O Senhor Jesus fez quatro grandes discursos. Três são encontrados no Evangelho de Mateus: o sermão da montanha (Mateus 5-7); as Parábolas (Mateus 13), relatando sobre o Reino dos Céus; e a profecia no Monte das Oliveiras (Mateus 24 e 25).
Veremos agora o discurso do Cenáculo, que é relatado nos capítulos 13 a 17, um dos maiores que o nosso Senhor fez. É o mais longo, e nele Ele fala do Seu amor para com os que lhe pertencem, como devem viver n’Ele, a provisão que guarda para eles, e o Seu relacionamento com eles.
O lugar em que foi dita a maior parte deste discurso foi o cenáculo preparado antecipadamente pelo Senhor para celebrar a sua última ceia pascoal com os seus discípulos. O discurso propriamente dito começa depois da ceia e prossegue até a Sua detenção no jardim de Getsêmane (capítulo 13:31 até o final do capítulo 17).
As palavras concernentes à instituição da Ceia do Senhor não são mencionadas neste Evangelho. A hora teria sido a noite da terça-feira que precedia a festa da Páscoa (quarta-feira) e a Preparação para a festa dos Pães Asmos (quinta-feira).
O Senhor tinha chamado Judas de “diabo” um ano antes (capítulo 6:70-71), e Satanás havia tomado conta de Judas quando ele ofereceu-se aos principais dos sacerdotes e aos capitães para trair o Senhor (Lucas 22:3). Satanás agora tinha uma porta aberta para o coração de Judas. O Senhor sabia que iria ser traído por um de seus discípulos, negado por outro, e abandonado por todos eles por algum tempo. Ele ainda estava disposto a lhes mostrar como os amava, em palavras e gesto. Deus nos conhece tão completamente como Cristo conheceu os Seus discípulos (João 2:24, 25; 6:64). Ele tem conhecimento dos pecados que cometemos e dos que ainda vamos cometer. Ainda assim, ele nos ama.
O Filho de Deus deixou a sua glória no céu, desceu a esta terra, e assumiu sobre si a humanidade, sendo feito à semelhança de um servo. Ele foi o Servo modelar, e demonstrou aos Seus discípulos a Sua atitude como servo. Lavar os pés dos hóspedes era um trabalho que o servo de uma família fazia quando eles chegavam. Mas ele tirou o manto que usava, cingiu-se com uma toalha próxima à sua cintura, como o escravo mais humilde faria, e lavou e enxugou os pés dos Seus discípulos.
Existe uma diferença aqui da unção feita dos Seus pés em Betânia. Os pés falam do caminhar de uma pessoa: Ele era santo, inofensivo, e impoluto, de forma que os Seus pés produziam o doce aroma de nardo (cap.12:3); mas os pés dos discípulos precisavam ser lavados, e o Senhor lavou-os com água (não com sangue, pois o sangue de Jesus Cristo nos lava de todo o pecado, passado, presente e futuro, de uma só vez - Hebreus 10:14).
Ele sabia que a hora em que deveria "passar deste mundo para o Pai” tinha chegado. Mas o Seu ministério continuaria após regressar para o céu, através da instrumentalidade dos Seus discípulos e do Seu povo. Eles continuariam a andar neste mundo de pecado, e até hoje ele ainda lava os pés de todos eles por meio da Sua palavra (capítulo 15:3, Efésios 5:25-26). Pedro não estava pronto para compreender tudo isto, por isto o Senhor lhe disse “o que eu faço, tu não o sabes agora; mas depois o entenderás”, pela experiência, ainda que lentamente.
Pedro imediatamente protestou, em humildade segundo pensava, que não podia permitir ao Senhor lavar os seus pés, mas a sua atitude provou ser irreverente e de falta de confiança. O Senhor respondeu de forma brusca: se Pedro não fosse lavado por Ele, a sua comunhão estaria terminada.
Mediante esta resposta, Pedro impulsivamente declarou o seu desejo de ter plena comunhão: se lavar era um símbolo de comunhão, então queria que não só os pés mas também as suas mãos e a sua cabeça fossem lavados. O Senhor respondeu que quem já se banhou precisa apenas lavar os pés para ficar limpo: entre o banho e a chegada à ceia o hóspede teria apenas sujado os pés, e precisava que fossem lavados tendo removido as sandálias, para ficar completamente limpo outra vez.
Em forma de parábola, o Senhor ensinava que seus pecados haviam sido lavados e que haviam sido regenerados através da Sua fé n’Ele (o banho). Mas ao andar neste mundo, eles se contaminavam e ficavam sujos. Não podiam ter comunhão com Ele nesse estado, e precisavam ser purificados a fim de que fosse restabelecida (Efésios 5:25-27; 1 João 1:6-7). Judas, no entanto, nunca tinha sido regenerado e estava disposto a traí-lo; por isso, disse que nem todos estavam limpos.
Perguntou então se haviam compreendido o significado deste ato, e lembrou-lhes que se dirigiam a Ele como rabino (Mestre, Professor), e Senhor, outro título separado (nunca apenas Jesus!). Ele aprovava o uso de ambos os títulos para Si (também meu Deus - capítulo 20:28), no momento em que lhes prestava esta ação servil, mas simbólica.
Sendo Quem era, continuou, Ele lavava os seus pés e assim lhes dava um exemplo que deviam seguir: deviam fazer este (ou qualquer outro serviço necessário) uns aos outros. É uma lição objetiva de humildade para repreender os seus ciúmes, orgulho, e rixa revelados nesta mesma refeição, e se aplica a todo o relacionamento que os crentes têm entre si. É sempre necessária.
Por exemplo, quando um irmão em Cristo cai em pecado, deve voltar à comunhão por alguém que é espiritual (Gálatas 6:1), não malhando a sua cabeça e fazendo críticas, mas lavando os seus pés: purificando-o com a admoestação da palavra de Deus.
Mas antes de podermos lavar os pés de um irmão, precisamos primeiro que o Senhor da glória lave nossos próprios pés. Devemos chegar a Ele toda vez que estivermos sujos e ser purificados por Ele (Salmo 139:23-24). É a prática contínua desse ato que traz felicidade, não apenas ter conhecimento e fazê-lo de vez em quando.
O Senhor teve muito cuidado em dizer que não estava falando a todos eles. Eles seriam muito felizes se fizessem estas coisas, mas havia um homem entre eles que não as podia fazer: não tinha crido. A fé viva salvadora leva à obediência, e aquele homem não tinha esta fé. Foi escolhido pelo Senhor para ser um dos doze, e a sua próxima traição era conhecida previamente por Ele, mas assim mesmo Judas era responsável e culpado pelo que ia fazer. O Senhor citou Salmo 41:9: "Até o meu próprio amigo íntimo em quem eu tanto confiava, e que comia do meu pão, levantou contra mim o seu calcanhar." A metáfora é a de bater com o calcanhar, ou de dar uma rasteira como fazem os contendores numa luta.
Era uma grosseira violação de hospitalidade comer com alguém e depois voltar-se contra ele desse jeito. Este homem nunca tivera vida espiritual, e era como “volta o cão ao seu vômito, e a porca lavada volta a revolver-se no lamaçal” (2 Pedro 2:22). A água da Palavra nos dá nossa purificação moral no cotidiano de nossa caminhada, mas isto só é possível após estarmos aptos a nos justificar perante Deus com base em nossa fé no sangue de Jesus Cristo.
Os discípulos foram prevenidos para que quando acontecesse não ficassem chocados, e dissessem que era uma pena que o Senhor não o conhecesse melhor. O Senhor Jesus Cristo continua a ser traído pelos seus "amigos" dentro da igreja: o pecado fora da igreja não O fere, na verdade, alguns daqueles pecadores se salvam. O mal surge quando Ele é traído por dentro.
Judas havia sido enviado em missões como os outros discípulos. Pregou e curou. O Senhor portanto declarou: “Quem receber aquele que eu enviar, a mim me recebe; e quem me recebe a mim, recebe aquele que me enviou”. Ninguém é salvo pela fé do mensageiro ou pregador, mas por ouvir a Palava de Deus e receber Cristo. A mensagem não perde sua efetividade devido ao mau caráter do mensageiro.
1 Antes da festa da páscoa, sabendo Jesus que era chegada a sua hora de passar deste mundo para o Pai, e havendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim.
2 Enquanto ceavam, tendo já o Diabo posto no coração de Judas, filho de Simão Iscariotes, que o traísse,
3 Jesus, sabendo que o Pai lhe entregara tudo nas mãos, e que viera de Deus e para Deus voltava,
4 levantou-se da ceia, tirou o manto e, tomando uma toalha, cingiu-se.
5 Depois deitou água na bacia e começou a lavar os pés aos discípulos, e a enxugar-lhos com a toalha com que estava cingido.
6 Chegou, pois, a Simão Pedro, que lhe disse: Senhor, lavas-me os pés a mim?
7 Respondeu-lhe Jesus: O que eu faço, tu não o sabes agora; mas depois o entenderás.
8 Tornou-lhe Pedro: Nunca me lavarás os pés. Replicou-lhe Jesus: Se eu não te lavar, não tens parte comigo.
9 Disse-lhe Simão Pedro: Senhor, não somente os meus pés, mas também as mãos e a cabeça.
10 Respondeu-lhe Jesus: Aquele que se banhou não necessita de lavar senão os pés, pois no mais está todo limpo; e vós estais limpos, mas não todos.
11 Pois ele sabia quem o estava traindo; por isso disse: Nem todos estais limpos.
12 Ora, depois de lhes ter lavado os pés, tomou o manto, tornou a reclinar-se à mesa e perguntou-lhes: Entendeis o que vos tenho feito?
13 Vós me chamais Mestre e Senhor; e dizeis bem, porque eu o sou.
14 Ora, se eu, o Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns aos outros.
15 Porque eu vos dei exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também.
:16 Em verdade, em verdade vos digo: Não é o servo maior do que o seu senhor, nem o enviado maior do que aquele que o enviou.
17 Se sabeis estas coisas, bem-aventurados sois se as praticardes.
18 Não falo de todos vós; eu conheço aqueles que escolhi; mas para que se cumprisse a escritura: O que comia do meu pão, levantou contra mim o seu calcanhar.
19 Desde já no-lo digo, antes que suceda, para que, quando suceder, creiais que eu sou.
20 Em verdade, em verdade vos digo: Quem receber aquele que eu enviar, a mim me recebe; e quem me recebe a mim, recebe aquele que me enviou.
Evangelho de João, capítulo 13 versículos 1 a 20