Na lei dos judeus, dos gregos e dos romanos, a declaração de alguém não era aceita como testemunho se fosse a respeito dele próprio (Deuteronômio 19: 1, Mateus 18: 16, 2 Coríntios 13: 1; 1 Timóteo 5: 19). Ainda assim, em João 8: 12-19 Jesus reivindica que Seu testemunho de Si próprio é verdade porque o Pai dá confirmação à Sua mensagem, sendo o Pai e o Filho as duas Testemunhas (capítulo 8: 17). É um paradoxo e no entanto é verdadeiro.
Aqui o Senhor se submete à demanda rabínica para evidência de outros, porque não aceitariam o testemunho d’Ele próprio (capítulo 3:11). Ele lhes declara que têm o testemunho do Pai (versículos 32, 37, capítulo 8:17), de João Batista (versículo 33), das Suas obras (versículo 36), e das Escrituras (versículo 39), particularmente o de Moisés (versículo 45).
Quanto a João Batista, seu testemunho era um fato oficial e permanente porque eles próprios tinham enviado uma comitiva a João e ele lhes tinha dado o seu testemunho pessoal, que deveria ser reconhecido como sendo confiável pelo sinédrio (capítulo 1:19-28). O testemunho de João Batista era de valor permanente e contínuo, sendo este o propósito da sua missão (capítulo 1:7).
Mas o Senhor não recebe o testemunho de apenas um homem como João: ele foi a menor das testemunhas, contudo foi dado, como os outros, a fim de que pudessem crer e ser salvos. Isto era o propósito da vinda de Cristo, que o mundo pudesse ser salvo (capítulo 3:17). Ele sentia intensamente a tarefa que lhe fora designada pelo Pai (capítulo 3:35) e declarou ao fim que a tinha executado (capítulo 17:4; 19:30).
A esta hora João tinha sido aprisionado, seu ministério ativo havia se encerrado, e o seu propósito tinha sido realizado - é por isso que o pretérito perfeito foi usado no versículo 35. João não era a Luz (capítulo 1:8) mas uma lâmpada, ou vela, brilhando na escuridão.
Como uma lâmpada que é acendida e queima, e assim é consumida, ele anunciou a vinda do Cordeiro de Deus para trazer salvação aos que se achavam na escuridão do pecado, como esses judeus. Eles se mostraram dispostos a aceitar João, por causa da sua popularidade temporária (capítulo 1:19, Marcos 1:5; Mateus 3:5; 11:7; 21:26), mas a luz que João estava brilhando realmente não iluminou as suas mentes. O interesse que tinham era um entusiasmo frívolo, superficial e efêmero, só por uma hora, e depois se voltaram contra ele.
Quando a Luz vem, não se precisa da lâmpada mais. Assim quando o Senhor Jesus que, conforme Ele próprio declarou, é a Luz do Mundo (capítulo 8:12, 9:5; 12:46) começou o Seu ministério, João foi extinto. Todos os crentes são de certo modo a luz do mundo (Mateus 5:14) porque o mundo recebe a Luz de Cristo por nosso intermédio.
Mas, bom como era o testemunho de João, Cristo tinha testemunho superior.
Embora Ele mantivesse que a forma mais elevada de fé não precisava da evidência das obras (capítulo 2:23; 10:38; 14:11), as próprias obras:
levavam o selo da aprovação do Pai (capítulo 5:20,36; 10:25),
provavam que o Pai O tinha enviado, e
não podiam ser rejeitadas como testemunho (capítulo 10:25; 10:37; 15:24), porque eram as Suas credenciais. Ele saia nas multidões, nas estradas principais e pelos caminhos, e à medida que Se movia, o povo era curado. As declarações que se fazem dizendo que hoje existem pessoas que têm o mesmo poder que Jesus tinha é blasfêmia neste contexto, porque a singularidade dos milagres que Ele executou atesta que Ele era o Filho de Deus.
O próprio Pai tinha dado o Seu testemunho. Ao invés da voz do Pai em Seu batismo (Marcos 1: 11), na transfiguração (Marcos 9:7), ou quando da visita dos gregos (capítulo 12:28), a maneira de falar do Senhor aqui indica que estava se referindo ao testemunho do Pai no coração dos crentes (1 João 5:9, 10). O testemunho de Deus não veio de Si próprio em voz audível nem em forma visível (capítulo 1: 18; 6:46; 1 João 4:12), mas o Senhor disse mais tarde que aqueles que O tinham visto tinham visto o Pai (capítulo 14:9), significando que tanto a voz como a forma da voz do Pai eram distintas das do Filho.
A palavra de Deus tinha vindo através dos séculos pelos profetas para eles, mas não habitava neles (capítulo 10:35; 15:3; 17:6; 1 João 1:10; 2:14), pois embora pudessem conhecê-la bem, escolheram não crer n’Aquele a quem o Pai enviou: o Messias. Embora Ele lhes tivesse dado a palavra de Deus, eles rejeitaram tanto Sua pessoa como a palavra de Deus (capítulo 14:9-10).
Jesus lhes disse que examinavam as Escrituras (Mateus 21:42; Lucas 24:27) porque pensavam que tinham nelas a vida eterna: certamente os seus rabinos utilizavam formalmente a letra das Escrituras como um meio de salvação. Mas o verdadeiro valor das Escrituras está no testemunho que dão do Messias, e eles não queriam vir a Ele para que pudessem ter vida (capítulo 20:31): Jesus era rejeitado por eles porque amavam a escuridão em vez da luz (capítulo 3:19).
O Senhor não esperava mera honra e elogio dos homens (versículo 34), porque o Seu motivo não era a ambição. Ao contrário dos judeus (capítulo 12:43; Mateus 6:1) Ele não buscou a Sua própria glória, mas a glória e comunhão do Pai (capítulo 1:14; 2:11; 7:18). Ele os conhecia como só Deus pode, e reconhecia que eles não amavam a Deus e conseqüentemente não receberam Aquele que veio em nome do Pai.
Sete vezes neste Evangelho o Senhor falou do "Nome" do Pai (capítulo 5:43; 10:25; 12:28; 17:6, 11, 12, 26).
Os líderes religiosos dos judeus naquele tempo estavam dispostos a receber pessoas que chegavam à proeminência messiânica “em seu próprio nome”, seja quem fosse. Eram crédulos com respeito aos falsos messias, mas incrédulos sobre Ele que fornecia toda essa evidência. Um dia o Anticristo virá em seu próprio nome, terá uma imagem feita de si e o mundo, tendo rejeitado Cristo, o acolherá.
Eles não eram verdadeiros judeus (Romanos 2:29; Ester 9:28) porque não buscavam a honra que só vem de Deus, mas preferiam o elogio dos homens (Mateus 6:1; 23:5), como os fariseus que temiam confessar a Cristo (capítulo 12:43).
Até mesmo Moisés, em quem tinham colocado a sua esperança, escreveu sobre o Senhor Jesus (Deuteronômio 18: 18, João 3:14, 8: 56): se não acreditavam no que ele escreveu, como acreditariam nas suas palavras sobre Abraão que previu o dia de Cristo? O Senhor confirma aqui claramente o fato que Moisés escreveu porções do Velho Testamento (também veja Lucas 24:27, 44 com a mesma idéia). A autoridade de Moisés era a maior de todas para os judeus. Não havia resposta dos rabinos para esta conclusão de Cristo.
Quando alguém começa a fazer um ataque ao Velho Testamento, ele realmente está fazendo um ataque sutil ao Senhor Jesus: há muita gente que, muito imprudentemente, põem dúvidas sobre o Velho Testamento e não percebem que o Velho Testamento é o fundamento do Evangelho de Cristo.
31 Se eu der testemunho de mim mesmo, o meu testemunho não é verdadeiro.
32 Outro é quem dá testemunho de mim; e sei que o testemunho que ele dá de mim é verdadeiro.
33 Vós mandastes mensageiros a João, e ele deu testemunho da verdade;
34 eu, porém, não recebo testemunho de homem; mas digo isto para que sejais salvos.
35 Ele era a lâmpada que ardia e alumiava; e vós quisestes alegrar-vos por um pouco de tempo com a sua luz.
36 Mas o testemunho que eu tenho é maior do que o de João; porque as obras que o Pai me deu para realizar, as mesmas obras que faço dão testemunho de mim que o Pai me enviou.
37 E o Pai que me enviou, ele mesmo tem dado testemunho de mim. Vós nunca ouvistes a sua voz, nem vistes a sua forma;
38 e a sua palavra não permanece em vós; porque não credes naquele que ele enviou.
39 Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna; e são elas que dão testemunho de mim;
40 mas não quereis vir a mim para terdes vida!
41 Eu não recebo glória da parte dos homens;
42 mas bem vos conheço, que não tendes em vós o amor de Deus.
43 Eu vim em nome de meu Pai, e não me recebeis; se outro vier em seu próprio nome, a esse recebereis.
44 Como podeis crer, vós que recebeis glória uns dos outros e não buscais a glória que vem do único Deus?
45 Não penseis que eu vos hei de acusar perante o Pai. Há um que vos acusa, Moisés, em quem vós esperais.
46 Pois se crêsseis em Moisés, creríeis em mim; porque de mim ele escreveu.
47 Mas, se não credes nos escritos, como crereis nas minhas palavras?
Evangelho de João, capítulo 5, versículos 31 a 47