Tendo estabelecido a supremacia do Senhor Jesus sobre os anjos (intermediários sobrenaturais do Velho Testamento), o autor de Hebreus agora demonstra Sua superioridade sobre a pessoa de Moisés, homem escolhido por Deus para transmitir a Sua Lei ao Seu povo, e a quem é atribuída a autoria dos primeiros cinco livros da Bíblia.
A enorme influência de Moisés continuou sobre o povo de Israel, desde a sua libertação da escravidão no Egito até hoje. Seu nome é mencionado 750 vezes no Velho Testamento, superado apenas por Davi (970). Moisés, o príncipe do Egito, pastor, profeta, mediador e escritor é o cerne do judaísmo em sua qualidade de protoprofeta e legislador por excelência.
Moisés também é respeitado pelos cristãos como progenitor tipológico de Cristo Jesus, o “profeta como Moisés” (Deuteronômio 18:15-18). No Novo Testamento, Moisés aparece mais vezes do que qualquer outra figura do Velho Testamento, mesmo até Davi (80, contra 61).
No mundo do judaísmo do primeiro século depois de Cristo (e ao longo da história judaica que se seguiu), Moisés atraiu para si uma estima quase sobrenatural. O Talmude, a lei oral judaica, contém a crença expressada por vários rabinos "que havia uma relação cósmica, se não equivalência, entre Moisés e o Messias." Por exemplo, em uma discussão sobre o propósito da criação, enquanto um rabino opinou que o mundo foi criado para o Messias, outro era da opinião de que a honra pertence a Moisés.
Embora um pouco menos grandioso em suas concepções messiânicas, um rabino extremamente influente do século XII, Maimônides, elevou Moisés sobre o Messias esperado (em sua expectativa), escrevendo que o Messias seria maior do que todos os profetas, com exceção de Moisés, e que "o Messias, com efeito, se classifica após Moisés em eminência e distinção."
Assim vemos que Moisés foi um dos maiores heróis nacionais de Israel. Portanto, o terceiro passo principal na estratégia do escritor é demonstrar a infinita superioridade de Cristo sobre Moisés.
A mensagem do livro aos Hebreus é dirigida aos irmãos santos, participantes da vocação celestial. Todos os verdadeiros crentes são santos em Cristo quanto à sua posição diante de Deus, e devem ser santos na prática, judeus ou gentios. Sua vocação celestial está em contraste com o chamado terrestre de Israel.
Os santos do Velho Testamento foram escolhidos para receber bênçãos materiais na terra da promessa (embora tivessem uma esperança celestial também). Os santos do Novo Testamento, salvos pela graça de Deus mediante a fé no Senhor Jesus Cristo, são incorporados à Sua igreja ao se converterem, são escolhidos para receber bênçãos espirituais aqui e uma herança celestial no futuro, bem como reinarão com Cristo quando Ele assumir o Seu reino na terra.
O Senhor Jesus é eminentemente digno de ser considerado por nós como o Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa confissão. Ao confessá-lo como Apóstolo, declaramos que Ele representa Deus para nós. Ao confessá-lo como Sumo Sacerdote, reconhecemos que Ele nos representa diante de Deus.
Existe um aspecto em que Jesus Cristo se assemelhou a Moisés. Ele foi fiel a Deus, tal como Moisés foi fiel na casa de Deus. Aqui a “casa de Deus” compreende não apenas o Tabernáculo, mas também todo o ambiente dentro do qual Moisés representava os interesses de Deus. É a casa de Israel, o povo terreno de Deus desde a antiguidade. Mas aí a semelhança termina. Em todos os outros aspectos, há indiscutível superioridade:
O Senhor Jesus é digno de mais glória do que Moisés porque o construtor de uma casa tem mais honra do que a própria casa. O Senhor Jesus é o Construtor da casa de Deus; Moisés foi apenas uma parte da casa.
Jesus é maior porque Ele é Deus. Cada casa deve ter um construtor. Quem construiu todas as coisas foi Deus. Aprendemos em João 1:3, Colossenses 1:16 e Hebreus 1:2, 10, que o Senhor Jesus foi o agente ativo na criação.
A conclusão é que Moisés foi um servo fiel na casa de Deus (Números 12:7), ensinando e dirigindo os homens pelo caminho que levava à vinda do Messias. Ele deu testemunho daquilo que iria ser anunciado depois, ou seja, a boa notícia da salvação em Cristo. Por isto Jesus disse em certa ocasião, "se crêsseis em Moisés, creríeis em mim; porque de mim ele escreveu" (João 5:46). Em Sua explicação aos dois discípulos na estrada de Emaús, Jesus “começando por Moisés, e por todos os profetas, explicou-lhes o que dele se achava em todas as Escritura " (Lucas 24:27).
Mas Cristo foi fiel na casa de Deus como um Filho, não como um servo. E no caso dEle, a filiação significa igualdade com Deus. A casa de Deus é a sua própria casa. Aqui, o escritor explica o que significa a casa de Deus hoje. É composto por todos os crentes no Senhor Jesus: em cuja casa estamos "se tão-somente conservarmos firmes até o fim a nossa confiança e a glória da esperança".
A princípio, isto parece estar dizendo que nossa salvação depende de guardarmos firmes essas duas coisas. Nesse caso, a salvação seria devida a um esforço de perseverança nossa ao invés do trabalho de Cristo que terminou na Cruz. O verdadeiro significado é que provamos que somos parte da casa de Deus ao nos manter firmes. A perseverança é uma prova dessa realidade. Quem perde a confiança em Cristo e nas Suas promessas, retornando para rituais e cerimônias, demonstra que nunca nasceu de novo. É contra tal apostasia que a próxima advertência é dirigida.
Heb 3:1 Pelo que, santos irmãos, participantes da vocação celestial, considerai o Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa confissão, Jesus,
2 como ele foi fiel ao que o constituiu, assim como também o foi Moisés em toda a casa de Deus.
3 Pois ele é tido por digno de tanto maior glória do que Moisés, quanto maior honra do que a casa tem aquele que a edificou.
4 Porque toda casa é edificada por alguém, mas quem edificou todas as coisas é Deus.
5 Moisés, na verdade, foi fiel em toda a casa de Deus, como servo, para testemunho das coisas que se haviam de anunciar;
6 mas Cristo o é como Filho sobre a casa de Deus; a qual casa somos nós, se tão-somente conservarmos firmes até o fim a nossa confiança e a glória da esperança.
Hebreus, capítulo 3, versículos 1 a 6