Para demonstrar que o sacerdócio segundo a ordem de Melquisedeque é superior ao levítico (dos levitas, descendentes de Arão) são apresentados três argumentos:
1. O argumento sobre o dízimo e a bênção (v. 4 a 10).
Este argumento começa por considerar a grandeza de Melquisedeque: o patriarca Abraão deu-lhe um décimo dos despojos da batalha! Sendo o “pai” Abraão um dos maiores personagens na história da nação de Israel, ao dar o dízimo e os melhores dos seus despojos a Melquisedeque, manifestou que este era ainda maior do que ele próprio.
Esta conclusão é tirada ao observar como se fazia o pagamento dos dízimos pelo povo de Israel segundo a lei: embora todo o povo fosse igualmente descendente de Abraão, aos levitas foi concedido o direito de cobrarem o dízimo da renda do resto do povo e os sacerdotes tinham ainda o direito de cobrarem o dízimo dos seus colegas, os levitas (o dízimo dos dízimos). Daí vem a conclusão que quem recebe o dízimo é maior do que quem o dá.
Melquisedeque não somente recebeu o dízimo de Abraão, mas também demonstrou sua superioridade de posição, abençoando-o com as palavras: “bendito seja Abrão pelo Deus Altíssimo, o Criador dos céus e da terra!” (Gênesis 14:19,20). O menor é abençoado pelo maior.
No sacerdócio levítico os dízimos eram recebidos por homens mortais. Havia uma constante sucessão de sacerdotes, cada um servindo sua própria geração. No caso de Melquisedeque não existe menção da sua morte, portanto ele pode representar um único sacerdócio perpétuo.
Ao receber dízimos de Abraão, Melquisedeque virtualmente os recebeu de Levi, pois Abraão agiu como um representante de toda a sua descendência e Levi foi seu bisneto. Sendo Levi titular da tribo sacerdotal que levou seu nome, podemos dizer que o sacerdócio levítico pagou dízimos a Melquisedeque e, portanto, reconheceu a sua superioridade.
2. O argumento sobre a substituição do sacerdócio levítico (v. 11 a 22).
O sacerdócio levítico, que deu a lei ao povo, não conduzia à perfeição, pois “é impossível que o sangue de touros e de bodes tire pecados” (capítulo 10:4). Era necessário que fosse substituído um sacerdócio que levasse à perfeição, e este é o sacerdócio de Cristo. Ele é o “sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque” (Salmo 110:4), uma profecia que veio desde a antiguidade e foi cumprida na pessoa de Jesus Cristo.
A substituição do sacerdócio traz consigo a substituição de toda a estrutura jurídica em que se baseava aquele sacerdócio. Esta é uma informação radical para todos os que são salvos pela sua fé em Cristo. A velha ordem do sistema sacerdotal levítico, que é a do Velho Testamento, passou e uma nova ordem, perfeita e eterna, tomou o seu lugar, segundo a ordem de Melquisedeque. O novo Sumo Sacerdote desta ordem não pertence à tribo de Levi, mas sim à tribo de Judá, da qual ninguém havia sequer servido ao altar, pois era proibido segundo a lei levítica. O Senhor Jesus também se assemelha a Melquisedeque na eternidade da sua posição, pois vive para sempre.
A lei que instalou o sacerdócio levítico foi anulada “por causa da sua fraqueza e inutilidade” mediante o advento de Jesus Cristo. Embora provinda de Deus, ela apenas preparava o caminho para a vinda do sacerdócio ideal de Deus. Era fraca e inútil porque não resultava na perfeição de qualquer ser humano. Ninguém podia entrar na presença de Deus no lugar santíssimo, salvo o sumo sacerdote uma vez por ano para trazer um sangue simbólico para apagar o seu próprio pecado e o do povo. Esse sangue simbolizava o sangue próprio que seria, e já foi para nós, derramado pelo Senhor Jesus Cristo, nosso Sumo Sacerdote. Ao invés da lei “temos agora uma melhor esperança, pela qual nos aproximamos de Deus”. Essa “melhor esperança” é o Senhor Jesus mesmo; aqueles que O têm como sua única esperança têm perfeito acesso a Deus a qualquer momento.
Não só houve uma mudança na ordem de sacerdócio e na lei do sacerdócio, mas também, como veremos agora, houve uma mudança no método de indução. O raciocínio aqui gira em torno do uso do juramento de Deus com referência ao sacerdócio de Cristo. O juramento significa a introdução daquilo que é eterno e imutável e nada menos do que o juramento do Deus todo-poderoso garante a eficácia e a eternidade do sacerdócio de nosso Senhor Jesus Cristo. No sacerdócio levítico os sacerdotes foram nomeados sem um juramento. Por conseguinte, a implicação é que seu sacerdócio foi destinado a ser provisório e não duradouro. Mas Deus dirigiu-se a Cristo com um juramento ao designa-lo Sacerdote para sempre segundo a ordem de Melquisedeque (Salmo 110:4).
Segue-se que Jesus Cristo é a garantia de uma melhor aliança. O sacerdócio levítico fazia parte do Velho Testamento (pacto). O sacerdócio de Cristo se relaciona com o Novo Testamento. O pacto e o sacerdócio ficam de pé ou caem juntos. A nova aliança é um acordo incondicional da graça que Deus fará com a casa de Israel e com a casa de Judá, quando o Senhor Jesus estabelecer o Seu reino na terra (Jeremias 13:33-34). Os crentes hoje desfrutam de algumas das bênçãos da nova aliança, mas seu cumprimento completo não se realizará enquanto Israel não for restaurado e redimido nacionalmente. O Senhor Jesus é o fiador da nova aliança no sentido em que Ele próprio é a garantia. Com Sua morte, sepultamento e ressurreição, Ele forneceu uma base justa na qual Deus pode cumprir os termos do pacto. Seu sacerdócio infinito está relacionado vitalmente com o indefectível cumprimento dos termos do pacto.
3. O argumento sobre a superioridade do sacerdócio de Melquisedeque (v.23 a 25).
Os sacerdotes de Israel foram muitos. O erudito historiador Flávio Josefo registra que, nos quinze séculos que se seguiram desde a inauguração do sacerdócio Levítico até a destruição do segundo templo, Israel foi servido por oitenta e três sumos sacerdotes diferentes. Houve ainda um número bem maior de sacerdotes que serviam debaixo da sua autoridade. O ofício periodicamente mudava de mãos por causa da morte dos titulares. O seu ministério sofria interrupções inevitáveis.
Mas não há solução de continuidade no sacerdócio de Cristo, segundo a ordem de Melquisedeque, porque Ele vive para sempre. Seu sacerdócio nunca é transferido para outra pessoa, e não há nenhuma interrupção à sua eficácia. Ele é inviolável, intransferível, e, portanto, totalmente permanente.
4 Considerai, pois, quão grande era este, a quem até o patriarca Abraão deu o dízimo dentre os melhores despojos.
5 E os que dentre os filhos de Levi recebem o sacerdócio têm ordem, segundo a lei, de tomar os dízimos do povo, isto é, de seus irmãos, ainda que estes também tenham saído dos lombos de Abraão;
6 mas aquele cuja genealogia não é contada entre eles, tomou dízimos de Abraão, e abençoou ao que tinha as promessas.
7 Ora, sem contradição alguma, o menor é abençoado pelo maior.
8 E aqui certamente recebem dízimos homens que morrem; ali, porém, os recebe aquele de quem se testifica que vive.
9 E, por assim dizer, por meio de Abraão, até Levi, que recebe dízimos, pagou dízimos,
10 porquanto ele estava ainda nos lombos de seu pai quando Melquisedeque saiu ao encontro deste.
11 De sorte que, se a perfeição fosse pelo sacerdócio levítico (pois sob este o povo recebeu a lei), que necessidade havia ainda de que outro sacerdote se levantasse, segundo a ordem de Melquisedeque, e que não fosse contado segundo a ordem de Arão?
12 Pois, mudando-se o sacerdócio, necessariamente se faz também mudança da lei.
13 Porque aquele, de quem estas coisas se dizem, pertence a outra tribo, da qual ninguém ainda serviu ao altar,
14 visto ser manifesto que nosso Senhor procedeu de Judá, tribo da qual Moisés nada falou acerca de sacerdotes.
15 E ainda muito mais manifesto é isto, se à semelhança de Melquisedeque se levanta outro sacerdote,
16 que não foi feito conforme a lei de um mandamento carnal, mas segundo o poder duma vida indissolúvel.
17 Porque dele assim se testifica: Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque.
18 Pois, com efeito, o mandamento anterior é ab-rogado por causa da sua fraqueza e inutilidade
19 (pois a lei nenhuma coisa aperfeiçoou), e desta sorte é introduzida uma melhor esperança, pela qual nos aproximamos de Deus.
20 E visto como não foi sem prestar juramento (porque, na verdade, aqueles, sem juramento, foram feitos sacerdotes,
21 mas este com juramento daquele que lhe disse: Jurou o Senhor, e não se arrependerá: Tu és sacerdote para sempre),
22 de tanto melhor pacto Jesus foi feito fiador.
23 E, na verdade, aqueles foram feitos sacerdotes em grande número, porque pela morte foram impedidos de permanecer,
24 mas este, porque permanece para sempre, tem o seu sacerdócio perpétuo.
25 Portanto, pode também salvar perfeitamente os que por ele se chegam a Deus, porquanto vive sempre para interceder por eles.
Hebreus capítulo 7 versículos 4 a 25