O Senhor Jesus tinha despachado as multidões na noite anterior (Marcos 6:45; Mateus 14:22), mas evidentemente alguns não foram muito longe, enquanto esperavam que o Senhor Jesus descesse do monte.
De manhã notaram o seguinte:
Não tinha havido nenhum outro barco lá a não ser aquele em que se foram os discípulos.
O Senhor não tinha entrado com eles.
Os discípulos tinham ido embora a sós.
Outros barcos pequenos vieram de perto do lugar onde comeram pão, depois que o Senhor deu graças. Esta é a segunda vez que o título Senhor é dado a Jesus neste evangelho (capítulo 4: 1). O nome comum “Jesus” era o Seu nome material (capítulo 1: 14, Mateus 1:2 1), e quase sempre é respeitosamente precedido ou seguido por Senhor e Cristo nas Epístolas.
Todavia, o Senhor Jesus não estava lá.
Ainda sem entender como Ele tinha atravessado o mar, mas presumindo que tinha ido, entraram nos pequenos barcos, e se dirigiram a Cafarnaum, onde O procuraram. Tinham dois motivos, além da curiosidade de saber quando Ele chegara ali (versículo 25): eles evidentemente não desistiram do impulso da noite anterior para fazer Jesus seu rei (versículo 15) e tinham esperança que lhes desse ainda outra boa refeição (versículo 26).
Eles O acharam depois de uma procura, provavelmente na sinagoga (versículo 59) de Cafarnaum, talvez a mesma que fora construída por um centurião (Lucas 7:5). Chamando-O respeitosamente de “Rabino”, perguntaram quando Ele tinha chegado lá, mostrando a sua surpresa.
O Senhor, como fazia freqüentemente, em vez de lhes dar uma resposta direta para esta pergunta, foi adiante e mostrou-lhes que sabia o que estava em suas mentes e a razão por que eles tinham vindo atrás d’Ele. Eles tinham visto os sinais que Ele fez (versículo 2), mas se preocupavam mais com estômagos famintos do que com almas famintas. Era uma repreensão severa e merecida.
Em seguida usou comida (pães e peixes) como uma metáfora para o alimento espiritual que o Filho do Homem (Ele) lhes daria, dependendo da sua atitude para com o Filho do homem (versículo 51). Ao contrário do alimento que perece (eles já tinham fome outra vez), o Seu alimento espiritual dura pela vida eterna: eles portanto deveriam se esforçar para conseguir este segundo tipo de alimento.
A Sua autoridade era o selo de Deus sobre Ele; não especificou quando, mas como homem teria sido na hora do Seu batismo, quando o Pai falou confirmando a Sua identidade e o Espírito Santo desceu sobre Ele (Lucas 3:22).
Percebendo o significado espiritual das palavras d’Ele, apesar da atitude arrogante que tomavam, eles podem ter sido vagamente sinceros ao fazerem a sua segunda pergunta, que é melhor interpretada assim: “o que temos que fazer (como um hábito), para poder continuar a fazer as obras de Deus?” Estavam pensando nas várias ações do tipo farisaico e regras que pensavam que Deus queria deles.
O Senhor imediatamente lhes deu uma resposta direta, esclarecendo bem as coisas: a obra de Deus é crer (continuadamente) n’Aquele que Ele enviou (veja 1 Tessalonicenses 1:3). É a obra de Deus e não as obras do homem que lhe dá a vida eterna.
Como se o sinal do dia anterior fosse sem valor, eles pediram um sinal que poderiam ver e crer n’Ele. Era difícil ter paciência com esta turba superficial e quase irônica (Jesus já tinha insinuado que eles não entenderam os Seus sinais - versículo 26).
Ao lhe perguntar “que operas tu?” e mencionarem o maná dado aos seus pais, eles fizeram um desafio, não só depreciando o milagre que tinham testemunhado no dia anterior, mas estabelecendo um padrão: os rabinos citavam o Salmo 72:16 para provar que o Messias, quando viesse, excederia o maná que Moisés lhes dera do céu. Seu argumento era que Moisés lhes dera maná do céu. Jesus poderia ultrapassar aquela ação de Moses?
Primeiro, o Senhor negou asperamente que Moisés fosse o doador do pão de céu (o maná). Moisés não era superior a Cristo nesse ponto. O doador era “meu Pai” (não “nosso Pai”), repetindo a afirmação que causou tanta raiva em Jerusalém (capítulo 5:17). Ele ainda estava lhes dando alimento, pois o pão de cada dia é do Senhor (Mateus 6:11) mas, muito mais importante, Ele estava lhes dando agora o verdadeiro Pão do Céu (do qual o maná era somente uma figura). É interessante notar que as palavras “desce do céu”, “desci do céu”, “desceu do céu”, são usadas sete vezes neste discurso (versículos 33, 38, 41, 42, 50, 51 58).
Enquanto o maná se limitou à nutrição física dos israelitas por apenas um tempo no deserto, o pão de Deus é uma pessoa que desce do céu e dá vida para o mundo. Esta foi a declaração mais espantosa para a multidão e obviamente não a compreenderam. Agora chamando-O de Senhor em vez de Rabino (versículo 25), embora não esteja claro o que significava isto, eles Lhe pediram que lhes desse um suprimento perpétuo desse pão, como a mulher do poço queria que lhe desse água (capítulo 4:15).
O Senhor respondeu declarando a Sua origem, Sua missão e a vontade do Pai:
Ele era Quem desceu do céu, o pão da vida. Isto assustava muito a multidão. Nos outros Evangelhos (Mateus 26:26; Marcos 14:22; Lucas 22:19) o Senhor usa o pão como o símbolo do corpo dele na Ceia do Senhor, mas aqui Ele se oferece em lugar dos pães e peixes que eles tinham vindo buscar (capítulo 6:24, 26). Ele é o pão da vida em dois sentidos: tem vida em si mesmo, o pão vivo (capítulo 6:51), e dá vida a outros como a água da vida, e a árvore da vida.
Ele desceu de Céu para fazer a vontade do Pai (capítulo 4:34; 5:30), e esta era que Ele deveria dar Sua vida para o mundo, para que quem vem a Ele nunca tenha fome, e depois de crer n’Ele - a relação contínua de fé depois de vir - nunca tenha sede.. Esta multidão viu mas não creu; Ele porém recebe todos os que o Pai lhe manda ou dá (capítulo 10:29; 17:2, 6, 9, 12, 24; 18:9). O termo predestinação só aplica aos salvos e significa exatamente o que Ele disse aqui: quando uma pessoa aceita Cristo, ele é justificado; e tão seguramente como ele está justificado, ele será glorificado. Quando o Senhor começa com cem ovelhas, Ele vai permanecer com cem ovelhas sem perder uma. Todo o que crê e recebe Cristo tem vida eterna e será ressuscitado ao último dia. O Pai dá homens a Cristo, mas os homens têm que vir. E os que vêm são os que o Pai lhe dá.
A vontade do Pai é que Cristo não venha a perder nada do lhe é dado, mas que todos ressuscitem no último dia (capítulo 11:24; 12:48). Cristo é o Agente da ressurreição geral (capítulo 5:28, 1 Coríntios 15:22), mas aqui é só mencionada a ressurreição do justo. A vontade do Pai é que todo aquele que vê o Filho com os olhos da fé (capítulo 12:45) e crê n’Ele possa adquirir e continuar tendo vida eterna (capítulo 3:15, 36) assim Cristo promete ressuscitá-lo no último dia. Em resumo, todo aquele que crê e recebe Cristo tem vida eterna e será resssuscitado no último dia.
22 No dia seguinte, a multidão que ficara no outro lado do mar, sabendo que não houvera ali senão um barquinho, e que Jesus não embarcara nele com seus discípulos, mas que estes tinham ido sós
23 (contudo, outros barquinhos haviam chegado a Tiberíades para perto do lugar onde comeram o pão, havendo o Senhor dado graças);
24 quando, pois, viram que Jesus não estava ali nem os seus discípulos, entraram eles também nos barcos, e foram a Cafarnaum, em busca de Jesus.
25 E, achando-o no outro lado do mar, perguntaram-lhe: Rabi, quando chegaste aqui?
26 Respondeu-lhes Jesus: Em verdade, em verdade vos digo que me buscais, não porque vistes sinais, mas porque comestes do pão e vos saciastes.
27 Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela comida que permanece para a vida eterna, a qual o Filho do homem vos dará; pois neste, Deus, o Pai, imprimiu o seu selo.
28 Pergutaram-lhe, pois: Que havemos de fazer para praticarmos as obras de Deus?
29 Jesus lhes respondeu: A obra de Deus é esta: Que creiais naquele que ele enviou.
30 Perguntaram-lhe, então: Que sinal, pois, fazes tu, para que o vejamos e te creiamos? Que operas tu?
31 Nossos pais comeram o maná no deserto, como está escrito: Do céu deu-lhes pão a comer.
32 Respondeu-lhes Jesus: Em verdade, em verdade vos digo: Não foi Moisés que vos deu o pão do céu; mas meu Pai vos dá o verdadeiro pão do céu.
33 Porque o pão de Deus é aquele que desce do céu e dá vida ao mundo.
34 Disseram-lhe, pois: Senhor, dá-nos sempre desse pão.
35 Declarou-lhes Jesus. Eu sou o pão da vida; aquele que vem a mim, de modo algum terá fome, e quem crê em mim jamais tará sede.
36 Mas como já vos disse, vós me tendes visto, e contudo não credes.
37 Todo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora.
38 Porque eu desci do céu, não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou.
39 E a vontade do que me enviou é esta: Que eu não perca nenhum de todos aqueles que me deu, mas que eu o ressuscite no último dia.
40 Porquanto esta é a vontade de meu Pai: Que todo aquele que vê o Filho e crê nele, tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia.
Evangelho de João, capítulo 6, versículos 22 a 40