O primeiro versículo, "Não julgueis, para que não sejais julgados" é dos mais conhecidos mas nem sempre é interpretado corretamente. O verbo "criticar" se origina do original grego traduzido "julgar" aqui.
O julgamento que não devemos fazer é aquele em que nos colocamos em lugar de juiz para condenarmos, ou falarmos mal a respeito do nosso irmão ou nosso próximo segundo nossa própria avaliação (Tiago 4:11,12). Só Deus pode tomar essa posição. Não temos a autoridade de Deus para esse fim, e só Deus conhece as intenções, de vital importância para se fazer um justo julgamento (1 Coríntios 4:1-5).
Vemos confirmação disto na parábola do joio e do trigo (Mateus 13:28.29 e 38) com respeito aos filhos do maligno, e é também ensinado com respeito aos nossos irmãos na fé (Romanos 14:1-13, Tiago 4:11).
Não se refere ao discernimento que deve ser exercido pelo crente ou pela igreja para se proteger contra os que praticam o mal ou ensinam falsidades, ou para manter disciplina para o bem da igreja. Neste caso, as obras são suficientes para determinar as medidas que devem ser tomadas, pois "por seus frutos os conhecereis" (Mateus 7:15). Não é julgamento no sentido em que o verbo "julgar" é usado aqui.
Quem ousa julgar aos outros, sofreráa conseqüência dessa usurpação de poder, pois também virá a ser julgado pela mesma medida - e achado em falta! Como diz o ditado: "Quem tem telhado de vidro não joga pedra na casa do vizinho". É aplicado o princípio "tudo o que o homem semear, isso também ceifará" pois Deus não se deixa escarnecer (Gálatas 6:7 - e veja Marcos 4:24 e Lucas 6:38).
Lembremos sempre das nossas próprias imperfeições antes de nos colocarmos no lugar de juiz para apontar as faltas dos outros. O Senhor Jesus chama isso de hipocrisia: é preciso primeiro eliminar as nossas próprias faltas e imperfeições antes de julgarmos as dos outros. As nossas, sob esta perspectiva, são maiores e se comparam a uma trave em nosso olho quando só podemos ver um argueiro no olho do nosso irmão.
Existe necessidade de discernimento (que não é julgamento) quando dispomos de coisas preciosas. Há pessoas que não lhe dão o valor que merecem, chegando até a destruí-las e ainda podem se voltar contra nós. São comparadas a cães e porcos.
Essa comparação seria de imediato mais clara aos discípulos do que a nós. Naquele tempo ainda se faziam as ofertas no altar e provavelmente as coisas santas seriam provenientes dos animais santificados, enquanto os cães eram animais impuros, desprezíveis, comedores de carniça: dar-lhes coisas santas seria uma profanação.
Existem indivíduos hoje em dia tão imersos no lixo da imoralidade, ateísmo, superstição, espiritismo e idolatria que falar-lhes sobre as coisas de Deus é uma profanação. Poderão ser discernidos pela maneira em que rejeitam o Evangelho.
Pérolas são objetos preciosos, não só pela sua beleza, mas pela sua raridade. Agora são atéproduzidas industrialmente, mas naquele tempo eram muito mais raras, pois tinham que ser encontradas, ao acaso, dentro de conchas tiradas do fundo do mar. Mas para os porcos elas não têm valor algum. Porcos selvagens vagavam pelo vale do Jordão naquele tempo alimentando-se do lixo e eram perigosos quando se enfureciam, o que fariam se alguém se aproximasse deles e lhes jogasse pérolas que, para eles, são pedras sem valor assemelhando-se às bolotas de que gostavam.
Semelhantemente não devemos desperdiçar aquilo que temos de precioso - nossa fé, nosso tempo, recursos, trabalho, etc., com pessoas ou entidades dedicadas ao lixo espiritual do mundo.
Ao nos depararmos com pessoas tão perversas que tratam as verdades divinas com total desprezo e reagem com violência quando lhes falamos do Evangelho, não temos a obrigação de continuar insistindo com elas. Se o fizermos, apenas estaremos aumentando a condenação que já pesa sobre elas.
Nem sempre é fácil perceber quando uma pessoa pode ser classificada nessa categoria, mas quando em dúvida, temos o recurso de pedir discernimento em oração.
O ensino aqui precisa ser compreendido dentro do seu contexto. Alguns cometem o erro de usar os versículos 7 e 8 para entender que, com insistência, Deus lhes concederá tudo o que pedirem. Mas não é assim.
O Sermão do Monte contém diretrizes muito difíceis de obedecer, e precisamos do poder e sabedoria do alto para atingir o nível de caráter sobrenatural necessário para as colocar em prática. Este é o caráter que o Senhor Jesus deseja ver em nós.
Podemos imaginar a inquietação retratada nos rostos dos discípulos ao ouvirem este sermão. O Senhor Jesus parecia estar querendo o impossível deles. Mas Ele sabia que eles, e também nós, teríamos esse problema, portanto agora nos dá a solução.
Ele nos convida a pedir, buscar e bater à porta, e nos promete que receberemos o que pedirmos, acharemos o que buscarmos e a porta se abrirá para nós. Vejamos, um por um:
Pedir: consiste em pedir ao Pai, em nome do Seu Filho, por meio do que chamamos de oração. A respeito disso temos muito ensino na Bíblia, envolvendo a situação de quem pede, o que pedir, para quem, etc. Por exemplo, o Salmo 66:18 nos ensina que quem ora não pode ter pecado não confessado a Deus, a oração deve ser feita com fé (Tiago 1:6-8), em conformidade com a vontade de Deus (1 João 5:14), com perseverança (Lucas 18:1-8) e sinceridade (Hebreus 10:22a).
Buscar e bater: podem ter um sentido mais amplo, mas concernem principalmente a porta e o caminho que levam à vida eterna (v.14). Tendo logo antes falado daqueles que rejeitam as coisas de Deus, o Evangelho, Ele agora trata daqueles que, ao contrário, procuram o caminho da salvação e batem à porta da entrada para nele entrar. O Senhor Jesus disse em outra ocasião que Ele mesmo é a porta (João 10:9) e o caminho João 14:6) - não há outro - e Ele será alcançado por todo aquele que O busca sinceramente.
Voltando à ação de pedir, desde que as condições sejam cumpridas, temos a garantia que Deus irá ouvir e responder ao nosso pedido. Não é só por causa da Sua promessa, dada através do Seu Filho, mas pela natureza especial do nosso relacionamento com Ele: "a todos quantos o receberam deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus: aos que crêem no seu nome".
Um pai normal deseja o bem-estar do seu filho, e quando o filho lhe pede algo de que precisa, o pai lhe concederá aquilo, não outra coisa que lhe fará mal ou que lhe seja inútil. Se um pai humano sabe satisfazer assim ao pedido do filho, quanto mais nosso pai divino, o supremo Ser Criador que nos ama ao ponto de ter dado o Seu Filho para morrer por nós no Calvário.
O versículo 12 começa com a conjunção "portanto": o seu conteúdo está ligado ao fato que o Pai nos concederá tudo o que lhe pedirmos. Por este motivo, também devemos ser generosos para com os outros e fazer-lhes tudo o que desejamos que eles nos façam "porque esta é a lei e os profetas", ou seja, é a essência do que Deus deseja de nós. Isso é "cumprir a justiça da lei" andar "no Espírito" (Romanos 8:4), e é bem diferente de andar "na carne". Se fosse cumprido por todo o mundo, este seria um mundo imensamente melhor. Cristianismo não consiste somente na abstenção do mal, mas também envolve fazer o bem.
Há uma única porta para o Reino dos céus, e para entrar é necessário arrependimento e reconhecimento do pecado, que é a confissão, a aceitação da obra redentora de Cristo, e a submissão a Ele como Senhor. Muitos desejam salvar-se e participar dos privilégios dos santos, mas recusam submeter-se a essas condições. Sem isso eles nunca poderão entrar. Ele também é o único Caminho (João 14:6).
O caminho que leva à perdição é largo e de entrada fácil: todos começamos a nossa vida já entrando por ele, e é largo pois as margens, que consistem em nossa consciência e os costumes do mundo, estão bem distantes. É fácil caminhar por ele, dando liberdade ao egoísmo e satisfazendo nossos prazeres, mas leva à perdição eterna, longe de Deus e ao castigo pelo pecado.
1 Não julgueis, para que não sejais julgados,
2 porque com o juízo com que julgardes sereis julgados, e com a medida com que tiverdes medido vos hão de medir a vós.
3 E por que reparas tu no argueiro que está no olho do teu irmão e não vês a trave que está no teu olho?
4 Ou como dirás a teu irmão: Deixa-me tirar o argueiro do teu olho, estando uma trave no teu?
5 Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho e, então, cuidarás em tirar o argueiro do olho do teu irmão.
6 Não deis aos cães as coisas santas, nem deiteis aos porcos as vossas pérolas; para que não as pisem e, voltando-se, vos despedacem.
7 Pedi, e dar-se-vos-á; buscai e encontrareis; batei, e abrir-se-vos-á.
8 Porque aquele que pede recebe; e o que busca encontra; e, ao que bate, se abre.
9 E qual dentre vós é o homem que, pedindo-lhe pão o seu filho, lhe dará uma pedra?
10 E, pedindo-lhe peixe, lhe dará uma serpente?
11 Se, vós, pois, sendo maus, sabeis dar boas coisas aos vossos filhos, quanto mais vosso Pai, que está nos céus, dará bens aos que lhe pedirem?
12 Portanto, tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós, porque esta é a lei e os profetas.
13 Entrai pela porta estreita, porque larga é a porta, e espaçoso, o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela;
14 E porque estreita é a porta, e apertado, o caminho que leva à vida, e poucos há que a encontrem.
Mateus capítulo 7 vers. 1- 14