Mateus modestamente descreve o seu chamado em poucas palavras:
estava ocupado em seu trabalho de recolher impostos: era uma atividade detestada pelos judeus, por causa da suspeita de desonestidade, a opressão, e os principais beneficiados serem os romanos de quem os judeus eram vassalos.
o Senhor o viu e o chamou: sem dúvida teria sido uma tremenda surpresa para Mateus, ser notado pelo grande Mestre entre tanta gente mais bem vista do que ele, e ainda por cima ser convidado para fazer parte do seu grupo de discípulos.
e Mateus prontamente deixou tudo para segui-lo: é improvável que Mateus já não soubesse a respeito deste grande Rabino, quem sabe até já O tivesse ouvido ensinar. Mas o Senhor o conhecia perfeitamente, e por isto o escolheu. Nenhum dos dois impôs condições para começar este relacionamento tão singular. Mateus deixou um trabalho de má fama para se tornar um discípulo do Senhor, e se tornou famoso no mundo inteiro, até hoje, por ser o autor de um dos Evangelhos.
Lucas nos diz que Mateus, chamado Levi em hebraico, deu ao Senhor Jesus um grande banquete, onde estavam muitos cobradores de impostos (decerto colegas de Mateus) e outros que estavam com ele à mesa (Lucas 5:27-29).
Esta deve ser a ocasião aqui relatada; Mateus simplesmente diz que estavam tendo uma refeição em casa, quando os que ele chama de "publicanos e pecadores" vieram para se assentar também com eles. Era um contraste com a santidade do Senhor Jesus.
Os fariseus, que se julgavam superiores porque ostensivamente obedeciam à Lei de Moisés, indagaram dos discípulos do Senhor ali presentes, porque o seu Mestre comia com aquela gente? (Eles decerto nunca desceriam a esse nível).
A atitude dos fariseus é ainda assumida por gente religiosa hoje em dia, mesmo crentes, que não querem se contaminar com as "más companhias". No entanto os pecadores é que precisam do Evangelho, e uma refeição pode ser uma boa oportunidade para dar o nosso testemunho. Temos que nos aproximar deles.
O próprio Senhor Jesus deu-lhes a resposta: assim como os doentes são os que precisam de médico, também são os pecadores que precisam de arrependimento. A doença mais séria que afeta a humanidade é o pecado, e Ele veio trazer a cura.
Ele lhes citou Oséias 6:6: "Porque eu quero misericórdia e não sacrifício" dizendo-lhes que era isso que deviam aprender a praticar.
Deus havia instituído os sacrifícios nos rituais da lei de Moisés, e os fariseus eram zelosos no seu cumprimento. Mas os sacrifícios não substituíam o principal dos mandamentos, que era amar a Deus acima de tudo e ao próximo como a si mesmo.
Os fariseus eram duros de coração, impunham sobre o povo cargas pesadas que eles próprios não carregavam e não tinham compaixão daqueles que precisavam de ajuda espiritual.
O sacrifício próprio sem amor ao próximo de nada vale (1 Coríntios 13:3). Os fariseus eram grandes pecadores, como somos todos (Romanos 3:23). Talvez fossem ainda maiores do que aqueles que estavam à mesa com o Senhor, porque não reconheciam o seu pecado e não procuravam ouvir e obedecer a única Pessoa que podia lhes dar a salvação. Eles só se ajuntavam com outros como eles próprios.
Contrastando com eles, o Senhor Jesus lhes disse "eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores, ao arrependimento". Ele demonstrou compaixão pelos pecadores, ao mesmo tempo que ofereceu-se a Si próprio como sacrifício por eles. Como não há um só justo no mundo, ele se ofereceu pelo mundo inteiro, e a todos chama ao arrependimento. Mas o seu chamado só se torna efetivo quando o pecador se arrepende, assim reconhecendo o seu pecado. Não existe cura para os que já se consideram justos, como os fariseus.
João Batista, cujo ministério tinha por finalidade preparar o povo para a chegada do Messias, tinha discípulos que ainda haviam ficado com ele durante o princípio do ministério do Senhor Jesus.
Eles observavam os discípulos do Messias, alguns dos quais também haviam sido de João, e vieram perguntar porque eles não jejuavam como os de João e os fariseus faziam? Era uma crítica, pois o ritual do jejum representava muito para eles.
Para compreendermos melhor o que se passou naquela ocasião, devemos lembrar que João Batista fora ainda um profeta do Velho Testamento, e ele e os seus discípulos ainda estavam presos à lei de Moisés, com seus preceitos e rituais. Ele apresentara o Messias, e foi Este que deu início a uma nova era, ou dispensação, introduzindo o Novo Testamento entre Deus e a humanidade com a propiciação feita com o Seu sangue.
O curto ministério do Messias aqui na terra foi um intervalo durante o qual Ele anunciou o início do Seu reino e preparou os Seus discípulos para a nova dispensação.
Os "filhos das bodas" mencionados na resposta são uma expressão idiomática da época significando os convidados a um casamento. O jejum entre os judeus era um ato de abnegação devido a tristeza e contrição. Assim como os convidados não podem demonstrar tristeza na presença de um noivo no seu casamento, também não era próprio para os discípulos demonstrarem tristeza enquanto o seu Salvador estivesse junto com eles.
Mas haveria ocasião para jejum quando Ele voltasse para o céu, completada a obra de redenção que viera fazer, quando então estaria fisicamente ausente dos seus discípulos.
Não existe um mandamento para jejuar como havia no Velho Testamento. O jejum é encontrado junto com a oração na igreja primitiva, em ocasiões em que a direção de Deus era pedida para a tomada de grandes decisões. Também, nas versões mais antigas, aparece com a oração em 1 Coríntios 4:5. É um ato de abnegação diante de Deus, aprovado aqui pelo Senhor Jesus.
Em seguida o Senhor usa duas ilustrações para mostrar a mudança da dispensação do Velho Testamento para a do Novo Testamento, e para ensinar que os seus princípios não devem ser misturados:
o remendo de pano novo em veste velha, é como misturar a "lei" e a "graça": quando a veste velha é lavada, o remendo novo vai encolher, e rasgar a veste que já passou pelo processo de encolhimento. Ela vai ficar mais imprestável do que antes. No início da igreja havia grupos de judaizantes na igreja, que queriam manter o judaísmo junto com o Evangelho de Cristo. Foram severamente censurados pelo apóstolo Paulo na epístola aos Gálatas, porque não é possível manter a liberdade do Evangelho preso aos preceitos da lei de Moisés. Surgiu mais tarde o clericalismo (doutrina dos nicolaítas), que se desenvolveu num sacerdócio e rituais que nos lembram o da lei de Moisés, resultando na apostasia e idolatria, que tinham sido as causas da rejeição de Israel por Deus.
a colocação de vinho novo em odres velhos provoca o rompimento dos odres por causa da fermentação do vinho novo, ou suco de uva. Os odres velhos não têm mais elasticidade. A vida e a liberdade do Evangelho arruinam os preceitos e rituais da lei de Moisés.
A utilidade do Velho Testamento, com a lei de Moisés, estava no fim, e o Senhor Jesus não veio para lhe dar continuidade mediante alguns remendos pois estes só podiam piorar a sua situação. O Velho Testamento não podia conter o Evangelho da salvação unicamente mediante a fé na obra redentora de Cristo.
O Senhor Jesus veio para introduzir uma veste totalmente nova, um vinho completamente novo, para substituir de uma só vez o que existia naquela época. O apóstolo João abrevia isso assim "a lei foi dada por Moisés; a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo".
9 E Jesus, passando adiante dali, viu assentado na alfândega um homem chamado Mateus e disse-lhe: Segue-me. E ele, levantando-se, o seguiu.
10 E aconteceu que, estando ele em casa sentado à mesa, chegaram muitos publicanos e pecadores e sentaram-se juntamente com Jesus e seus discípulos.
11 E os fariseus, vendo isso, disseram aos seus discípulos: Por que come o vosso Mestre com os publicanos e pecadores?
12 Jesus, porém, ouvindo, disse-lhes: Não necessitam de médico os sãos, mas sim, os doentes.
13 Ide, porém, e aprendei o que significa: Misericórdia quero e não sacrifício. Porque eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores, ao arrependimento.
14 Então, chegaram ao pé dele os discípulos de João, dizendo: Por que jejuamos nós, e os fariseus, muitas vezes, e os teus discípulos não jejuam?
15 E disse-lhes Jesus: Podem, porventura, andar tristes os filhos das bodas, enquanto o esposo está com eles? Dias, porém, virão em que lhes será tirado o esposo, e então jejuarão.
16 Ninguém deita remendo de pano novo em veste velha, porque semelhante remendo rompe a veste, e faz-se maior a rotura.
17 Nem se deita vinho novo em odres velhos; aliás, rompem-se os odres, e entorna-se o vinho, e os odres estragam-se; mas deita-se vinho novo em odres novos, e assim ambos se conservam.
Mateus capítulo 9 vers. 9-17