Moisés passou quarenta dias no monte (capítulo 24:18), na presença do SENHOR, para receber a primeira parte da lei: os estatutos sobre o relacionamento civil, e instruções sobre as três festas anuais e sobre a conquista de Canaã.
Enquanto ele estava ali, o povo se sentiu abandonado pelo seu grande líder. Eles tinham presenciado as grandes coisas que o SENHOR invisível havia feito por eles, mas agora seu representante Moisés, seu profeta, havia desaparecido montanha acima e eles queriam ter outro objeto visível, formado ao seu gosto, que representasse o seu Deus, a quem pudessem render culto.
Talvez nos choque essa incompreensão do povo, mas é típico do mundo ainda hoje, mesmo o que se chama "cristão": não satisfeitos com o Deus invisível, que se tem revelado poderosamente através dos tempos através do seu povo, do seu Filho, e do seu Espírito, eles querem um objeto visível e palpável, um símbolo, uma imagem, ou um ícone, para receber sua homenagem e adoração como representante de Deus.
Arão, irmão e porta-voz de Moisés no Egito, havia acompanhado Moisés por parte do caminho pela montanha, junto com seus filhos e setenta dos anciãos de Israel, contemplando de longe a manifestação da glória do SENHOR (capítulo 19:24, 24:9-11), depois regressou para o meio do povo, aguardando a volta de Moisés. Ele foi procurado pelo povo, quando o final dos quarenta dias se aproximava, e instado a fazer deuses para eles. Movido por medo do povo, ignorância, ou fraqueza de caráter, assumiu uma "atitude liberal" e acabou cedendo.
Tendo obtido as argolas de ouro das orelhas das mulheres e dos jovens (talvez dados a eles pelos egípcios, eram usados como amuletos ou talismãs - Gênesis 35:4), Arão fez com seu ouro um bezerro, ou novilho. Esse era um animal sagrado no Egito, onde cultuavam o "deus" Apis, um touro. Também os cananeus representavam Baal (Senhor), ou Moloque, como um touro, símbolo para eles de força e fertilidade, em cujo culto eles praticavam atos de imoralidade sexual. Os israelitas acharam, portanto, natural fazer a estátua de um novilho, para representar o Deus que os havia levado até ali.
Mas, ao fazer isso, eles se esqueceram dos primeiros dois mandamentos do SENHOR. Eles podiam ter boas intenções, podiam ser sinceros, podiam mesmo pensar que estavam cultuando a Deus, mas isso não desculpava a sua desobediência. Mesmo se não fazemos ídolos, podemos ser culpados de procurar moldar nosso Deus à nossa imagem para ajustá-lo às nossas expectativas, desejos e circunstâncias. Devemos sempre recorrer à sua Palavra para nos lembrarmos de como Ele realmente é, qual é a Sua vontade, como devemos nos aproximar dEle, com que espécie de sacrifícios Ele se agrada e de que forma Ele deve ser adorado.
Arão assumiu a posição de sacerdote, construiu um altar diante do bezerro de ouro e convocou o povo para uma festa ao SENHOR no dia seguinte. É óbvio que o motivo não era vir ao SENHOR em reverência e humildade, para oferecer-lhe sacrifícios pelos seus pecados e exaltar o Seu nome: eles madrugaram para oferecer holocaustos e ofertas pacíficas, e depois assentaram-se para comer, e beber, e divertir-se (esta é a mesma palavra encontrada em Gênesis 26:8, e sugere atividade de ordem sexual, uma orgia como se praticava nos cultos pagãos).
Lamentavelmente é o divertimento que atrai muita gente para certas "igrejas" hoje em dia. Alguns "cultos de louvor" não passam de um vergonhoso deboche, onde as emoções são ativadas hipnoticamente por frases e corinhos repetidos muitas vezes ao som de música estridente, e por cenas inesperadas e chocantes manipuladas por "pastores" ávidos por uma boa arrecadação financeira. A falta de reverência é notória, o alvo sendo apenas a satisfação pessoal.
O SENHOR, porém, embora estivesse com Moisés, era onisciente e sabia de tudo o que estava acontecendo. Ele mandou que Moisés descesse e lhe disse o que o povo estava fazendo. Deus não redimiu o povo de Israel porque era um povo superior, maior, ou melhor do que qualquer outra nação: Israel não era nada disso! Deus o fez por causa da sua promessa a Abraão, a Isaque e a Jacó, de que da sua semente faria uma grande nação. Deus disse que este povo era de dura cerviz, ou seja, desobediente, como um cavalo que não responde ao controle das rédeas, e propôs destruí-lo e fazer uma grande nação a partir de Moisés. Poderia ter sido uma grande tentação para Moisés, pois assim ele estaria livre deste povo rebelde, e gozaria sozinho de todas as bênçãos da Promessa.
Mas, ao invés disso, ele nos dá um exemplo de uma das melhores orações intercessórias da Bíblia. Toda esta cena nos mostra o forte contraste entre a Lei e a Graça, ou entre a Justiça e a Misericórdia:
o SENHOR propôs com a sua Justiça destruir toda a nação por sua desobediência à Lei, à qual ela havia se submetido;
Moisés apela para a Misericórdia do SENHOR, e usa o argumento do testemunho para os egípcios, e o da promessa aos patriarcas; por sua Graça o SENHOR então tem misericórdia do povo, e atende ao seu apelo.
Vemos aqui um paralelo com a intercessão feita por Cristo (João 17:1-26): Israel era uma nação, sob provação (capítulo 19:5-6); os salvos pela graça são uma família, aguardando a glória (João 20:17; Romanos 5:1-2). Estes têm um advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o justo, que é a propiciação dos seus pecados (1 João 2:1-2). Moisés apelou para o concerto (versículo 13) mas Cristo aponta ao sacrifício (João 17:4). Embora merecendo a ira de Deus, Ele está pronto a nos perdoar e a nos restaurar à comunhão com Ele, tendo misericordiosamente pago o preço para satisfazer à sua justiça.
É provável que nessa ocasião o SENHOR estava pondo à prova a lealdade de Moisés ao seu povo, pois Ele sabia de antemão qual seria a Sua decisão. Deus não é homem, para que se arrependa (1 Samuel 15:29, Ezequiel 24:14), mas Ele age para conosco conforme as nossas ações e atitudes. Ele poupou o povo por causa de Moisés.
A ira de Moisés ao ver a idolatria e a folia do povo foi tal que:
quebrou as preciosas tábuas lavradas e escritas pela mão de Deus, simbolizando vividamente a violação da aliança,
queimou e reduziu a pó o bezerro (provavelmente tinha uma armação interna de madeira) e, misturando o pó em água, lançou-o no ribeiro que descia do monte e assim fez o povo bebê-lo (Deuteronômio 9:21) e, finalmente,
voltou-se contra Arão indagando "que te fez este povo, que trouxeste sobre ele tamanho pecado?" assim mostrando que Arão, líder na sua ausência, era o principal responsável (ele também havia intercedido por Arão perante o SENHOR, para que não o destruísse - Deuteronômio 9:20).
A ira contra o pecado é um sinal de vitalidade espiritual, e não deve ser abafada, mas tomemos cuidado para não falar ou fazer algo de que tenhamos motivo para nos arrepender mais tarde.
Arão procurou desculpar-se dizendo que como Moisés sabia, o povo era propenso para o mal, e que ele havia se limitado a pedir ouro do povo e a lançá-lo no fogo. O bezerro havia então saído dali! Muitas vezes não queremos admitir nossos erros e inventamos desculpas esfarrapadas ou procuramos pôr a culpa nos outros. Mas, o Senhor disse: nada há encoberto que não venha a ser revelado; e oculto que não venha a ser conhecido (Lucas 12:2).
O povo estava desenfreado, isto é, perdera seu recato (algumas traduções dizem andava nu). Era necessário tomar medidas enérgicas para acabar com a imoralidade, e foi isso que Moisés fez, matando três mil homens. Em suas epístolas, o apóstolo Paulo nos lembra que a tolerância pelos crentes que continuam a viver em pecado contamina toda a igreja (1 Coríntios 5:1-7). Esse tipo de tolerância, contrária à disciplina necessária nas igrejas, tem resultado no declínio espiritual e moral das igrejas através dos séculos.
Tendo feito essa "limpeza", Moisés foi ao SENHOR e lhe deu um "ultimato": - que perdoasse o povo ou riscasse o seu nome. O SENHOR declarou-lhe que riscaria todo aquele que pecasse contra Ele (Moisés não podia interferir), e que Moisés voltasse ao trabalho.
R David Jones
1 Mas, vendo o povo que Moisés tardava em descer do monte, ajuntou-se o povo a Arão e disseram-lhe: Levanta-te, faze-nos deuses que vão adiante de nós; porque quanto a este Moisés, a este homem que nos tirou da terra do Egito, não sabemos o que lhe sucedeu.
2 E Arão lhes disse: Arrancai os pendentes de ouro que estão nas orelhas de vossas mulheres, e de vossos filhos, e de vossas filhas e trazei-mos.
3 Então, todo o povo arrancou os pendentes de ouro que estavam nas suas orelhas, e os trouxeram a Arão,
4 e ele os tomou das suas mãos, e formou o ouro com um buril, e fez dele um bezerro de fundição. Então, disseram: Estes são teus deuses, ó Israel, que te tiraram da terra do Egito.
5 E Arão, vendo isto, edificou um altar diante dele; e Arão apregoou e disse: Amanhã será festa ao SENHOR.
6 E, no dia seguinte, madrugaram, e ofereceram holocaustos, e trouxeram ofertas pacíficas; e o povo assentou-se a comer e a beber; depois, levantaram-se a folgar.
7 Então, disse o SENHOR a Moisés: Vai, desce; porque o teu povo, que fizeste subir do Egito, se tem corrompido,
8 e depressa se tem desviado do caminho que eu lhes tinha ordenado; fizeram para si um bezerro de fundição, e perante ele se inclinaram, e sacrificaram-lhe, e disseram: Estes são os teus deuses, ó Israel, que te tiraram da terra do Egito.
9 Disse mais o SENHOR a Moisés: Tenho visto a este povo, e eis que é povo obstinado.
10 Agora, pois, deixa-me, que o meu furor se acenda contra eles, e os consuma; e eu farei de ti uma grande nação.
11 Porém Moisés suplicou ao SENHOR, seu Deus, e disse: Ó SENHOR, por que se acende o teu furor contra o teu povo, que tu tiraste da terra do Egito com grande força e com forte mão?
12 Por que hão de falar os egípcios, dizendo: Para mal os tirou, para matá-los nos montes e para destruí-los da face da terra? Torna-te da ira do teu furor e arrepende-te deste mal contra o teu povo.
13 Lembra-te de Abraão, de Isaque e de Israel, teus servos, aos quais por ti mesmo tens jurado e lhes disseste: Multiplicarei a vossa semente como as estrelas dos céus e darei à vossa semente toda esta terra, de que tenho dito, para que a possuam por herança eternamente.
14 Então, o SENHOR arrependeu-se do mal que dissera que havia de fazer ao seu povo.
15 E voltou Moisés, e desceu do monte com as duas tábuas do Testemunho na sua mão, tábuas escritas de ambas as bandas; de uma e de outra banda escritas estavam.
16 E aquelas tábuas eram obra de Deus; também a escritura era a mesma escritura de Deus, esculpida nas tábuas.
17 E, ouvindo Josué a voz do povo que jubilava, disse a Moisés: Alarido de guerra há no arraial.
18 Porém ele disse: Não é alarido dos vitoriosos, nem alarido dos vencidos, mas o alarido dos que cantam eu ouço.
19 E aconteceu que, chegando ele ao arraial e vendo o bezerro e as danças, acendeu-se o furor de Moisés, e arremessou as tábuas das suas mãos, e quebrou-as ao pé do monte,
20 e tomou o bezerro que tinham feito, e queimou-o no fogo, moendo-o até que se tornou em pó; e o espargiu sobre as águas e deu-o a beber aos filhos de Israel.
21 E Moisés disse a Arão: Que te tem feito este povo, que sobre ele trouxeste tamanho pecado?
22 Então, disse Arão: Não se acenda a ira do meu senhor; tu sabes que este povo é inclinado ao mal;
23 e eles me disseram: Faze-nos deuses que vão adiante de nós; porque não sabemos que sucedeu a este Moisés, a este homem que nos tirou da terra do Egito.
24 Então, eu lhes disse: Quem tem ouro, arranque-o; e deram-mo, e lancei-o no fogo, e saiu este bezerro.
25 E, vendo Moisés que o povo estava despido, porque Arão o havia despido para vergonha entre os seus inimigos,
26 pôs-se em pé Moisés na porta do arraial e disse: Quem é do SENHOR, venha a mim. Então, se ajuntaram a ele todos os filhos de Levi.
27 E disse-lhes: Assim diz o SENHOR, o Deus de Israel: Cada um ponha a sua espada sobre a sua coxa; e passai e tornai pelo arraial de porta em porta, e mate cada um a seu irmão, e cada um a seu amigo, e cada um a seu próximo.
28 E os filhos de Levi fizeram conforme a palavra de Moisés; e caíram do povo, aquele dia, uns três mil homens.
29 Porquanto Moisés tinha dito: Consagrai hoje as vossas mãos ao SENHOR; porquanto cada um será contra o seu filho e contra o seu irmão; e isto para ele vos dar hoje bênção.
30 E aconteceu que, no dia seguinte, Moisés disse ao povo: Vós pecastes grande pecado; agora, porém, subirei ao SENHOR; porventura, farei propiciação por vosso pecado.
31 Assim, tornou Moisés ao SENHOR e disse: Ora, este povo pecou pecado grande, fazendo para si deuses de ouro.
32 Agora, pois, perdoa o seu pecado; se não, risca-me, peço-te, do teu livro, que tens escrito.
33 Então, disse o SENHOR a Moisés: Aquele que pecar contra mim, a este riscarei eu do meu livro.
34 Vai, pois, agora, conduze este povo para onde te tenho dito; eis que o meu Anjo irá adiante de ti; porém, no dia da minha visitação, visitarei, neles, o seu pecado.
35 Assim, feriu o SENHOR o povo, porquanto fizeram o bezerro que Arão tinha feito.
Êxodo capítulo 32