima da família envolvida no casamento, talvez mesmo parente, pois estava ali e comandava os criados. Jesus foi convidado, bem como os seus discípulos. Este pequeno grupo formou o núcleo da grande multidão de discípulos que, através dos tempos, seguiram a Cristo como Mestre, Senhor e Salvador. O termo “discípulo”, que apenas significa “aluno”, é às vezes restrito aos doze apóstolos, mas frequentemente é usado num sentido mais amplo (por exemplo, nos capítulos 6:61,66 e 20:30).
Quando o vinho faltou, houve constrangimento por algo básico nas refeições daqueles dias. Em alguns lugares da Bíblia vinho é indicativo de alegria. Maria se preocupou e chamou a atenção de Jesus ao fato: “eles não têm vinho”. Poderia parecer que ela apenas fazia uma observação inocente. Mas estava implícita uma ordem ao seu Filho mais velho para que solucionasse o problema, e Ele sabia disto. Maria provavelmente não esperava um milagre, pois Ele nunca havia feito um antes – este foi o primeiro de todos (v.11).
Na Sua resposta, “Mulher, que tenho eu contigo?” usou a palavra “mulher” em vez de “mãe”, não por alguma censura (ver também capítulo 19:26), nem falta de respeito: hoje diríamos “Senhora”. A frase literalmente significava “que é que temos com isto?”. Há ainda uma sugestão implícita que ela não podia exercer autoridade materna sobre Ele em seu trabalho messiânico.
A frase "Ainda não é chegada a minha hora“, sempre se refere a um fato marcante no futuro, especialmente à hora da Sua morte (capítulos 7: 30; 8: 20; 12: 23; 13: 1; 17: 1). Aqui deve se referir ao início da manifestação pública da Sua identidade messiânica, embora num sentido mais imediato possa parecer que fosse a Sua intervenção na provisão de vinho. Entende-se melhor assim, ao levarmos em conta que Ele falava do ponto de vista da eternidade, sabedor que era de tudo e de quando os acontecimentos iam se realizar.
Embora Maria não soubesse a solução que Jesus ia dar, ela confiava n’Ele para dar a que fosse mais correta naquela situação. Os que crêem no Senhor Jesus devem ter essa mesma confiança e deixar aos Seus cuidados competentes a solução de situações que não compreendem ou sentem-se incapazes de resolver.
Maria entendeu suficientemente a resposta que havia recebido para não insistir em dar-Lhe ordens. Mais que ninguém ali presente, por experiência própria na Sua concepção e convivência, sabia que seu Filho era também o Filho de Deus, portanto imediatamente se submeteu à Sua maneira de proceder. No entanto, desejando que o problema fosse resolvido e sabendo que Ele tinha a solução, ordenou aos servos “Fazei tudo quanto ele vos disser", manifestando sua total confiança n'Ele.
Essas palavras de Maria permanecem até hoje como o princípio mais importante que devemos tomar em nossa vida espiritual. O Senhor Jesus privilegiou os Seus remidos chamando-os de “Meus irmãos”, mas nunca devemos perder a nossa reverência para com a Sua divina Pessoa por causa disso. É nosso dever submetermos a nossa vida e tudo o que fazemos ao Seu comando, à Sua Palavra, e nunca nos atrevermos a lhe dar ordens ou exigir em Seu Nome algo de Deus que desejamos para a nossa satisfação pessoal. Somos Seus servos e, a exemplo dos apóstolos que nunca O chamaram de “irmão” no relato das Escrituras ou nas suas epístolas, devemos tratá-Lo sempre como Senhor. O nome “Jesus” lhe foi dado em Sua humanidade (Mateus 1:21), mas é sempre acompanhado por Senhor, ou Cristo, nas epístolas.
É muito importante também saber que estas foram as últimas palavras procedentes da boca de Maria registradas em todo o Novo Testamento. Quem dá as ordens é o próprio Senhor Jesus, não os Seus discípulos nem mesmo a Sua mãe.
As talhas de pedra cheias de água (as daquela casa continham cerca de 110 litros cada uma) eram disponibilizadas, especialmente em festas, para a lavagem cerimonial das mãos (2 Reis 3:11; Marcos 7:3). De acordo com a lei cerimonial dos judeus, as pessoas se faziam impuras ao tocar em objetos da vida cotidiana. Antes de comer, os judeus despejavam água sobre as suas mãos a fim de purificar-se de quaisquer más influências associadas ao que tinham tocado.
Jesus mandou que os servos enchessem as seis talhas até em cima com água: não sobrou espaço para mais nada. Em seguida instruiu-os a tirar (uma amostra) e levá-la ao diretor da festa. Aparentemente, era ainda água quando foi tirada (versículos 7 e 9), mas foi transformada em vinho antes de ser provada pelo diretor e os convidados. Note-se que nem o Senhor nem os discípulos intervieram de qualquer forma, mas foram os servos que, obedientes, encheram as talhas e levaram a amostra. Também não havia possibilidade de acrescentar qualquer coisa à água nas talhas sem que transbordassem, pois estavam cheias até em cima.
O diretor da festa era responsável pela decoração do ambiente e provava o alimento antes de ser servido. Parece que nada sabia do acontecido e não imaginava que os servos haviam trazido água das talhas. Surpreendeu-se com a boa qualidade do vinho e chamou o noivo, aparentemente o responsável pela escolha do vinho e declarou sua surpresa que o melhor vinho fora guardado para o fim (contrariamente ao que acontece agora, o vinho novo com baixo teor alcoólico - ou mesmo suco de uva - era considerado melhor do que o vinho velho, que devia ser aquecido ou diluído em água antes de beber). Era costume servir o vinho novo, mais caro, para começar, e o tipo mais barato, diluído, depois que os convidados já tinham bebido bem.
Este acontecimento não foi uma parábola, mas mesmo assim nos lembra de algumas verdades espirituais. Mencionamos algumas a seguir:
A Palavra de Deus tem como símbolo a água que lava e purifica. Mas por um milagre de Deus essa água, a Bíblia, é transformada em “água viva”, como o vinho do milagre, símbolo do Espírito Santo, que nos traz a mensagem do Evangelho e resulta na vida eterna, gozo, paz e alegria.
Cristo começou seu ministério na terra num casamento. No que diz respeito à Sua igreja, Ele irá celebrar a sua conclusão com outro casamento em que Ele será o Noivo, e a igreja será apresentada como sendo a Sua noiva.
O primeiro milagre de Moisés foi transformar água em sangue, mas o primeiro milagre de Cristo foi transformar água em vinho. A lei foi dada através de Moisés, mas a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo. Que contraste!
O Senhor Jesus estava executando a maior e mais importante missão da história humana, mas concedeu Seu tempo precioso para aceitar um convite de casamento e participar das suas atividades. A nossa missão permite também frequentemente participar das alegrias de outros em festejos e outras celebrações.
Com este sinal inicial o Senhor Jesus partiu do testemunho de João Batista para o testemunho das Suas próprias obras para assim manifestar que era o Messias prometido à nação de Israel. É o primeiro de sete sinais, ou milagres, descritos neste Evangelho para que o leitor creia “que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenha vida em Seu nome.”
1 Três dias depois, houve um casamento em Caná da Galiléia, e estava ali a mãe de Jesus;
2 e foi também convidado Jesus com seus discípulos para o casamento.
3 E, tendo acabado o vinho, a mãe de Jesus lhe disse: Eles não têm vinho.
4 Respondeu-lhes Jesus: Mulher, que tenho eu contigo? Ainda não é chegada a minha hora.
5 Disse então sua mãe aos serventes: Fazei tudo quanto ele vos disser.
6 Ora, estavam ali postas seis talhas de pedra, para as purificações dos judeus, e em cada uma cabiam duas ou três metretas.
7 Ordenou-lhe Jesus: Enchei de água essas talhas. E encheram- nas até em cima.
8 Então lhes disse: Tirai agora, e levai ao mestre-sala. E eles o fizeram.
9 Quando o mestre-sala provou a água tornada em vinho, não sabendo donde era, se bem que o sabiam os serventes que tinham tirado a água, chamou o mestre-sala ao noivo
10 e lhe disse: Todo homem põe primeiro o vinho bom e, quando já têm bebido bem, então o inferior; mas tu guardaste até agora o bom vinho.
11 Assim deu Jesus início aos seus sinais em Caná da Galiléia, e manifestou a sua glória; e os seus discípulos creram nele.
Evangelho de João, capítulo 2, versículos 1 a 11