Este é o terceiro e último discurso de Elifaz de Jó. Quando primeiro falou a Jó (capítulos 4,5), havia elogiado as boas ações de Jó e gentilmente sugeriu que Jó pudesse precisar de se arrepender de algum pecado. Enquanto nada disse de novo neste discurso, ele se fez mais específico. Como não podia abalar a sua convicção de que o sofrimento é castigo de Deus para maldades, sugeriu então vários pecados possíveis que Jó poderia ter cometido. Elifaz não estava tentando destruir Jó; no final do seu discurso prometeu que Jó receberia a paz e a restauração se somente admitisse o seu pecado e se arrependesse.
Elifaz disse que a justiça e a perfeição do melhor homem do mundo não trazem qualquer benefício real ou vantagem para Deus, e portanto não se pode pensar que merecem qualquer coisa d’Ele. Um homem não pode tornar Deus seu devedor por causa da sua piedade, honestidade e obediência às suas leis, muito menos devido às suas boas obras. Aquele que é sábio pode ser proveitoso para si mesmo (Provérbios 09:12, Eclesiastes 10:10). A piedade é proveitosa para tudo (ver 1 Timóteo 4:8). Tal é a perfeição de Deus que ele não pode receber qualquer benefício ou vantagem decorrente da ação do homem.
Quando Deus nos restringe ou repreende, não é porque O colocamos em perigo ou tem ciúmes de nós. Satanás certamente sugeriu a Eva, que Deus proibiu que comesse com seu marido do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, temendo que se tornassem como deuses e se tornassem seus rivais; mas era uma insinuação ignóbil. Deus repreende o Seu povo nas ocasiões em que falham com Ele porque os ama, mas jamais repreende alguém pela razão de temer algo dele, não importa quão sério possa parecer aos nossos olhos.
Elifaz e seus companheiros tinham condenado Jó, de maneira geral, como se fosse um homem perverso e hipócrita por causa de seu sofrimento, pois pensavam que só poderia ser o resultado do pecado. Mas nenhum deles tinha entrado em pormenores, até que Elifaz o fez aqui.
Ele acusou Jó especificamente de muitos crimes e delitos graves; se fossem verdade, as severas tribulações por que passava poderiam ser assim justificáveis. Mas quando Elifaz acusou Jó tão injustamente, sem qualquer prova, estava lhe roubando do seu bom nome, que era mais precioso e valioso para Jó do que a riqueza da qual fora despojado.
É contra todas as leis da justiça, caridade e amizade, levantar ou espalhar calúnias e más conjecturas sobre os outros; pior ainda, se forem contra quem está em angústia e assim aumentar o seu sofrimento.
Elifaz não podia apresentar qualquer prova da culpa de Jó, mas parecia determinado a ousadamente proferir calúnias contra ele, e sem dúvida alguns iriam acreditar no que dizia. A inocência por si só não protege contra as línguas falsas e sujas. Jó, a quem o próprio Deus havia louvado como sendo o melhor homem do mundo, foi aqui acusado de ser um dos maiores malfeitores na terra por um de seus amigos, considerado um homem sábio. Portanto, não vamos achar estranho se a qualquer momento o nosso caráter, também, venha a ser denigrido de alguma forma assim, mas sigamos o exemplo de Jó e aprendamos a deixar para trás todas essas falsas acusações e a confiar a nossa causa a Quem nos conhece completamente e julga com justiça entre nós.
Elifaz acusou Jó de pensar que Deus estava muito distante e de, por isso, não tomar conhecimento do que se passava na terra. Realmente muita gente pensa assim, e procuram intermediários para se aproximarem d’Ele em seu nome. Mas isso certamente não se aplicava a Jó, embora tivesse dito que gostaria de defender sua causa diante de Deus, ou de ter alguém para fazer mediação entre ele e Deus.
Depois de inferir que Jó estava indo no mesmo caminho que aqueles que morreram no dilúvio por causa da sua maldade, Elifaz deu um belo resumo do arrependimento. Acertou em dizer que devemos pedir perdão a Deus quando pecamos, mas essa afirmação não se aplicava a Jó, que já havia pedido perdão a Deus (Jó 7:20, 21; 9:20; 13:23) e vivia em estreito contato com Ele o tempo todo.
Jó agora não se queixava mais aos seus amigos, mas continuou na linha de pensamento de Elifaz, e declarou que desejava saber onde poderia encontrar Deus. Se tivesse a oportunidade de defender seu caso diante d’Ele, tinha certeza que Deus não iria esmagá-lo com Seu poder, mas ouvir um homem justo como ele e livrá-lo. Este desejo era prova de que ele não era um hipócrita.
Paulo descansava no fato de que um dia ele seria julgado pelo Senhor, portanto não estava preocupado com o julgamento dos homens (1 Coríntios 4:3, 4). Estava disposto a esperar até que chegasse a hora. Jó estava impaciente e queria ser julgado logo para ser aliviado do sofrimento. Tiago achou necessário exortar os cristãos que sofriam a ser pacientes, até a vinda do Senhor (Tiago 5:7-9 ).
Jó explicou que, embora não pudesse ver Deus, por mais que O procurasse, Deus certamente sabia tudo sobre ele e, quando fosse julgado, sairia puro como o ouro. Como estava certo: se apenas pudesse saber agora que estava sendo julgado para provar este fato! Estava chegando perto.
Jó estava convencido que havia sido fiel a Deus toda a sua vida, seguindo os Seus caminhos, obedecendo os Seus mandamentos, e preferindo a palavra de Deus aos seus próprios desejos. Verdade, assim como Deus havia dito a Satanás.
Provavelmente não temos sido tão justos como Jó em nossas vidas, mas se somos crentes verdadeiros, sabemos que todos os nossos pecados estão perdoados porque Cristo os levou na cruz em nosso lugar (Romanos 5:1 , Romanos 8:1). Podemos, como Jó, opor-nos às acusações dos outros porque estamos justificados, feitos justos, e nunca seremos condenados.
Deus é absolutamente soberano e a Sua vontade é tão perfeitamente pura e justa que Ele não tem motivo para alterá-la a qualquer tempo. “Tudo o que o Senhor deseja, Ele o faz” (Salmo 135:6), e sempre fará, pois é sempre o melhor. O medo de Jó foi que Deus estaria contente em fazê-lo sofrer, em vez de deixá-lo morrer em paz, e ele não seria capaz de mudar a Sua mente.
Jó estava agora na defensiva. Porque eram os caminhos de Deus tão difíceis de entender? Outras pessoas que eram abertamente más não eram punidas.
Ele listou os seus pecados: alguns eram desonestos, e se aproveitavam das outras pessoas, mesmo daquelas que estavam em necessidade; outros cometiam homicídio, roubo, adultério; no entanto era permitido a todo esse grupo de malfeitores baixar em paz para o túmulo, assim como todos os outros.
Não só isso, mas parecia que estavam imunes à justiça nesta vida. Iam muito bem e até parecia que estavam sendo favorecidos, enquanto ele estava doente e na miséria.
Os amigos de Jó não o tinham ajudado. Ao contrário, deram -lhe mais um motivo para reclamar. Por que Deus permitia que isto acontecesse com ele? É a mesma pergunta que vem à mente de muita gente. E ainda Jó tinha uma grande fé em Deus, apesar do limitado conhecimento que tinha d’Ele em comparação com o que agora sabemos.
Jó capítulo 22
1 Então respondeu Elifaz, o temanita:
2 Pode o homem ser de algum proveito a Deus? Antes a si mesmo é que o prudenté será proveitoso.
3 Tem o Todo-Poderoso prazer em que tu sejas justo, ou lucro em que tu faças perfeitos os teus caminhos?
4 É por causa da tua reverência que te repreende, ou que entra contigo em juízo?
5 Não é grande a tua malícia, e sem termo as tuas iniqüidades?
6 Pois sem causa tomaste penhôres a teus irmaos e aos nus despojaste dos vestidos.
7 Não deste ao cansado água a beber, e ao faminto retiveste o pão.
8 Mas ao poderoso pertencia a terra, e o homem acatado habitava nela.
9 Despediste vazias as viúvas, e os braços dos órfãos foram quebrados.
10 Por isso é que estás cercado de laços, e te perturba um pavor repentino,
11 ou trevas de modo que nada podes ver, e a inundação de águas te cobre.
12 Não está Deus na altura do céu? Olha para as mais altas estrelas, quão elevadas estão!
13 E dizes: Que sabe Deus? Pode ele julgar através da escuridão?
14 Grossas nuvens o encobrem, de modo que não pode ver; e ele passeia em volta da abóbada do céu.
15 Queres seguir a vereda antiga, que pisaram os homens iníquos?
16 Os quais foram arrebatados antes do seu tempo; e o seu fundamento se derramou qual um rio.
17 Diziam a Deus: retira-te de nós; e ainda: Que é que o Todo-Poderoso nos pode fazer?
18 Contudo ele encheu de bens as suas casas. Mas longe de mim estejam os conselhos dos ímpios!
19 Os justos o vêem, e se alegram: e os inocentes escarnecem deles,
20 dizendo: Na verdade são exterminados os nossos adversários, e o fogo consumiu o que deixaram.
21 Apega-te, pois, a Deus, e tem paz, e assim te sobrevirá o bem.
22 Aceita, peço-te, a lei da sua boca, e põe as suas palavras no teu coração.
23 Se te voltares para o Todo-Poderoso, serás edificado; se lançares a iniqüidade longe da tua tenda,
24 e deitares o teu tesouro no pó, e o ouro de Ofir entre as pedras dos ribeiros,
25 então o Todo-Poderoso será o teu tesouro, e a tua prata preciosa.
26 Pois então te deleitarás no Todo-Poderoso, e levantarás o teu rosto para Deus.
27 Tu orarás a ele, e ele te ouvirá; e pagarás os teus votos.
28 Também determinarás algum negócio, e ser-te-á firme, e a luz brilhará em teus caminhos.
29 Quando te abaterem, dirás: haja exaltação! E Deus salvará ao humilde.
30 E livrará até o que não é inocente, que será libertado pela pureza de tuas mãos.
Jó capítulo 23
1 Então Jó respondeu:
2 Ainda hoje a minha queixa está em amargura; o peso da mão dele é maior do que o meu gemido.
3 Ah, se eu soubesse onde encontrá-lo, e pudesse chegar ao seu tribunal!
4 Exporia ante ele a minha causa, e encheria a minha boca de argumentos.
5 Saberia as palavras com que ele me respondesse, e entenderia o que me dissesse.
6 Acaso contenderia ele comigo segundo a grandeza do seu poder? Não; antes ele me daria ouvidos.
7 Ali o reto pleitearia com ele, e eu seria absolvido para sempre por meu Juiz.
8 Eis que vou adiante, mas não está ali; volto para trás, e não o percebo;
9 procuro-o à esquerda, onde ele opera, mas não o vejo; viro-me para a direita, e não o diviso.
10 Mas ele sabe o caminho por que eu ando; provando-me ele, sairei como o ouro.
11 Os meus pés se mantiveram nas suas pisadas; guardei o seu caminho, e não me desviei dele.
12 Nunca me apartei do preceito dos seus lábios, e escondi no meu peito as palavras da sua boca.
13 Mas ele está resolvido; quem então pode desviá-lo? E o que ele quiser, isso fará.
14 Pois cumprirá o que está ordenado a meu respeito, e muitas coisas como estas ainda tem consigo.
15 Por isso me perturbo diante dele; e quando considero, tenho medo dele.
16 Deus macerou o meu coração; o Todo-Poderoso me perturbou.
17 Pois não estou desfalecido por causa das trevas, nem porque a escuridão cobre o meu rosto.
Jó capítulo 24
Job 24:não designa tempos? e por que os que o conhecem não vêem os seus dias?
2 Há os que removem os limites; roubam os rebanhos, e os apascentam.
3 Levam o jumento do órfão, tomam em penhor o boi da viúva.
4 Desviam do caminho os necessitados; e os oprimidos da terra juntos se escondem.
5 Eis que, como jumentos monteses no deserto, saem eles ao seu trabalho, procurando no ermo a presa que lhes sirva de sustento para seus filhos.
6 No campo segam o seu pasto, e vindimam a vinha do ímpio.
7 Passam a noite nus, sem roupa, não tendo coberta contra o frio.
8 Pelas chuvas das montanhas são molhados e, por falta de abrigo, abraçam-se com as rochas.
9 Há os que arrancam do peito o órfão, e tomam o penhor do pobre;
10 fazem que estes andem nus, sem roupa, e, embora famintos, carreguem os molhos.
11 Espremem o azeite dentro dos muros daqueles homens; pisam os seus lagares, e ainda têm sede.
12 Dentro das cidades gemem os moribundos, e a alma dos feridos clama; e contudo Deus não considera o seu clamor.
13 Há os que se revoltam contra a luz; não conhecem os caminhos dela, e não permanecem nas suas veredas.
14 O homicida se levanta de madrugada, mata o pobre e o necessitado, e de noite torna-se ladrão.
15 Também os olhos do adúltero aguardam o crepúsculo, dizendo: Ninguém me verá; e disfarça o rosto.
16 Nas trevas minam as casas; de dia se conservam encerrados; não conhecem a luz.
17 Pois para eles a profunda escuridão é a sua manhã; porque são amigos das trevas espessas.
18 São levados ligeiramente sobre a face das águas; maldita é a sua porção sobre a terra; não tornam pelo caminho das vinhas.
19 A sequidão e o calor desfazem as águas da neve; assim faz o Seol aos que pecaram.
20 A madre se esquecerá dele; os vermes o comerão gostosamente; não será mais lembrado; e a iniqüidade se quebrará como árvore.
21 Ele despoja a estéril que não dá à luz, e não faz bem à viúva.
22 Todavia Deus prolonga a vida dos valentes com a sua força; levantam-se quando haviam desesperado da vida.
23 Se ele lhes dá descanso, estribam-se, nisso; e os seus olhos estão sobre os caminhos deles.
24 Eles se exaltam, mas logo desaparecem; são abatidos, colhidos como os demais, e cortados como as espigas do trigo.
25 Se não é assim, quem me desmentirá e desfará as minhas palavras?