Em sua carta aos Gálatas, capítulos 1 v.15 a 2 v.1, Paulo nos fornece alguns detalhes da sua conversão e do que aconteceu em seguida, preparando-o para o seu ministério e o seu início. Essas informações completam a narração encontrada nessa passagem, por isto vamos intercalá-las onde nos parece mais apropriado.
Saulo fora predestinado e, pela graça de Deus, chamado para conhecer o Filho e pregá-Lo entre os gentios (Gal. 1:15-16). Não obstante, seu primeiro testemunho, depois de ter passado vários dias com os discípulos de Cristo em Damasco, foi para os judeus nas sinagogas. Fora para eles que ele levara cartas de recomendação das autoridades religiosas judaicas em Jerusalém, dando-lhe autoridade para prender e levar para Jerusalém os cristãos que encontrasse em Damasco.
Esses judeus ficaram perplexos ao ouvi-lo anunciar que Jesus “é o Filho de Deus” e isso os consternava pois julgavam que ele se tornara em um traidor à sua causa. Mas Saulo, além da experiência pessoal que teve, estava habilitado a provar através das Escrituras a veracidade dessa identidade, pois conhecia as Escrituras muito bem devido aos seus estudos. Os judeus estavam confusos.
Sem consultar ninguém, Saulo viajou para a “Arábia” (Gal. 1:17) – era uma região grande, estendo-se para o sul a partir do que hoje conhecemos como a Jordânia. Ele não nos dá mais detalhes, mas teria sido uma oportunidade para se preparar para o ministério entre os gentíos, entre os quais ele se encontrava.
Não sabemos quanto tempo esteve lá, mas em seguida Saulo voltou para Damasco, ali ficando por três anos. Durante todo esse tempo ele não havia se encontrado com nenhum dos que já eram apóstolos antes dele, mas assim mesmo ele se fortalecia cada vez mais em seu ministério. A sua ida finalmente para Jerusalém foi forçada pelas circunstâncias criadas pelos judeus, que se tornaram seus inimigos.
Saulo soube de um plano elaborado unanimemente pelos judeus para matá-lo. Ele conta que “o que governava sob o rei Aretas guardava a cidade dos damascenos, para me prender” (2 Coríntios 11:32); passaram a vigiar as portas da cidade dia e noite, mas os discípulos de Saulo o levaram de noite e o fizeram descer num cesto, através de uma abertura na muralha.
Saulo então subiu a Jerusalém para conhecer Pedro pessoalmente. Essa cidade era o lugar mais perigoso que podia haver para ele, do ponto de vista humano, mas Saulo se achava fortalecido em sua fé e sabia que Deus iria usá-lo muito mais para a Sua glória.
Ao chegar em Jerusalém Saulo descobriu, talvez para sua surpresa, que todos os discípulos estavam com medo dele, não acreditando que realmente fosse um discípulo de Jesus Cristo. Esta desconfiança parece surpreendente, pois depois de tanto tempo eles já deveriam ter tido notícias do seu testemunho em Damasco. Sem dúvida achavam que eram boatos inacreditáveis, sabendo como Saulo havia procedido antes, e julgando que talvez fosse uma dissimulação para poder apanhá-los a todos.
Sua situação era precária:
Por razões óbvias Saulo não tentou entrar em contato com o Sinédrio que o tinha enviado a Damasco. Tinha saído como um herói na defesa do farisaísmo, mas retornava como um apóstata e um traidor aos olhos dos fariseus.
Escapara à conspiração dos judeus em Damasco mas achava-se agora objeto de suspeita pelos próprios discípulos em Jerusalém, que não tinham qualquer prova da sinceridade da sua conversão.
Neste impasse, surgiu Barnabé, um homem mencionado logo no relato do princípio da igreja em Jerusalém, quando vendeu uma propriedade e entregou o produto da venda aos apóstolos para distribuição aos necessitados (cap. 4 v.36). Barnabé era um levita convertido a Cristo, de nome José, originário de Chipre, e o apelido Barnabé, que significa “encorajador”, lhe fora dado pelos apóstolos porque sempre pensava no bem-estar e proveito espiritual dos outros, especialmente no ministério cristão.
Veremos adiante que, tempos depois da ida de Saulo de volta a Tarso, Barnabé foi enviado a Antioquia pela igreja de Jerusalém para animar a igreja que ali se formara pela dispersão dos crentes em Jerusalém. Uma vez ali, Barnabé foi procurar Saulo em Tarso e o trouxe a Antioquia para ajudá-lo no trabalho de ensino (cap.11 vv.22 e 25).
Lucas o chama de “homem bom” (Atos 11:24) e o seu nome aparece mais tarde em primeiro lugar na lista de profetas e mestres da igreja que se formou em Antioquia (cap.13:1). Barnabé foi companheiro de Paulo na sua primeira viagem missionária.
Barnabé foi inteirado da situação em que Saulo se encontrava, e achou que era pessoa digna de confiança. Existe a hipótese, viável e agradável, que este homem bem instruido tenha ido também à escola de Gamaliel e lá tenha conhecido Saulo quando estudava lá. É apenas uma hipótese, mas poderia explicar como ele logo teve contato com Saulo, conhecendo-o melhor do que os outros que só sabiam da sua fama de perseguidor da igreja.
Barnabé fez jus ao seu apelido levando Saulo até os apóstolos. Paulo nos informa que dos apóstolos ele só viu Pedro, mas também viu Tiago, irmão do Senhor (que escreveu a epístola que tem o seu nome, e era um dos anciãos da igreja de Jerusalém, com Pedro e outros apóstolos). Barnabé lhes contou sobre as circunstâncias da conversão de Saulo e como Saulo depois passou a pregar corajosamente em nome de Jesus.
Com isso Saulo foi bem recebido pelos irmãos em Jerusalém, e ficou com Pedro por quinze dias. Tanto Pedro como Tiago, teriam muito para contar a Saulo a respeito do Senhor Jesus, pois juntos sabiam de toda a Sua vida terrena, Sua morte, ressurreição e ascensão, sendo testemunhas pessoais de todos os fatos. Também durante esse tempo, para a tranquilidade de Saulo, ele podia andar com liberdade em Jerusalém, onde passou a pregar, sem medo, em nome do Senhor.
Foi uma visita curta, mas ficou provado que, embora ele tivesse recebido o Evangelho independentemente dos outros apóstolos, era o mesmo Evangelho que eles pregavam - o Evangelho que ele tinha perseguido tão ferozmente antes de encontrar-se com o Senhor!
Ele também foi falar e discutir com os judeus de idioma grego (como os que haviam perseguido Estêvão – capítulo 6:11), mas estes o receberam mal, e acabaram tentando matá-lo. Sabendo disso, os irmãos o levaram para o porto de Cesaréia e o embarcaram para Tarso, de onde se originava. Esta cidade estava na Cilícia, e Paulo nos informa que durante os catorze anos seguintes ele exerceu o seu ministério tanto na Cilícia como na Síria.
Paulo informa que, durante todo esse tempo, ele não era conhecido de vista das igrejas de Cristo na Judéia, mas somente tinham ouvido dizer: “aquele que outrora nos perseguia agora prega a fé que antes procurava destruir; e glorificavam a Deus a respeito de mim”. (Gal. 1:22-24).
No início da sua epístola aos Gálatas, Paulo começa a fazer a defesa do seu apostolado em vista da opinião disseminada por uns crentes judaizantes naquela região, que ele não tinha a mesma autoridade que os apóstolos que estiveram com o Senhor Jesus durante o Seu ministério, mesmo pondo em dúvida que fosse um apóstolo genuíno. O mesmo aconteceu em Corinto, provocando a expressão de ironia mais violenta da parte de Paulo: ver em 2 Coríntios 10 a 12.
Paulo nega asperamente que ele fosse apóstolo “da parte dos homens, nem por intermédio de homem algum, mas sim por Jesus Cristo, e por Deus Pai, que O ressuscitou dentre os mortos” (Gal. 1:1).
Paulo prova a sua independência dos demais apóstolos no texto aqui estudado, sendo a sua igualdade com eles reconhecida por eles. Sua nomeação para apóstolo foi feita pelo próprio Jesus Cristo (como os outros apóstolos) e por Deus o Pai. É apóstolo igualmente pela vontade do Filho e do Pai, tendo visto Cristo ressuscitado assim como os outros.
21 Todos os seus ouvintes pasmavam e diziam: Não é este o que em Jerusalém perseguia os que invocavam esse nome, e para isso veio aqui, para os levar presos aos principais sacerdotes?
22 Saulo, porém, se fortalecia cada vez mais e confundia os judeus que habitavam em Damasco, provando que Jesus era o Cristo.
23 Decorridos muitos dias, os judeus deliberaram entre si mata- lo.
24 Mas as suas ciladas vieram ao conhecimento de Saulo. E como eles guardavam as portas de dia e de noite para tirar-lhe a vida,
25 os discípulos, tomando-o de noite, desceram-no pelo muro, dentro de um cesto.
26 Tendo Saulo chegado a Jerusalém, procurava juntar-se aos discípulos; mas todos o temiam, não crendo que fosse discípulo.
27 Então Barnabé, tomando-o consigo, o levou aos apóstolos, e lhes contou como no caminho ele vira o Senhor e que este lhe falara, e como em Damasco pregara ousadamente em nome de Jesus.
28 Assim andava com eles em Jerusalém, entrando e saindo,
29 e pregando ousadamente em nome do Senhor. Falava e disputava também com os helenistas; mas procuravam matá-lo.
30 Os irmãos, porém, quando o souberam, acompanharam-no até Cesaréia e o enviaram a Tarso.
Atos capítulo 9, versículos 21 a 30