Jó manifestou muitos pensamentos negativos e horríveis quando falou, sem dúvida por causa de seu grande sofrimento e decepção com as calamidades que vieram sobre ele, no entanto estão muito bem redigidos, adornados com figuras literárias .
Ele admitiu que fora temerário em seu discurso de abertura, mas que isso fora causado pelo peso excessivo da sua angústia e sofrimento, e pelo terror de Deus, porque o seu espírito estava sendo envenenado por Seus ataques e achava difícil dar-lhes explicação. Mas não estaria se lastimando se estivesse convencido que tudo isso era parte do curso normal da vida (como fora implícito nas palavras de Elifaz).
Assim, o conselho de Elifaz lhe era repulsivo, como comida insípida. Quando as pessoas passam por provações severas, o conselho mal informado é de mau gosto. Podem ouvir cortesmente, mas por dentro estão profundamente aborrecidos. Não devemos nos apressar em dar conselhos para aqueles que estão sofrendo, pois geralmente precisam de compaixão mais do que de conselhos .
Elifaz tinha errado completamente ao procurar compreender o problema de Jó. Mesmo que tenha dito muitas coisas sábias segundo o seu entender, não tinha ajudado Jó. É como se fôssemos citar versículos das Escrituras na esperança de dar uma resposta aos problemas de alguém, sem primeiro descobrir realmente o que são.
Jó declarou que queria desistir e morrer para ser liberado da sua dor. O seu único consolo era que não tinha contestado as palavras de Deus e que tinha sido fiel apesar de todas as calamidades por que passava. Mas sentia que não tinha mais força, ou esperança, ou perspectivas para continuar sofrendo com paciência.
Quando as coisas correm mal a nossa tendência, como a de Jó, é querer desistir e nos afastar de tudo. Confiar em Deus nos bons tempos é louvável, mas confiar n’Ele durante os tempos difíceis nos prova até nossos limites e exercita a nossa fé. Em nossas lutas, grandes ou pequenas, devemos confiar que Deus está no controle e que ele vai cuidar de nós (Romanos 8:28).
Os amigos de Jó, ou irmãos como lhes chama, deveriam ter -lhe mostrado simpatia até mesmo quando achavam que não parecia temer o Todo-Poderoso. Mas não recebeu qualquer consolo da parte deles. Como os riachos do deserto, que incham com o derretimento da neve e secam na estiagem, mostravam-se inconstantes e indignos de confiança.
Assim como as caravanas e os comerciantes ambulantes esperam ansiosamente encontrar os riachos, mas se decepcionam quando não encontram água neles, Jó tinha esperança de achar conforto na presença dos seus amigos. Mas eles não lhe trouxeram qualquer tipo de ajuda. Jó não exigia grande sacrifício deles, mas ao ver a sua situação terrível estavam com medo.
Jó continuou dizendo que estava disposto a aprender com eles se pudessem mostrar em que estava enganado. Sendo incapazes de diagnosticar a causa da sua aflição, estavam a criticá-lo com palavras honestas, mas dolorosas e argumentos que nada provavam.
Declarou a sua integridade apesar da implicação de que seria um pecador secreto, sugerida no discurso feito por Elifaz, e que haviam dado pouca importância ao que ele próprio havia dito em seu desespero. Como era homem íntegro, sabiam que nada diria que fosse mau ou maldoso.
Jó não tinha alívio para o seu sofrimento ou da sua dor. Estava muito doente, o que os seus amigos pareciam não levar em conta. Eles não tinham lhe oferecido qualquer ânimo. Até sua esposa, sua companheira, sugeriu que se suicidasse. Quando o seu mundo desabou, tornou-se num homem confuso e frustrado que merecia compaixão.
Jó então se dirigiu diretamente a Deus. Aparentemente sentiu que tinha uma doença incurável que acabaria por levá-lo à sepultura. Agora levava uma vida vazia, cheia de sofrimento, e anseiava pelo dia em que deixaria tudo, como um servo anseia descansar após um dia de trabalho duro.
Pediu a Deus que se lembrasse que sua vida era muito curta, como um sopro, e nela não restava mais alegria para ele. Os dias se sucediam, mais velozes do que a lançadeira do tecelão, e logo iria desaparecer da terra completamente na morte, como uma nuvem que some de vista. Perguntou a Deus porque, então, Ele dava tanta atenção a um ser humano insignificante, vigiando sobre ele, mesmo perturbando o conforto da sua cama com pesadelos que o atemorizavam, ao ponto de preferir ser estrangulado.
Com efeito, desejava morrer em paz. Queria que Deus o deixasse a sós. Sentia que estava sendo julgado, mas não tinha idéia do motivo. Muitas pessoas dizem como ele "Basta, deixe -me sozinho no meu sofrimento."
Perguntou a Deus se o homem pode ser tão importante ao ponto de ser necessário cuidar dele e examina-lo continuamente. Será que Deus nunca deixava de olhá-lo, nem o deixava sozinho por um instante? Somente uma pessoa muito magoada e decepcionada como Jó teria tão pouca consideração pela atenção de Deus. Ao dizer tal coisa, ele não considerou que Deus é amor, e que "a mão do nosso Deus é sobre todos os que O buscam, para o bem deles" (Esdras 8:22). Pode ter estado ciente disso antes do desastre, mas agora se ressentia do sofrimento por que passava, e pensou que seria melhor se Deus não tivesse estado com ele, no final das contas.
Jó não podia imaginar em que havia errado, e perguntou se, no caso de ter realmente pecado, o que havia feito a Deus para merecer ser alvejado assim? Porque ele próprio se tornara tão importante? Claramente sentia-se pequeno demais para merecer tanta atenção do grande Deus e que era inconcebível que pudesse ter se tornado muito pesado para Ele.
Continuando na suposição que tivesse pecado, porque Deus não perdoava a sua transgressão e tirava a sua iniquidade? Sabemos que cumpria com o seu dever de oferecer sacrifícios pelos possíveis pecados dos seus filhos, antes de morrerem, portanto é de se presumir que sabia que Deus era capaz de perdoar pecados ao se fazerem as ofertas adequadas pelo pecado. Então, por que Deus não o perdoava agora?
Coitado do Jó! Pensava que a ira de Deus fora derramada sobre si e não tinha idéia do motivo. Disse que logo morreria, deixaria de existir e Deus não o acharia mais. Estava totalmente confuso.
Jó capítulo 6:
1 Então Jó, respondendo, disse:
2 Oxalá de fato se pesasse a minhá mágoa, e juntamente na balança se pusesse a minha calamidade!
:3 Pois, na verdade, seria mais pesada do que a areia dos mares; por isso é que as minhas palavras têm sido temerárias.
4 Porque as flechas do Todo-Poderoso se cravaram em mim, e o meu espírito suga o veneno delas; os terrores de Deus se arregimentam contra mim.
5 Zurrará o asno montês quando tiver erva? Ou mugirá o boi junto ao seu pasto?:
6 Pode se comer sem sal o que é insípido? Ou há gosto na clara do ovo?
7 Nessas coisas a minha alma recusa tocar, pois são para mim qual comida repugnante.
8 Quem dera que se cumprisse o meu rogo, e que Deus me desse o que anelo!
9 que fosse do agrado de Deus esmagar-me; que soltasse a sua mão, e me exterminasse!
10 Isto ainda seria a minha consolação, e exultaria na dor que não me poupa; porque não tenho negado as palavras do Santo.
11 Qual é a minha força, para que eu espere? Ou qual é o meu fim, para que me porte com paciência?
12 É a minha força a força da pedra? Ou é de bronze a minha carne?
13 Na verdade não há em mim socorro nenhum. Não me desamparou todo o auxílio eficaz?
14 Ao que desfalece devia o amigo mostrar compaixão; mesmo ao que abandona o temor do Todo-Poderoso.
15 Meus irmãos houveram-se aleivosamente, como um ribeiro, como a torrente dos ribeiros que passam,
16 os quais se turvam com o gelo, e neles se esconde a neve;
17 no tempo do calor vão minguando; e quando o calor vem, desaparecem do seu lugar.
18 As caravanas se desviam do seu curso; sobem ao deserto, e perecem.
19 As caravanas de Tema olham; os viandantes de Sabá por eles esperam.
20 Ficam envergonhados por terem confiado; e, chegando ali, se confundem.
21 Agora, pois, tais vos tornastes para mim; vedes a minha calamidade e temeis.
22 Acaso disse eu: Dai-me um presente? Ou: Fazei-me uma oferta de vossos bens?
23 Ou: Livrai-me das mãos do adversário? Ou: Resgatai-me das mãos dos opressores ?
24 Ensinai-me, e eu me calarei; e fazei-me entender em que errei.
25 Quão poderosas são as palavras da boa razão! Mas que é o que a vossa argüição reprova?
26 Acaso pretendeis reprovar palavras, embora sejam as razões do desesperado como vento?
27 Até quereis lançar sortes sobre o órfão, e fazer mercadoria do vosso amigo.
28 Agora, pois, por favor, olhai para, mim; porque de certo à vossa face não mentirei.
29 Mudai de parecer, peço-vos, não haja injustiça; sim, mudai de parecer, que a minha causa é justa.
30 Há iniquidade na minha língua? Ou não poderia o meu paladar discernir coisas perversas?
Jó capítulo 7
1 Porventura não tem o homem duro serviço sobre a terra? E não são os seus dias como os do jornaleiro?
2 Como o escravo que suspira pela sombra, e como o jornaleiro que espera pela sua paga,
3 assim se me deram meses de escassez, e noites de aflição se me ordenaram.
4 Havendo-me deitado, digo: Quando me levantarei? Mas comprida é a noite, e farto-me de me revolver na cama até a alva.
5 A minha carne se tem vestido de vermes e de torrões de pó; a minha pele endurece, e torna a rebentar-se.
6 Os meus dias são mais velozes do que a lançadeira do tecelão, e chegam ao fim sem esperança.
7 Lembra-te de que a minha vida é um sopro; os meus olhos não tornarão a ver o bem.
8 Os olhos dos que agora me vêem não me verão mais; os teus olhos estarão sobre mim, mas não serei mais.
9 Tal como a nuvem se desfaz e some, aquele que desce à sepultura nunca tornará a subir.
10 Nunca mais tornará à sua casa, nem o seu lugar o conhecerá mais.
11 Por isso não reprimirei a minha boca; falarei na angústia do meu espírito, queixar-me-ei na amargura da minha alma.
12 Sou eu o mar, ou um monstro marinho, para que me ponhas uma guarda?
13 Quando digo: Confortar-me-á a minha cama, meu leito aliviará a minha queixa,
14 então me espantas com sonhos, e com visões me atemorizas;
15 de modo que eu escolheria antes a estrangulação, e a morte do que estes meus ossos.
16 A minha vida abomino; não quero viver para sempre; retira-te de mim, pois os meus dias são vaidade.
17 Que é o homem, para que tanto o engrandeças, e ponhas sobre ele o teu pensamento,
18 e cada manhã o visites, e cada momento o proves?
19 Até quando não apartarás de mim a tua vista, nem me largarás, até que eu possa engolir a minha saliva?
20 Se peco, que te faço a ti, ó vigia dos homens? Por que me fizeste alvo dos teus dardos? Por que a mim mesmo me tornei pesado?
21 Por que me não perdoas a minha transgressão, e não tiras a minha iniqüidade? Pois agora me deitarei no pó; tu me buscarás, porém eu não serei mais.