O castigo por permanecer no pecado voluntariamente é a “expectação terrível de juízo, e um ardor de fogo que há de devorar os adversários” (v.26).
No Velho Testamento não havia sacrifícios possíveis para alguns pecados, como adultério, assassínio e blasfêmia, e os culpados tinham que sofrer a pena de morte física. Mas esta advertência é concernente à continuidade consciente e deliberada na prática do pecado, não de um pecado isolado.
No versículo 26 a apostasia é definida como pecar deliberadamente depois de ter recebido o conhecimento da verdade. Como Judas, alguém ouve o Evangelho e sabe o caminho da salvação; finge recebê-lo, mas mais tarde deliberadamente rejeita decisiva e conclusivamente o sacrifício definitivo de Cristo. Neste caso, Deus não tem qualquer outra maneira de salvação para oferecer-lhe. A apostasia é um pecado irremediável (é de se notar que, embora o autor esteja usando a primeira pessoa no plural nesta passagem, isto não significa que ele se inclui entre os apóstatas: ao contrário vemos que ele declara definitivamente não ser um deles no versículo 39).
No caso dos hebreus é citada especialmente aqui a apostasia daqueles que deliberadamente deixarem a congregação dos crentes em Cristo, voltarem ao judaísmo, e continuarem nele intencional e permanentemente. Estes teriam como castigo morte física (v. 28-29), morte na destruição de Jerusalém em 70 d.C. (v. 25 e 27) e perda das recompensas no tribunal de Cristo (v. 35-36). Semelhantemente, o crente de hoje que peca voluntária e continuadamente também está sujeito à disciplina nesta vida e à perda das recompensas no tribunal de Cristo. Mas não perde a sua salvação.
Os versículos seguintes demonstram a enormidade do pecado de apostasia, e sua consequente punição. Ao apóstata não resta qualquer esperança de escapar ao julgamento, e é impossível renová-lo ao arrependimento (capítulo 6:4-6), pois consciente e deliberadamente ele se cortou da graça de Deus em Cristo. Seu destino é uma ardente indignação que vai devorar os adversários de Deus, entre os quais eles estão incluídos (indicando uma positiva oposição a Cristo, não uma suave neutralidade).
A sua seriedade é comparada com a punição exigida pela lei de Moisés aos idólatras: deviam ser mortos sem piedade quando sua culpa era provada por duas ou três testemunhas (Deuteronômio 17:2-6). Quanto maior será o castigo de que será merecedor quem “pisar o Filho de Deus, e tiver por profano o sangue do pacto, com que foi santificado, e ultrajar ao Espírito da graça”? Explicando:
“Pisou o Filho de Deus”: Depois de professar ser um seguidor de Cristo, ele agora descaradamente afirma que não quer mais nada a ver com Ele, nega qualquer necessidade de ter Cristo como Salvador e definitivamente O rejeita como Senhor.
“Teve por profano o sangue do pacto, com que foi santificado”: Ele havia se unido aos crentes e foi “santificado” com essa associação (assim como um marido descrente é “santificado” pela esposa crente - 1 Coríntios 7:14, ou seja, ele recebe uma influência positiva que traz a possibilidade de conversão verdadeira). Mas não recebeu Jesus Cristo como seu Senhor e Salvador, e portanto não foi salvo mas profanou o sangue de Cristo.
“Ultrajou ao Espírito da graça”: O Espírito de Deus lhe havia iluminado sobre o Evangelho da graça, condenando o seu pecado e apresentando a salvação mediante a fé em Cristo. Mas ele tinha ultrajado o gracioso Espírito ao desprezá-lo e rejeitar a salvação que Ele ofereceu.
O povo de Israel conhecia já muito bem a justiça de Deus, tendo testemunhado o castigo que viera sobre os seus inimigos e também experimentado o Seu castigo sobre eles próprios através dos tempos em que haviam se afastado dos Seus estatutos, e mesmo negado a Sua soberania. As palavras “minha é a vingança e a recompensa”, ditas por Deus, foram escritas por Moisés pouco antes da sua morte, e representam a Sua justiça absoluta, como Juiz supremo sobre o Universo. Portanto “vingança” aqui significa justiça absoluta, castigando ou premiando conforme o merecimento do réu.
Considerando a magnitude dos atributos de Deus, é bem compreensível a expressão “Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo”. Ele é um Deus de amor, certo, mas também é perfeitamente justo, e o temor de Deus é o princípio da sabedoria, como declarou Jó: “E (Deus) disse ao homem: Eis que o temor do Senhor é a sabedoria, e o apartar-se do mal é o entendimento.”(Jó 28:28).
Nada nesta passagem das Escrituras deve perturbar ou abalar os que verdadeiramente pertencem a Cristo. A passagem foi propositadamente escrita em estilo agudo, investigador e desafiante, para que todos aqueles que professam o nome de Cristo sejam alertados sobre as terríveis consequências da apostasia.
26 Porque se voluntariamente continuarmos no pecado, depois de termos recebido o pleno conhecimento da verdade, já não resta mais sacrifício pelos pecados,
27 mas uma expectação terrível de juízo, e um ardor de fogo que há de devorar os adversários.
28 Havendo alguém rejeitado a lei de Moisés, morre sem misericórdia, pela palavra de duas ou três testemunhas;
29 de quanto maior castigo cuidais vós será julgado merecedor aquele que pisar o Filho de Deus, e tiver por profano o sangue do pacto, com que foi santificado, e ultrajar ao Espírito da graça?
30 Pois conhecemos aquele que disse: Minha é a vingança, eu retribuirei. E outra vez: O Senhor julgará o seu povo.
31 Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo.
Hebreus, capítulo 10, versículos 26 a 31