Deus havia anunciado a Isaque que Esaú serviria a Jacó (capítulo 25:23) e Jacó havia adquirido o direito à primogenitura de Esaú (capítulo 25:33); neste capítulo, vemos a maneira como Jacó iludiu Isaque a fim de ser abençoado por ele.
De uma maneira geral, uma bênção consiste em expressar desejos de boas coisas para outrem, ou, melhor ainda, uma oração a Deus a seu favor. Ninguém tem poder para melhorar o futuro de outro mediante a sua bênção, ou de piorá-lo com sua maldição: só Deus tem esse poder. Todavia, Deus usou seus servos, geralmente profetas, no passado, para transmitir sua mensagem de bênção ou maldição; o SENHOR separou a tribo de Levi para abençoar em Seu nome (Deuteronômio 10:8) e deu-lhes as palavras exatas, que consistem em desejar que o SENHOR lhes seja propício (Números 6:23-27).
A bênção de Isaque, neste caso, só teria valor se procedesse de Deus. Mesmo no caso de seu pai Abraão, Deus prometeu: "abençoarei os que te abençoarem (te desejarem o bem) e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem (te desejarem o mal) ..." (capítulo 12:3): nunca "abençoarei os que abençoares".
Isaque estava já velho - tinha uns 135 anos de idade, e seus filhos, uns 75 - e estava cego, decerto com cataratas. Sem esperar a direção de Deus, e sem levar em conta o que Deus já lhe havia dito, julgando erradamente que estava para morrer (ele viveria mais 45 anos, até os 180), ele resolveu abençoar seu filho preferido, Esaú, fazendo-o seu herdeiro.
Como Isaque apreciava comer o produto da caça, ele pediu a Esaú que fosse caçar alguma coisa e a preparasse para ele comer, após o que ele lhe abençoaria.
Rebeca ouviu, e imediatamente contou a Jacó e ordenou que ele pegasse dois cabritos, que ela cozinharia para ele levar ao seu pai e receber a bênção ele próprio. Até aí, tudo bem.
Mas pela resposta de Jacó vemos que a intenção era de fazer Isaque, cego, pensar que Jacó era Esaú pois Isaque não pretendia abençoar Jacó nessa oportunidade. Jacó não parecia hesitar em enganar seu pai: o que o preocupava era a possibilidade de ser apanhado no ato.
Jacó lembrou sua mãe que ele era liso, enquanto Esaú era cabeludo, e seu pai poderia descobrir a diferença e amaldiçoá-lo pelo que estava fazendo. Rebeca, então resolveu o problema colocando peles de cabritos nas mãos e no pescoço de Jacó, e vestindo-o com a melhor roupa de Esaú. Rebeca assumiu toda a responsabilidade pela maldição se o logro fosse descoberto.
Feita a comida saborosa, Jacó se apresentou ao pai como sendo Esaú.
Isaque estava desconfiado: primeiro por causa da rapidez, mas Jacó explicou que o SENHOR, Deus de Isaque, havia mandado a caça ao seu encontro (outra mentira!); segundo, porque a voz era de Jacó, mas ao sentir a pele peluda (do cabrito) e o cheiro da roupa (de Esaú) ele se deixou convencer que era Esaú mesmo.
Depois de comer e beber, Isaque abençoou seu filho (sem mencionar seu nome, portanto valia para Jacó!), desejando que o SENHOR lhe desse prosperidade, ascendência sobre povos e nações bem como sobre seus irmãos, reverência dos filhos, maldição a quem o amaldiçoasse, e benção a quem o abençoasse. O teor era diferente da bênção que Deus lhe havia dado (capítulo 26:2-5, 24), tratando-se, portanto, de uma bênção própria de um fazendeiro riquíssimo e independente como ele era, para o seu herdeiro (à qual Jacó já havia obtido o direito por abdicação de Esaú).
Logo depois que Jacó saiu, chegou Esaú com a sua caça, que ele preparou (ninguém lhe disse nada) e levou para seu pai, pedindo-o para comer e abençoá-lo.
Isaque então descobriu que fora logrado, mas que nada podia fazer: não podia voltar atrás! Decerto percebeu que, sem querer, havia feito a coisa certa.
Esaú se sentiu defraudado do seu direito à bênção que seu pai queria lhe dar, e ficou muito amargurado. Apesar disso, ainda intercedeu com Isaque para que ele o abençoasse.
Parece que Isaque não havia pensado em reservar nada para Jacó, pois em sua bênção estava seu testamento, deixando para o herdeiro o senhorio sobre toda a família e propriedades. Jacó agora ficava com isso, e nada sobrava para Esaú. Mas Isaque amava muito a Esaú, e vendo-o chorar, abençoou-o da forma que ainda melhor podia: ele iria viver em lugares áridos, longe das terras férteis, vivendo da espada e servindo ao seu irmão; mas um dia livrar-se-ia dele.
Por causa disso, Esaú resolveu assassinar Jacó assim que Isaque morresse.
Rebeca descobriu o que Esaú pretendia fazer, chamou Jacó e mandou que ele saísse de casa e fosse até Harã ficar com seu irmão Labão por alguns dias, até que passasse o furor de Esaú. Ela então mandaria chamá-lo.
Para Isaque, ela justificou a saída de Jacó com o fato que ele precisava achar esposa para si, e não convinha que ele a procurasse entre os cananeus: ela já estava aborrecida com as duas esposas cananeias de Esaú, e não queria mais uma nora desse tipo!
Mediante essa tramóia, Jacó obteve a bênção desejada, mas algumas das conseqüências foram penosas para ele:
depois que ele partiu, nada mais lemos sobre Rebeca, a não ser que foi sepultada na caverna de Macpela (capítulo 49:31). Talvez eles não se encontraram mais.
Esaú enfureceu-se tanto que planejou matá-lo, obrigando-o a fugir de casa.
enganado pelo seu tio Labão, foi obrigado a trabalhar para ele por 20 anos.
seus filhos brigavam entre si.
Esaú deu origem a uma nação inimiga.
Jacó ficou no exílio por muitos anos.
1 E aconteceu que, como Isaque envelheceu, e os seus olhos se escureceram, de maneira que não podia ver, chamou a Esaú, seu filho mais velho, e disse-lhe: Meu filho! E ele lhe disse: Eis-me aqui!
2 E ele disse: Eis que já agora estou velho e não sei o dia da minha morte.
3 Agora, pois, toma as tuas armas, a tua aljava e o teu arco, e sai ao campo, e apanha para mim alguma caça,
4 e faze-me um guisado saboroso, como eu gosto, e traze-mo, para que eu coma, e para que minha alma te abençoe, antes que morra.
5 E Rebeca escutou quando Isaque falava ao seu filho Esaú; e foi-se Esaú ao campo, para apanhar caça que havia de trazer.
6 Então, falou Rebeca a Jacó, seu filho, dizendo: Eis que tenho ouvido o teu pai que falava com Esaú, teu irmão, dizendo:
7 Traze-me caça e faze-me um guisado saboroso, para que eu coma e te abençoe diante da face do SENHOR, antes da minha morte.
8 Agora, pois, filho meu, ouve a minha voz naquilo que eu te mando.
9 Vai, agora, ao rebanho e traze-me de lá dois bons cabritos; e eu farei deles um guisado saboroso para teu pai, como ele gosta;
10 e levá-lo-ás a teu pai, para que o coma e para que te abençoe antes da sua morte.
11 Então, disse Jacó a Rebeca, sua mãe: Eis que Esaú, meu irmão, é varão cabeludo, e eu, varão liso.
12 Porventura, me apalpará o meu pai, e serei, a seus olhos, enganador; assim, trarei eu sobre mim maldição e não bênção.
13 E disse-lhe sua mãe: Meu filho, sobre mim seja a tua maldição; somente obedece à minha voz, e vai, e traze-mos.
14 E foi, e tomou-os, e trouxe-os à sua mãe; e sua mãe fez um guisado saboroso, como seu pai gostava.
15 Depois, tomou Rebeca as vestes de gala de Esaú, seu filho mais velho, que tinha consigo em casa, e vestiu a Jacó, seu filho menor.
16 E, com as peles dos cabritos, cobriu as suas mãos e a lisura do seu pescoço
17 e deu o guisado saboroso e o pão que tinha preparado na mão de Jacó, seu filho.
18 E veio ele a seu pai e disse: Meu pai! E ele disse: Eis-me aqui. Quem és tu, meu filho?
19 E Jacó disse a seu pai: Eu sou Esaú, teu primogênito. Tenho feito como me disseste. Levanta-te agora, assenta-te e come da minha caça, para que a tua alma me abençoe.
20 Então, disse Isaque a seu filho: Como é isto, que tão cedo a achaste, filho meu? E ele disse: Porque o SENHOR, teu Deus, a mandou ao meu encontro.
21 E disse Isaque a Jacó: Chega-te agora, para que te apalpe, meu filho, se és meu filho Esaú mesmo ou não.
22 Então, se chegou Jacó a Isaque, seu pai, que o apalpou e disse: A voz é a voz de Jacó, porém as mãos são as mãos de Esaú.
23 E não o conheceu, porquanto as suas mãos estavam cabeludas, como as mãos de Esaú, seu irmão. E abençoou-o.
24 E disse: És tu meu filho Esaú mesmo? E ele disse: Eu sou.
25 Então, disse: Faze chegar isso perto de mim, para que coma da caça de meu filho; para que a minha alma te abençoe. E chegou-lho, e comeu; trouxe-lhe também vinho, e bebeu.
26 E disse-lhe Isaque, seu pai: Ora, chega-te e beija-me, filho meu.
27 E chegou-se e beijou-o. Então, cheirou o cheiro das suas vestes, e abençoou-o, e disse: Eis que o cheiro do meu filho é como o cheiro do campo, que o SENHOR abençoou.
28 Assim, pois, te dê Deus do orvalho dos céus, e das gorduras da terra, e abundância de trigo e de mosto.
29 Sirvam-te povos, e nações se encurvem a ti; sê senhor de teus irmãos, e os filhos da tua mãe se encurvem a ti; malditos sejam os que te amaldiçoarem, e benditos sejam os que te abençoarem.
30 E aconteceu que, acabando Isaque de abençoar a Jacó, apenas Jacó acabava de sair da face de Isaque, seu pai, veio Esaú, seu irmão, da sua caça.
31 E fez também ele um guisado saboroso, e trouxe-o a seu pai, e disse a seu pai: Levanta-te, meu pai, e come da caça de teu filho, para que me abençoe a tua alma.
32 E disse-lhe Isaque, seu pai: Quem és tu? E ele disse: Eu sou teu filho, o teu primogênito, Esaú.
33 Então, estremeceu Isaque de um estremecimento muito grande e disse: Quem, pois, é aquele que apanhou a caça e ma trouxe? Eu comi de tudo, antes que tu viesses, e abençoei-o; também será bendito.
34 Esaú, ouvindo as palavras de seu pai, bradou com grande e mui amargo brado e disse a seu pai: Abençoa-me também a mim, meu pai.
35 E ele disse: Veio o teu irmão com sutileza e tomou a tua bênção.
36 Então, disse ele: Não foi o seu nome justamente chamado Jacó? Por isso, que já duas vezes me enganou: a minha primogenitura me tomou e eis que agora me tomou a minha bênção. E disse mais: Não reservaste, pois, para mim bênção alguma?
37 Então, respondeu Isaque e disse a Esaú: Eis que o tenho posto por senhor sobre ti, e todos os seus irmãos lhe tenho dado por servos; e de trigo e de mosto o tenho fortalecido; que te farei, pois, agora a ti, meu filho?
38 E disse Esaú a seu pai: Tens uma só bênção, meu pai? Abençoa-me também a mim, meu pai. E levantou Esaú a sua voz e chorou.
39 Então, respondeu Isaque, seu pai, e disse-lhe: Eis que a tua habitação será longe das gorduras da terra e sem orvalho dos céus.
40 E pela tua espada viverás e ao teu irmão servirás. Acontecerá, porém, que, quando te libertares, então, sacudirás o seu jugo do teu pescoço.
41 E aborreceu Esaú a Jacó por causa daquela bênção, com que seu pai o tinha abençoado; e Esaú disse no seu coração: Chegar-se-ão os dias de luto de meu pai; então, matarei a Jacó, meu irmão.
42 E foram denunciadas a Rebeca estas palavras de Esaú, seu filho mais velho; e ela enviou, e chamou a Jacó, seu filho menor, e disse-lhe: Eis que Esaú, teu irmão, se consola a teu respeito, propondo-se matar-te.
43 Agora, pois, meu filho, ouve a minha voz: levanta-te e acolhe-te a Labão, meu irmão, em Harã;
44 e mora com ele alguns dias, até que passe o furor de teu irmão,
45 até que se desvie de ti a ira de teu irmão, e se esqueça do que lhe fizeste. Então, enviarei e te farei vir de lá. Por que seria eu desfilhada também de vós ambos num mesmo dia?
46 E disse Rebeca a Isaque: Enfadada estou da minha vida, por causa das filhas de Hete; se Jacó tomar mulher das filhas de Hete, como estas são das filhas desta terra, para que me será a vida?
Gênesis capítulo 27