Jacó continuou sua viagem até enfim chegar a um poço num campo, onde os pastores de Harã levavam seus rebanhos para beber água (não era o mesmo poço onde o servo de Abraão encontrara Rebeca, que estava na entrada da cidade - capítulo 24:11).
Havia uma grande pedra cobrindo a boca do poço, que precisava ser removida para tirar água, e colocada outra vez depois. Talvez para maior comodidade, os pastores esperavam até que todos os rebanhos estivessem ali, para abrir e fechar o poço uma vez só.
Eles lhe disseram de onde eram, e que conheciam seu tio Labão (que ele chamou de filho de Naor: era neto dele - capítulo 24:15,29 - mas na linguagem daquele tempo filho eqüivalia também a descendente), e que sua filha Raquel estava chegando com as ovelhas de seu pai.
Jacó quis que eles dessem logo água às suas ovelhas e fossem embora, talvez para assim poder falar a sós com sua prima. Mas eles insistiram em esperar, conforme seu costume.
Raquel (que significa ovelha) chegou logo a seguir, e, ao vê-la e ao rebanho que conduzia, Jacó apressou-se em tirar a pedra do poço ele próprio, e a dar de beber ao rebanho do seu tio: uma cortesia para começar bem seu relacionamento.
A seguir, Jacó beijou Raquel, uma saudação própria para parentes chegados, e chorou de emoção: sua viagem chegara ao fim de uma maneira tão feliz! Ele então explicou quem era, e ela partiu correndo para contar ao seu pai.
Labão também correu ao encontro de Jacó quando soube, abraçou-o, beijou-o, e o levou para casa. Foi uma recepção das mais carinhosas, e, ao ouvir sobre sua experiência no caminho, Labão declarou "de fato, és meu osso e minha carne", expressão usada naquele tempo nos rituais de adoção.
Durante um mês Jacó ficou com Labão, na condição de hóspede. Foi o tempo necessário para se recuperar da viagem longa que havia feito, adaptar-se ao ambiente, conhecer melhor seus parentes (especialmente suas primas), e se fazer conhecido por eles.
Sem dúvida Jacó não ficou ocioso, mas ajudava especialmente naquilo que gostava mais: o pastoreio. Seu tio propôs contratá-lo, pagando pelos seus serviços. Jacó aparentemente havia chegado com suas mãos vazias (não lemos que ele tenha dado algum presente ao chegar, ao contrário do servo de Abraão). É curioso lembrar que Labão devia estar com uns 120 anos de idade, e embora não saibamos a idade de suas filhas nesta ocasião, é improvável que fossem muito novas. Jacó estava com uns 75 anos.
O segundo objetivo de Jacó ao ir para lá era obter para si uma esposa das filhas de Labão (capítulo 28:2); após essa convivência, Jacó amava a mais nova, e mais bonita, Raquel. Ele queria casar com ela, mas não tinha com que pagar o dote que, conforme os costumes da época, deveria ser pago à família, em compensação pela perda dela.
Para resolver o problema, ele propôs trabalhar por sete anos para Labão como pagamento por ela. Labão aceitou a proposta: o casamento se faria ao se completarem os sete anos de trabalho. Era tal o amor de Jacó que os sete anos lhe pareceram como sete dias!
Mas, terminados os sete anos, Labão o enganou dando-lhe a mais velha Lia ao invés de Raquel, o que Jacó só veio a descobrir depois de consumado o casamento. Como Jacó queria mesmo Raquel, ele foi obrigado a trabalhar mais sete anos por ela. Assim o suplantador foi por sua vez enganado.
Desta vez, para "adoçar a pílula", Labão concordou que o casamento se fizesse em antecipação aos sete anos de trabalho, logo após a semana de lua de mel com Lia. Labão também deu uma serva para cada uma de suas filhas: como Hagar, elas eram escravas para servirem suas filhas em tudo, mesmo para lhes darem filhos através de Jacó se suas senhoras assim o desejassem.
Apesar de ter sido logrado por Labão, Jacó manteve sua parte do contrato e trabalhou para ele por mais sete anos sem nada receber além de Raquel. Durante esse tempo, sua família aumentou com os filhos que vieram, e o relato bíblico é bem detalhado a respeito das circunstâncias mediante as quais as servas também deram filhos a Jacó. Em resumo, os filhos foram:
De sua primeira esposa Lia:
Rúben (que significa eis um filho)
Simeão (escuta)
Levi (apego)
Judá (louvor)
Issacar (alugado, ou recompensa)
Zebulon (habitação)
Também Lia lhe deu uma filha que foi chamada Diná (justificada).
Da sua serva Zilpa:
Gade (boa sorte)
Aser (feliz)
De sua segunda esposa Raquel:
José (Ele tirou, ou possa Ele acrescentar)
Mais tarde Raquel teve outro filho, Benjamim (filho da minha mão direita): ela morreu no parto.
Da sua serva Bila:
Dã (justiça)
Naftali (luta)
Na antigüidade a mãe escolhia os nomes de seus filhos, muitas vezes em função da situação em que ocorria o nascimento, como vemos acima. Às vezes, seu nome era mudado mais tarde para refletir alguma característica especial daquela pessoa. Deus mesmo modificou os nomes de alguns, como já vimos no caso de Abraão e no de Sarai.
Também Jacó (suplantador) teve seu nome mudado mais tarde para Israel (príncipe com Deus). Ambos os nomes são usados para a nação que dele procedeu: Jacó é o nome usado nas profecias para indicar a descendência natural, física, de Abraão, Isaque e Jacó; Israel é usado para o seu aspecto espiritual, em seu relacionamento com Deus (Isaías 9:8).
Jacó em Harã é uma figura profética do que viria acontecer séculos mais tarde com a nação que dele descenderia:
estava exilado, fora da terra prometida
não tinha altar (Oséias 3:4-5)
recebeu um nome mau, e má fama (capítulo 31:1, Romanos 2:17-24)
mas estava debaixo da proteção do SENHOR, por causa da promessa (capítulo 28: 1 5, Romanos 11:28-29)
e foi trazido novamente à sua terra (capítulo 31:3, 35:1-4, Ezequiel 37:21-28).
Jacó não foi abandonado, mas teve que colher o fruto do mal que havia semeado em seu lar.
1 Então, pôs-se Jacó a pé e foi-se à terra dos filhos do Oriente.
2 E olhou, e eis um poço no campo, e eis três rebanhos de ovelhas que estavam deitados junto a ele; porque daquele poço davam de beber aos rebanhos; e havia uma grande pedra sobre a boca do poço.
3 E ajuntavam ali todos os rebanhos, e removiam a pedra de sobre a boca do poço, e davam de beber às ovelhas, e tornavam a pôr a pedra sobre a boca do poço, no seu lugar.
4 E disse-lhes Jacó: Meus irmãos, donde sois? E disseram: Somos de Harã.
5 E ele lhes disse: Conheceis a Labão, filho de Naor? E disseram: Conhecemos.
6 Disse-lhes mais: Está ele bem? E disseram: Está bem, e eis aqui Raquel, sua filha, que vem com as ovelhas.
7 E ele disse: Eis que ainda é muito dia, não é tempo de ajuntar o gado; dai de beber às ovelhas, e ide, e apascentai-as.
8 E disseram: Não podemos, até que todos os rebanhos se ajuntem, e removam a pedra de sobre a boca do poço, para que demos de beber às ovelhas.
9 Estando ele ainda falando com eles, veio Raquel com as ovelhas de seu pai; porque ela era pastora.
10 E aconteceu que, vendo Jacó a Raquel, filha de Labão, irmão de sua mãe, e as ovelhas de Labão, irmão de sua mãe, chegou Jacó, e revolveu a pedra de sobre a boca do poço, e deu de beber às ovelhas de Labão, irmão de sua mãe.
11 E Jacó beijou a Raquel, e levantou a sua voz, e chorou.
12 E Jacó anunciou a Raquel que era irmão de seu pai e que era filho de Rebeca. Então, ela correu e o anunciou a seu pai.
13 E aconteceu que, ouvindo Labão as novas de Jacó, filho de sua irmã, correu-lhe ao encontro, e abraçou-o, e beijou-o, e levou-o à sua casa. E contou ele a Labão todas estas coisas.
14 Então, Labão disse-lhe: Verdadeiramente és tu o meu osso e a minha carne. E ficou com ele um mês inteiro.
15 Depois, disse Labão a Jacó: Porque tu és meu irmão, hás de servir-me de graça? Declara-me qual será o teu salário.
16 E Labão tinha duas filhas; o nome da mais velha era Léia, e o nome da menor, Raquel.
17 Léia, porém, tinha olhos tenros, mas Raquel era de formoso semblante e formosa à vista.
18 E Jacó amava a Raquel e disse: Sete anos te servirei por Raquel, tua filha menor.
19 Então, disse Labão: Melhor é que eu ta dê do que a dê a outro varão; fica comigo.
20 Assim, serviu Jacó sete anos por Raquel; e foram aos seus olhos como poucos dias, pelo muito que a amava.
21 E disse Jacó a Labão: Dá-me minha mulher, porque meus dias são cumpridos, para que eu entre a ela.
22 Então, ajuntou Labão todos os varões daquele lugar e fez um banquete.
23 E aconteceu, à tarde, que tomou Léia, sua filha, e trouxe-lha. E entrou a ela.
24 E Labão deu sua serva Zilpa por serva a Léia, sua filha.
25 E aconteceu pela manhã ver que era Léia; pelo que disse a Labão: Por que me fizeste isso? Não te tenho servido por Raquel? Por que, pois, me enganaste?
26 E disse Labão: Não se faz assim no nosso lugar, que a menor se dê antes da primogênita.
27 Cumpre a semana desta; então te daremos também a outra, pelo serviço que ainda outros sete anos servires comigo.
28 E Jacó fez assim e cumpriu a semana desta; então, lhe deu por mulher Raquel, sua filha.
29 E Labão deu sua serva Bila por serva a Raquel, sua filha.
30 E entrou também a Raquel e amou também a Raquel mais do que a Léia; e serviu com ele ainda outros sete anos.
31 Vendo, pois, o SENHOR que Léia era aborrecida, abriu a sua madre; porém Raquel era estéril.
32 E concebeu Léia, e teve um filho, e chamou o seu nome Rúben, dizendo: Porque o SENHOR atendeu à minha aflição. Por isso, agora me amará o meu marido.
33 E concebeu outra vez e teve um filho, dizendo: Porquanto o SENHOR ouviu que eu era aborrecida, me deu também este; e chamou o seu nome Simeão.
34 E concebeu outra vez e teve um filho, dizendo: Agora, esta vez se ajuntará meu marido comigo, porque três filhos lhe tenho dado; por isso, chamou o seu nome Levi.
35 E concebeu outra vez e teve um filho, dizendo: Esta vez louvarei ao SENHOR. Por isso, chamou o seu nome Judá; e cessou de ter filhos.
1 Vendo, pois, Raquel que não dava filhos a Jacó, teve Raquel inveja de sua irmã e disse a Jacó: Dá-me filhos, senão morro.
2 Então, se acendeu a ira de Jacó contra Raquel e disse: Estou eu no lugar de Deus, que te impediu o fruto de teu ventre?
3 E ela disse: Eis aqui minha serva Bila; entra a ela, para que tenha filhos sobre os meus joelhos, e eu assim receba filhos por ela.
4 Assim, lhe deu a Bila, sua serva, por mulher; e Jacó entrou a ela.
5 E concebeu Bila e deu a Jacó um filho.
6 Então, disse Raquel: Julgou-me Deus, e também ouviu a minha voz, e me deu um filho; por isso, chamou o seu nome Dã.
7 E Bila, serva de Raquel, concebeu outra vez e deu a Jacó o segundo filho.
8 Então, disse Raquel: Com lutas de Deus, tenho lutado com minha irmã e também venci; e chamou o seu nome Naftali.
9 Vendo, pois, Léia que cessava de gerar, tomou também a Zilpa, sua serva, e deu-a a Jacó por mulher.
10 E deu Zilpa, serva de Léia, um filho a Jacó.
11 Então, disse Léia: Vem uma turba; e chamou o seu nome de Gade.
12 Depois, deu Zilpa, serva de Léia, um segundo filho a Jacó.
13 Então, disse Léia: Para minha ventura, porque as filhas me terão por bem-aventurada; e chamou o seu nome Aser.
14 E foi Rúben, nos dias da sega do trigo, e achou mandrágoras no campo. E trouxe-as a Léia, sua mãe. Então, disse Raquel a Léia: Ora, dá-me das mandrágoras do teu filho.
15 E ela lhe disse: É já pouco que hajas tomado o meu marido? Tomarás também as mandrágoras do meu filho? Então, disse Raquel: Por isso, se deitará contigo esta noite pelas mandrágoras de teu filho.
16 Vindo, pois, Jacó, à tarde, do campo, saiu-lhe Léia ao encontro e disse: A mim entrarás, porque certamente te aluguei com as mandrágoras do meu filho. E deitou-se com ela aquela noite.
17 E ouviu Deus a Léia, e concebeu e teve um quinto filho.
18 Então, disse Léia: Deus me tem dado o meu galardão, pois tenho dado minha serva ao meu marido. E chamou o seu nome Issacar.
19 E Léia concebeu outra vez e deu a Jacó um sexto filho.
20 E disse Léia: Deus me deu a mim uma boa dádiva; desta vez morará o meu marido comigo, porque lhe tenho dado seis filhos. E chamou o seu nome Zebulom.
21 E, depois, teve uma filha e chamou o seu nome Diná.
22 E lembrou-se Deus de Raquel, e Deus a ouviu, e abriu a sua madre.
23 E ela concebeu, e teve um filho, e disse: Tirou-me Deus a minha vergonha.
24 E chamou o seu nome José, dizendo: O SENHOR me acrescente outro filho.
Gênesis capítulo 29:1 a 30:24