O livro de Hebreus difere das demais epístolas por se basear num profundo conhecimento do Velho Testamento, assim pressupondo que o leitor já está familiarizado com as escrituras hebraicas. Ele exalta Jesus Cristo como Salvador do mundo, em contraste com a insuficiência dos superados sacrifícios animais. Não obstante o seu título, o livro é dirigido igualmente a israelitas e gentios, enfatizando a suficiência total da expiação de Cristo pelos seus pecados.
A data exata em que o livro foi escrito não pode ser afirmada com certeza, mas em seu conteúdo há provas suficientes para justificar que foi entre os anos 60 e 69 da era cristã.
Embora seus destinatários originais conhecessem o autor (13:18) e ele também fosse conhecido por Timóteo a quem ele se refere no fim do livro (13:23), sua identidade não consta do livro nem de outros documentos preservados daquela época. Segundo os filólogos ele demonstra excelente domínio da língua grega que prevalecia no primeiro século depois de Cristo, sendo seu vocabulário indiscutivelmente mais vasto do que o de qualquer outro autor do Novo Testamento, com exceção talvez de Lucas.
O autor era inquestionavelmente israelita, pois sua familiaridade com o ritual, costumes, tradição e interesses israelitas, e sua mestria das escrituras em hebraico o provam conclusivamente. O fato que as citações do Velho Testamento por ele feitas foram extraídas exclusivamente da Septuaginta, a tradução grega do século II a.c. , sugere que ele foi um helenista nascido fora da terra de Israel, na diáspora israelita dentro do Império Romano, assim como foram Paulo, Barnabé e Apolo.
Além disto, ele era mestre do estilo retórico de comunicação comum no ambiente greco-romano do primeiro século. Seus argumentos utilizam as três provas aristotelianas de persuasão: ethos (recurso com base na reputação e caráter de quem fala, mas neste caso de Jesus, em quem o livro focaliza), pathos (recurso baseado nas emoções, paixões e interesse dos beneficiários) e logos (um apelo à razão e ao intelecto). Infelizmente, alguma de sua glória estilística é perdida na tradução para nossa língua: não se percebe o seu uso da aliteração, assonância, ironia e crítica, a repetição especial de palavras ao longo de sucessivas sentenças, nem a adição e subtração de conjunções para maior efeito.
Esta combinação de profundo entendimento bíblico, fluência linguística grega e poderosa técnica retórica, encharcados com a inspiração do espírito de Deus, criou a perfeita combinação para o nascimento de uma mensagem sempre atual para os olhos e ouvidos da igreja de Cristo ao longo dos tempos. A autoria de Hebreus tem sido atribuída ao apóstolo Paulo, mais do que a qualquer outra pessoa conhecida no Novo Testamento, desde os primeiros comentaristas, e a antiguidade desta tradição é o maior argumento a favor desse grande apóstolo.
No entanto, existem diferenças específicas entre Hebreus e as cartas que Paulo escreveu, por exemplo: começa cada carta dando o seu nome, assina todas ao terminar, elas contêm testemunhos pessoais, reivindicam sua autoridade apostólica e revelam as emoções vibrantes de Paulo; nenhum dos seus temas preferidos como a justificação pela fé, a distinção entre judeus e gentios, a liberdade dos salvos ou a ressurreição dos crentes, são mencionados em Hebreus. Por outro lado, os grandes temas deste livro, como o dia da expiação, o sumo sacerdócio de Jesus Cristo, e os rituais de Levítico não são abordados nas cartas de Paulo.
Por estas razões, não há certeza absoluta que Paulo tenha sido o autor. Lucas, Barnabé e muitos outros já têm sido considerados, mas nenhum deles cabe melhor que Paulo. Portanto, achamos aconselhável simplesmente aceitar o fato que o autor deve permanecer anônimo, assim como recebemos o livro. Muito mais importante é saber que o livro só pode ter sido inspirado pelo Espírito Santo, como todos os outros livros da Bíblia.
Os primeiros destinatários do livro também não são especificados, mas o autor revela algumas circunstâncias indicativas da sua identidade:
Vieram à fé em Cristo através do testemunho pessoal dos apóstolos, e de outras pessoas que O tinham visto e ouvido pessoalmente (2:3).
Sofriam uma variedade de perseguições por causa da sua fé. Embora estas ainda não chegassem ao martírio (12:4), incluiam a difamação pública, abuso, prisão e confisco de bens pessoais (10:32-35). O martírio já era previsto (13:12-14).
Eram crentes sinceros que haviam deixado um grupo em uma determinada cidade (10:25, 13:17,24) que continha descrentes e apóstatas, e por inferência formaram uma igreja menor, composta apenas de verdadeiros crentes identificados pelas suas obras e amor para com o nome de Cristo (6:9 a 11).
O autor estava possivelmente na Itália mas tinha um relacionamento especial e estivera com eles, expressando no livro a sua esperança de lhes ser restituído (13:19). Além disso, declarou seu interesse na liberação de seu colega Timóteo (13:23).
Entre os principais grupos a quem o livro poderia ser escrito originalmente (gentios cristãos, judeus cristãos, uma igreja contendo judeus e gentios cristãos), o teor do livro e essas circunstâncias parecem apontar para um grupo de judeus cristãos. Esse grupo pode ser ainda mais precisamente identificado como sendo de helenistas.
Os helenistas viviam na dispersão, fora da Judéia, em comunidades espalhadas por todo o Império Romano (Atos 2:9-11). Mantendo seus distintivos israelitas, estavam imersos na cultura greco-romana, da qual faziam parte. Falavam grego até mesmo em suas sinagogas, em contraste com as sinagogas convencionais da Judéia que conduzia seus cultos em hebraico. Com efeito, tal era a influência generalizada da cultura circundante que muitos dos helenistas já mal podiam falar hebraico, língua original dos israelitas ou aramaico, o vernáculo comum na Judéia. Por conseguinte, a versão das Escrituras em hebraico (o Velho Testamento), usada pelos helenistas, era uma tradução para o grego, a Septuaginta, compilada no segundo século a.c. em Alexandria (cidade egípcia), considerada o centro helenístico da dispersão (diáspora). O uso exclusivo da Septuaginta em Hebreus nos permite concluir, com alguma segurança, que o livro aos Hebreus foi destinado originalmente a uma ou mais congregações de helenistas cristãos.
Assumindo que Hebreus foi escrito por Paulo ou alguém do seu círculo, vários estudiosos entendem que foi destinado a ser lido em Roma, Jerusalém ou outra cidade da Judeia capaz de reunir maiores assembleias de crentes, mas outros sugerem alguma cidade onde haveria maior congregação de helenistas. Ainda outros comentaristas consideram que se destinava aos crentes em todos os lugares que os autores tinham visitado.
Afinal, vemos a realidade: este livro se identifica com todos os outros livros e cartas escritos sob a inspiração do Espírito Santo como parte do “fundamento dos apóstolos e dos profetas” (Efésios 2:20), e assim o encontramos na Bíblia, a Palavra de Deus, para ser lido, compreendido e observado por todos os que se salvam mediante a fé em Jesus Cristo, nosso Salvador.