O governador Félix adiou a causa de Paulo e o deteve por dois anos. Segundo os historiadores, durante este intervalo os judeus se levantaram em armas contra os gentios na praça do mercado de Cesareia. Félix mandou os soldados combaterem contra os desordeiros, resultando na morte de muitos destes. Os judeus fizeram uma queixa formal junto ao imperador, e este chamou Félix a Roma, e enviou Pórcio Festo para substituí-lo em outono de 60 d.C.
Sabe-se muito pouco sobre Festo. Ele é geralmente considerado um homem mais digno que Félix, e teve mais sucesso em livrar o país dos pilhadores e sicários que atormentavam o povo. No entanto, Paulo não recebeu melhor tratamento em suas mãos, e demonstrou a mesma falta de sinceridade e desejo de agradar os judeus que o seu antecessor. Morreu dois anos depois de assumir o cargo.
Três dias depois de chegar a Cesareia, Festo subiu até Jerusalém e numa audiência que teve com os principais sacerdotes e judeus mais eminentes, estes se queixaram contra Paulo e lhe rogaram que o enviasse até eles para que tratassem eles próprios do seu caso. Apesar do tempo decorrido, não tinham se esquecido dele e com ódio mortal tramavam ciladas para o matarem no caminho.
Festo não atendeu ao seu pedido, mas permitiu que as autoridades entre eles descessem até Cesareia com ele na sua volta, quando então ouviria as suas acusações formalmente no tribunal, na presença de Paulo, para que este tivesse a oportunidade de se defender segundo as leis romanas.
Chegados em Cesareia pouco mais que uma semana depois, logo no dia seguinte Festo sentou-se como juiz no tribunal, mandou trazer Paulo e passou a ouvir as graves acusações dos judeus. Embora fossem muitas, não puderam provar nenhuma delas.
Tomando a palavra em sua própria defesa, diante da óbvia invalidade jurídica das acusações, em poucas palavras Paulo se contentou em simplesmente negar ter praticado qualquer crime contra a lei dos judeus, do templo, ou de César.
Vendo que não tinha base para condenar Paulo, mas que seria politicamente prejudicial para si absolvê-lo, Festo propôs a Paulo continuar o julgamento em Jerusalém. Era o que os judeus haviam pedido inicialmente, com a diferença que Festo agora iria também para presidir o julgamento. Festo teve que obter a permissão de Paulo por causa da sua cidadania romana, mas decerto esperava que concordasse já que Festo continuaria sendo o juiz.
Mas, se Festo não estava inclinado a lhe fazer justiça em Cesareia, onde normalmente julgava, havia ainda menos probabilidade que a daria em Jerusalém, num ambiente de grande hostilidade a Paulo. Apenas dois anos antes os desordeiros, o sinédrio, e quarenta conspiradores haviam procurado assassiná-lo. Embora sua linguagem parecesse plausível, Festo não tinha mais coragem de fazer justiça do que o seu antecessor.
Paulo percebeu que Festo não queria cumprir o seu dever de agir de maneira justa, preferindo permitir que os judeus tivessem a sua vingança para ganhar a simpatia deles. Assim sendo, ele protestou que estava diante de um tribunal romano (“de César“), onde devia ser julgado: Festo, como juiz, tinha agora verificado que Paulo nenhum mal havia feito contra os judeus; se ele, ao contrário, fosse malfeitor e tivesse feito alguma coisa digna de morte, ele não se recusava a morrer; mas se nada puderam provar das suas acusações, ninguém podia entregá-lo a eles (nem Festo), portanto apelava para o tribunal superior de César (que era seu direito, como cidadão romano).
Temos aqui um interessante paralelo com o julgamento do Senhor Jesus: Ele também passou por um julgamento pelo tribunal romano (Pilatos), depois de declarado culpado de blasfêmia pelo sinédrio (por declarar a Sua verdadeira identidade como Filho de Deus – Lucas 22:70). Pilatos procurou se esquivar mandando-O para Herodes, mas este simplesmente O retornou para Pilatos sem assumir responsabilidade pelo julgamento.
Em seu julgamento, Pilatos declarou que Jesus era inocente de qualquer culpa daquilo que era acusado, mas para agradar os judeus, lavou as suas mãos simbolicamente como que para isentar-se da responsabilidade que tinha, e entregou-O aos judeus, que assumiram a responsabilidade pela Sua morte.
Embora fosse Ele próprio a suprema Autoridade, o Senhor não tinha cidadania romana como Paulo, e não tinha a opção de apelar para César se quisesse. Mas o Senhor deu a Sua vida voluntariamente, sendo essa a Sua missão. Paulo tinha que usar os meios legítimos à sua disposição para conservar a sua vida, pois ainda não havia cumprido toda a sua missão.
Era uma repreensão a Festo pela sua vacilação em cumprir o seu dever, e ele recorreu aos seus assessores jurídicos para ver qual seria a melhor saída para manter a sua dignidade ferida. Finalmente teve que aceitar os direitos de Paulo, e então lhe disse (em tom de desafio?): “Apelaste para César? Para César irás!”
Dias depois, vieram o rei Herodes Agripa II e sua irmã Berenice para saudar Festo pela sua nomeação ao cargo de governador. Esse rei era filho do Herodes Agripa I que havia assassinado Tiago e prendido Pedro no início da igreja em Jerusalém (capítulo 12:1-4).
Agripa II não era rei da Judeia, mas recebeu do César Cláudio o governo do templo de Jerusalém, que incluía o direito de nomear o sumo sacerdote. Atraiu para si a ira dos judeus por construir o seu palácio em local de onde tinha uma vista panorâmica do templo, e pelas frequentes mudanças no sumo sacerdócio. Segundo os historiadores, Berenice era de invulgar beleza mas de má reputação.
Durante a sua longa estadia, Festo lhes contou o caso de Paulo, à sua moda, e declarou que os judeus “não apresentaram acusação alguma das coisas perversas que eu suspeitava, mas tinham contra ele algumas questões acerca da sua religião e de um tal Jesus defunto, que Paulo afirmava estar vivo”. Isto despertou a curiosidade de Agripa, que se interessou em ouvi-lo pessoalmente, o que não é de surpreender dada a sua autoridade sobre o sacerdócio e o templo.
Festo se prontificou a apresentar Paulo no dia seguinte, decerto com a esperança que o rei pudesse dar uma solução breve para o problema que Paulo representava.
Não foi uma simples audiência particular: Festo aproveitou a ocasião para honrar Agripa e Berenice com um grande cerimonial aparatoso, para o qual reuniu no auditório os chefes militares e os homens mais importantes de Cesareia.
Chegando Paulo, Festo fez um pequeno discurso de apresentação, dirigido ao rei e a todas as personagens presentes, apresentando-o como “o homem por causa de quem toda a multidão dos judeus, tanto em Jerusalém como em Cesareia, recorreram a ele, Festo, clamando que ele não vivesse mais”.
Depois deste exagero, confessou que não achava que Paulo houvesse praticado coisa alguma digna de morte, mas como havia apelado para o imperador, resolveu assim fazer. Deixou a impressão no auditório que havia sido justo e clemente para com este homem.
Também declarou que estava diante de um dilema: não sabia o que escrever ao imperador, porque não podia acusar Paulo de algum crime digno de morte, e não seria razoável enviá-lo sem estar acompanhado das acusações. Esperava portanto que deste interrogatório surgisse alguma coisa que pudesse escrever!
1 Tendo, pois, entrado Festo na província, depois de três dias subiu de Cesaréia a Jerusalém.
2 E os principais sacerdotes e os mais eminentes judeus fizeram-lhe queixa contra Paulo e, em detrimento deste,
3 lhe rogavam o favor de o mandar a Jerusalém, armando ciladas para o matarem no caminho.
4 Mas Festo respondeu que Paulo estava detido em Cesaréia, e que ele mesmo brevemente partiria para lá.
5 Portanto - disse ele - as autoridades dentre vós desçam comigo e, se há nesse homem algum crime, acusem-no.
6 Tendo-se demorado entre eles não mais de oito ou dez dias, desceu a Cesaréia; e no dia seguinte, sentando-se no tribunal, mandou trazer Paulo.
7 Tendo ele comparecido, rodearam-no os judeus que haviam descido de Jerusalém, trazendo contra ele muitas e graves acusações, que não podiam provar.
8 Paulo, porém, respondeu em sua defesa: Nem contra a lei dos judeus, nem contra o templo, nem contra César, tenho pecado em coisa alguma.
9 Todavia Festo, querendo agradar aos judeus, respondendo a Paulo, disse: Queres subir a Jerusalém e ali ser julgado perante mim acerca destas coisas?
10 Mas Paulo disse: Estou perante o tribunal de César, onde devo ser julgado; nenhum mal fiz aos judeus, como muito bem sabes.
11 Se, pois, sou malfeitor e tenho cometido alguma coisa digna de morte, não recuso morrer; mas se nada há daquilo de que estes me acusam, ninguém me pode entregar a eles; apelo para César.
12 Então Festo, tendo falado com o conselho, respondeu: Apelaste para César; para César irás.
Act 25:13 Passados alguns dias, o rei Agripa e Berenice vieram a Cesaréia em visita de saudação a Festo.
Act 25:14 E, como se demorassem ali muitos dias, Festo expôs ao rei o caso de Paulo, dizendo: Há aqui certo homem que foi deixado preso por Félix,
Act 25:15 a respeito do qual, quando estive em Jerusalém, os principais sacerdotes e os anciãos dos judeus me fizeram queixas, pedindo sentença contra ele;
Act 25:16 aos quais respondi que não é costume dos romanos condenar homem algum sem que o acusado tenha presentes os seus acusadores e possa defender-se da acusação.
Act 25:17 Quando então eles se haviam reunido aqui, sem me demorar, no dia seguinte sentei-me no tribunal e mandei trazer o homem;
Act 25:18 contra o qual os acusadores, levantando-se, não apresentaram acusação alguma das coisas perversas que eu suspeitava;
Act 25:19 tinham, porém, contra ele algumas questões acerca da sua religião e de um tal Jesus defunto, que Paulo afirmava estar vivo.
Act 25:20 E, estando eu perplexo quanto ao modo de investigar estas coisas, perguntei se não queria ir a Jerusalém e ali ser julgado no tocante às mesmas.
Act 25:21 Mas apelando Paulo para que fosse reservado ao julgamento do imperador, mandei que fosse detido até que o enviasse a César.
Act 25:22 Então Agripa disse a Festo: Eu bem quisera ouvir esse homem. Respondeu-lhe ele: Amanhã o ouvirás.
Act 25:23 No dia seguinte vindo Agripa e Berenice, com muito aparato, entraram no auditório com os chefes militares e homens principais da cidade; então, por ordem de Festo, Paulo foi trazido.
Act 25:24 Disse Festo: Rei Agripa e vós todos que estais presentes conosco, vedes este homem por causa de quem toda a multidão dos judeus, tanto em Jerusalém como aqui, recorreu a mim, clamando que não convinha que ele vivesse mais.
Act 25:25 Eu, porém, achei que ele não havia praticado coisa alguma digna de morte; mas havendo ele apelado para o imperador, resolvi remeter-lho.
Act 25:26 Do qual não tenho coisa certa que escreva a meu senhor, e por isso perante vós o trouxe, principalmente perante ti, ó rei Agripa, para que, depois de feito o interrogatório, tenha eu alguma coisa que escrever.
Act 25:27 Porque não me parece razoável enviar um preso, e não notificar as acusações que há contra ele.
Atos capítulo 25