Em Trôade, Deus deu uma visão a Paulo durante a noite, em que um homem da Macedônia lhe suplicou que passasse até lá para ajudá-los. Depois de duas negativas anteriores, Deus assim revelou a Paulo o caminho a seguir no seu apostolado. Macedônia (atual Grécia) estava na Europa, e seria o ponto inicial da evangelização desse continente.
Paulo tinha consigo Silas e Timóteo, e agora o autor deste livro usa a primeira pessoa do plural a partir do versículo 10, indicando que ele, Lucas, se juntara a eles.
É possível que Lucas, um médico gentio, tenha se convertido com a pregação de Paulo em Trôade. Com notável humildade, revela pouco sobre si mesmo. Depois de ir com Paulo e os outros até Filipos, ele só aparece outra vez quando Paulo visitou novamente essa cidade em sua terceira viagem missionária (capítulo 20:5,6), possivelmente tendo ficado em Filipos nesse intervalo de sete ou oito anos.
Os quatro logo procuraram e embarcaram num navio que ia para Filipos, cidade antiga que fora fortificada por Filipe da Macedônia e recebeu seu nome. Ela era agora uma colônia romana, capital da província da Macedônia, governada por uma junta de militares nomeados e submissos diretamente a Roma, e regida pelas suas leis. Ali ficaram por vários dias.
Era uma cidade fortificada, e provavelmente não havia sinagoga dentro dela onde Paulo e seus companheiros pudessem comparecer para iniciar a sua evangelização, como costumavam fazer. Saíram então da cidade para a beira do rio, onde julgavam que achariam um lugar de oração dos judeus, pois era comum aos judeus se reunirem assim na falta de uma sinagoga.
Realmente encontraram um grupo, mas só de mulheres. Não obstante, eles se assentaram, posição usual para se pregar em público, e falaram com elas. Todos participaram e imediatamente houve conversões, entre elas a de Lídia e “a sua casa”, que provavelmente eram as suas criadas. Aproveitando as águas do rio, foram batizadas ali mesmo.
Tiatira era cidade famosa na antiguidade pela produção de púrpura, uma tinta obtida de moluscos e usada nas vestes imperiais, e em tecidos muito caros procurados pelos nobres e pessoas abastadas.
Lídia era vendedora desses tecidos. Era provavelmente gentia, mas temia a Deus, indicando que havia se convertido ao judaísmo. Tinha uma casa em Filipos, e logo após o batismo constrangeu Paulo e seus companheiros a se hospedaram nela, dizendo “Se haveis julgado que eu sou fiel ao Senhor, entrai em minha casa, e ficai ali”.
O “lugar de oração” tornou-se em ponto de pregação. Mas, ao irem para lá, nossos evangelistas começaram a ser perturbados por uma jovem escrava possessa por um demônio, “espírito adivinhador” [como Simão o Mago de Samaria (cap. 8) e Elimas Bar-Jesus de Chipre (cap. 13)], que clamava que eles eram servos do Deus Altíssimo que anunciavam “um caminho da salvação” (como se houvesse outros).
Depois da repetição dessa cena por muitos dias, Paulo perturbou-se e ordenou ao espírito, em nome de Jesus Cristo, que saísse dela. O espírito saiu imediatamente.
Os senhores, proprietários desta jovem que lhes trazia grande renda por causa das suas adivinhações, se sentiram altamente prejudicados com a ação de Paulo, e usaram sua influência para prender Paulo e Silas e arrastá-los para uma praça e denunciá-los aos magistrados da cidade.
É um exemplo das duas principais maneiras que o inimigo usa para abafar o Evangelho: primeiro com falso testemunho, o espírito que proclama uma meia-verdade; em seguida a perseguição do mundo para silenciar os mensageiros.
Em sua acusação contra eles, esconderam o verdadeiro motivo da sua ação, mas fingindo patriotismo denunciaram Paulo e Silas como judeus que estavam perturbando a ordem na cidade, ao pregar costumes ilegais para os romanos. Note-se a ênfase na nacionalidade.
“Esses homens judeus” era uma expressão desdenhosa, pois recentemente um decreto de Cláudio havia expulso os judeus de Roma (cap. 18:2), suscitando um preconceito racial contra eles em suas colônias: para se mostrarem leais, os colonos passaram a desprezar os judeus.
Os romanos toleravam os costumes religiosos nos países conquistados, desde que não procurassem mudar os dos romanos, que eram idólatras e adoravam o próprio imperador além de muitos outros deuses. Perturbar a ordem pregando nova religião aos cidadãos romanos era crime.
A multidão presente ajuntou-se toda, portanto, contra Paulo e Silas. Os magistrados lhes rasgaram os vestidos, mandaram que fossem açoitados e em seguida os lançaram na prisão mandando ao carcereiro que os guardasse com segurança.
O carcereiro prendeu-os pelos pés no tronco do cárcere interior, que naquele tempo seria uma masmorra onde o ar e a luz só entravam quando a porta estava aberta, no fundo da prisão.
Longe de se lamentarem, Paulo e Silas oravam e cantavam hinos a Deus ali dentro, enquanto os outros presos ouviam com prazer. Ao redor da meia noite ouve um grande terremoto, que fez com que os alicerces da prisão fossem abalados, as portas se abriram e as correntes de todos se soltaram. As portas estariam trancadas com barras que seriam soltas com o movimento, e as correntes presas à parede, que teria rachado.
O carcereiro havia dormido, mas acordou com o terremoto e viu que as portas da prisão estavam abertas. Supôs então que os presos tivessem fugido, e desembainhou a espada para se suicidar, sem coragem para enfrentar a condenação a uma morte cruel à qual estava agora exposto.
Paulo podia ver o carcereiro de onde estava, e percebendo o que ele intencionava fazer, gritou bem forte para ele que não se fizesse nenhum mal porque todos estavam ali. Tendo confirmado o que Paulo havia exclamado, o carcereiro se convenceu que algo extraordinário havia acontecido, sentiu o peso dos seus pecados e temeu a justiça de Deus, não mais a dos homens. Sem dúvida ele já ouvira falar de Paulo e Silas e da sua mensagem, e recorreu a eles com a pergunta: “Senhores, que me é necessário fazer para me salvar?” Ele se referia à salvação da sua alma.
Todo o pecador precisa estar convencido do seu pecado, e temer a justiça de Deus antes da sua conversão. Precisa saber que está perdido antes de ser salvo. Não adianta lhe mostrar como se salvar antes dele se convencer que merece ir para o inferno.
A resposta que Paulo e Silas lhe deram foi muito simples: “Crê no Senhor Jesus e serás salvo, tu e tua casa”. Isto é o que Pedro disse a Cornélio (cap. 10), ou seja, ele seria salvo mediante a fé no Senhor Jesus, e da mesma forma os da sua casa (é errado entender que os da sua casa seriam salvos automaticamente pela fé dele).
Depois que ouviram a palavra de Deus explicada por Paulo e Silas, todos creram, e o carcereiro manifestou a realidade da sua conversão ao tratar das suas feridas. Logo em seguida, foram todos batizados. Não existe base para pensar que houvesse crianças pequenas entre eles, todos tinham idade suficiente para crer em Cristo para a sua salvação.
O batismo provavelmente foi feito dentro de um tanque existente dentro ou próximo do cárcere, onde podiam ser imergidos. Terminado o batismo, todos subiram para a casa do carcereiro, que lhes preparou uma refeição e se alegrou muito, com toda a sua casa, por ter crido em Deus.
Quando amanheceu, os magistrados mandaram os seus oficiais até a prisão com a ordem para soltar Paulo e Silas. O carcereiro comunicou a Paulo a ordem que havia recebido, e disse aos dois que saíssem e fossem em paz.
Decerto para a surpresa de todos, Paulo revelou que tanto ele quanto Silas eram cidadãos romanos, e que, sem serem condenados por julgamento dum tribunal competente, foram ultrajados e lançados na prisão pelos magistrados. Não era cabível que fossem agora livrados às escondidas. Os próprios magistrados teriam que vir até a prisão para tirá-los.
Quando os magistrados ouviram que eram cidadãos romanos, eles temeram as consequências que poderiam sofrer por esse ato ilegal que haviam cometido, e foram até a prisão pedir desculpas. Depois de tirá-los de lá, os magistrados rogaram a Paulo e Silas que se retirassem da cidade (pois estavam com medo de alguma vingança).
Paulo e Silas foram ver os irmãos em casa de Lídia e os confortaram, depois partiram. Timóteo e Lucas ficaram, e Timóteo aparece mais tarde em Beréia (cap. 17:15).
9 De noite apareceu a Paulo esta visão: estava ali em pé um homem da Macedônia, que lhe rogava: Passa à Macedônia e ajuda-nos.
10 E quando ele teve esta visão, procurávamos logo partir para a Macedônia, concluindo que Deus nos havia chamado para lhes anunciarmos o evangelho.
11 Navegando, pois, de Trôade, fomos em direitura a Samotrácia, e no dia seguinte a Neápolis;
12 e dali para Filipos, que é a primeira cidade desse distrito da Macedônia, e colônia romana; e estivemos alguns dias nessa cidade.
13 No sábado saímos portas afora para a beira do rio, onde julgávamos haver um lugar de oração e, sentados, falávamos às mulheres ali reunidas.
14 E certa mulher chamada Lídia, vendedora de púrpura, da cidade de Tiatira, e que temia a Deus, nos escutava e o Senhor lhe abriu o coração para atender às coisas que Paulo dizia.
15 Depois que foi batizada, ela e a sua casa, rogou-nos, dizendo: Se haveis julgado que eu sou fiel ao Senhor, entrai em minha casa, e ficai ali. E nos constrangeu a isso.
16 Ora, aconteceu que quando íamos ao lugar de oração, nos veio ao encontro uma jovem que tinha um espírito adivinhador, e que, adivinhando, dava grande lucro a seus senhores.
17 Ela, seguindo a Paulo e a nós, clamava, dizendo: São servos do Deus Altíssimo estes homens que vos anunciam um caminho de salvação.
18 E fazia isto por muitos dias. Mas Paulo, perturbado, voltou-se e disse ao espírito: Eu te ordeno em nome de Jesus Cristo que saias dela. E na mesma hora saiu.
19 Ora, vendo seus senhores que a esperança do seu lucro havia desaparecido, prenderam a Paulo e Silas, e os arrastaram para uma praça à presença dos magistrados.
20 E, apresentando-os aos magistrados, disseram: Estes homens, sendo judeus, estão perturbando muito a nossa cidade.
21 e pregam costumes que não nos é lícito receber nem praticar, sendo nós romanos.
22 A multidão levantou-se à uma contra eles, e os magistrados, rasgando-lhes os vestidos, mandaram açoitá-los com varas.
23 E, havendo-lhes dado muitos açoites, os lançaram na prisão, mandando ao carcereiro que os guardasse com segurança.
24 Ele, tendo recebido tal ordem, os lançou na prisão interior e lhes segurou os pés no tronco.
25 Pela meia-noite Paulo e Silas oravam e cantavam hinos a Deus, enquanto os presos os escutavam.
26 De repente houve um tão grande terremoto que foram abalados os alicerces do cárcere, e logo se abriram todas as portas e foram soltos os grilhões de todos.
27 Ora, o carcereiro, tendo acordado e vendo abertas as portas da prisão, tirou a espada e ia suicidar-se, supondo que os presos tivessem fugido.
28 Mas Paulo bradou em alta voz, dizendo: Não te faças nenhum mal, porque todos aqui estamos.
:29 Tendo ele pedido luz, saltou dentro e, todo trêmulo, se prostrou ante Paulo e Silas
30 e, tirando-os para fora, disse: Senhores, que me é necessário fazer para me salvar?
31 Responderam eles: Crê no Senhor Jesus e serás salvo, tu e tua casa.
32 Então lhe pregaram a palavra de Deus, e a todos os que estavam em sua casa.
33 Tomando-os ele consigo naquela mesma hora da noite, lavou-lhes as feridas; e logo foi batizado, ele e todos os seus.
34 Então os fez subir para sua casa, pôs-lhes a mesa e alegrou-se muito com toda a sua casa, por ter crido em Deus.
35 Quando amanheceu, os magistrados mandaram quadrilheiros a dizer: Soltai aqueles homens.
36 E o carcereiro transmitiu a Paulo estas palavras, dizendo: Os magistrados mandaram que fosseis soltos; agora, pois, saí e ide em paz.
37 Mas Paulo respondeu-lhes: Açoitaram-nos publicamente sem sermos condenados, sendo cidadãos romanos, e nos lançaram na prisão, e agora encobertamente nos lançam fora? De modo nenhum será assim; mas venham eles mesmos e nos tirem.
38 E os quadrilheiros foram dizer aos magistrados estas palavras, e estes temeram quando ouviram que eles eram romanos;
39 vieram, pediram-lhes desculpas e, tirando-os para fora, rogavam que se retirassem da cidade.
40 Então eles saíram da prisão, entraram em casa de Lídia, e, vendo os irmãos, os confortaram, e partiram.
Atos, capítulo 16, vers. 9 a 40