“Pela fé Abraão, sendo chamado, obedeceu, saindo para um lugar que havia de receber por herança; e saiu, sem saber para onde ia” – Seu chamado para sair era por meio de um comando e uma promessa. A fé exigia obediência ao comando. A promessa de uma herança não foi cumprida e ainda está no futuro. Mas ele exercitou fé através da sua vida e nunca se esgotou por causa da falta de cumprimento em seus dias. Também lhe foi prometido uma grande semente, que vem se cumprindo através dos séculos.
Abraão manteve seu caráter de estrangeiro neste mundo pela fé, e deleitou-se na partilha de pensamentos de Deus sobre o presente e o futuro. Quando deixou o seu país ele não sabia que Canaã seria a sua eventual herança; ficou sabendo disso só depois de chegar lá (Gênesis 12:7). Ele se satisfazia em caminhar apenas pela luz que Deus lhe deu.
“Pela fé peregrinou na terra da promessa, como em terra alheia, habitando em tendas com Isaque e Jacó, herdeiros com ele da mesma promessa... ” - “Peregrinou” traduz o aoristo de "paroikeo", que é habitar como um "paroikos", um peregrino. Isaque e Jacó são mencionados como que entre parênteses, e também não tiveram habitações fixas. Deus fez a promessa a eles também, portanto eram co-herdeiros; mas Abraão é a pessoa que tem a liderança nesta relação.
“... porque esperava a cidade que tem os fundamentos, da qual o arquiteto e edificador é Deus”- O verbo “esperar” vem de "ekdechomai" (gr.) que significa “esperar ansiosamente” (ver o capítulo 10:13). O artigo definido "a" (da cidade) a coloca em marcante contraste com todas as construções humanas. Enoque filho de Caim foi o primeiro a construir uma cidade aqui. As tendas dos patriarcas não tinham fundamentos. A Jerusalém Celestial, a morada dos remidos, tem Deus como “technites” (gr.) - construtor; o Criador é indicado na palavra “demiourgos” (gr.) - autor. No versículo 16, Ele é mencionado como o Preparador. Esta cidade está destinada a descer do Céu (Apocalipse 3:12; 21:2 - ver também 21:10; 22:19); consiste na comunidade dos santos glorificados. Abraão, em sua vida depois da ressurreição, terá sua herança terrena, e, ao mesmo tempo, em razão da sua vida e ressurreição em corpo glorificado, será um habitante da Jerusalém Celestial.
Pela fé Sara recebeu o poder de conceber um filho aos noventa anos de idade, aproximadamente, tendo passado da idade em que lhe seria naturalmente possível. Ela “teve por fiel aquele que lho havia prometido”, pois não apenas havia passado da idade natural, mas era também estéril (Gênesis 11:30, 16:2). Abraão estava chegando aos cem anos, idade em que seria humanamente quase impossível para um homem gerar um filho. Mas Sara sabia que Deus lhe havia prometido um filho, e sabia que para Ele tudo era possível. Ela tinha fé inabalável que Ele cumpriria Sua promessa.
Assim de um casal, como que amortecido, surgiu Isaque e dele uma descendência grande e inumerável como as estrelas do céu e a areia do mar. Em Romanos 4:19 e Isaías 51:1 e 2, Abraão é comparado a uma rocha de onde se talhavam pedras e Sara à caverna de um poço de onde foram escavadas.
Observações:
- Com referência aos mencionados no versículo 9, Abraão, Isaque e Jacó, “Todos morreram na fé, sem terem alcançado as promessas; mas tendo-as visto e saudado, de longe, confessaram que eram estrangeiros e peregrinos na terra.” As promessas foram feitas a eles, mas nenhum chegou a ver seu cumprimento: Abraão só teve um filho herdeiro da promessa, Isaque; este teve dois filhos gêmeos, mas só um deles, Jacó, foi herdeiro da promessa; Jacó teve doze filhos e foi morar com eles no Egito, abençoando-os e morrendo aos 147 anos de idade, longe da terra prometida, Canaã.
- Todos perceberam que seu repouso final não seria neste mundo, reconheceram que eram estrangeiros e peregrinos e se contentaram com isso, recusando o desejo de se estabelecer no conforto daqui, enfim, decidiram passar pelo mundo sem absorver qualquer das suas características. Sua fé lhes deu certeza que as promessas de Deus seriam cumpridas, e ansiavam por uma pátria onde pudessem estabelecer seu lar permanente e esta não era a terra do seu nascimento.
- Se Abraão tivesse desejado voltar para a Mesopotâmia, ele poderia ter ido, mas seu lar não estava mais ali. O que estavam procurando, na verdade, era uma pátria celeste. Isso é bastante notável quando nos lembramos que a maioria das promessas ao povo de Israel tinha a ver com bênçãos materiais nesta terra. No entanto, eles tinham uma esperança celestial também, e esta esperança lhes permitiu tratar este mundo como um país estrangeiro. Este espírito de peregrinação é especialmente agradável a Deus e Ele preparou uma cidade para eles, onde encontram repouso, satisfação e perfeita paz
- Deus mandou Abraão sacrificar seu único filho, Isaque, sobre o altar. Obediente, Abraão preparou-se para oferecer a Deus o que lhe era mais precioso. Teria ele estranhado essa instrução? Afinal, Deus lhe havia prometido inúmeros descendentes. Isaque era o seu único filho legítimo com Sara. Abraão agora já tinha 117 anos e Sara 108. A promessa de uma grande série de descendentes deveria ser cumprida em Isaque mas como poderia ser cumprida se ele fosse morto? Isaque estava agora com dezessete anos e ainda solteiro.
- Abraão concluiu que se Deus exigia a morte do seu filho, era porque Deus o ressuscitaria em seguida, para cumprir a Sua promessa (até este momento, nenhuma ressurreição havia sido constatada e de certa forma Abraão até inventou a idéia de ressurreição). Confiando na promessa de Deus, Abraão levou Isaque ao altar improvisado sobre o monte e ia sacrificá-lo, quando no último momento o “anjo do Senhor” interferiu e permitiu que Abraão sacrificasse um carneiro em seu lugar. Devemos aqui esclarecer que Deus evidentemente não intencionava permitir que Abraão sacrificasse o seu filho, mas isto foi um teste para provar a sua fé. Deus mesmo impediu que Abraão cometesse esse homicídio, quando sua fé e obediência foram evidenciadas.
- Além disso, a fé de Abraão na promessa de uma numerosa descendência foi testada ao longo de um período de cem anos. O patriarca tinha setenta e cinco anos quando a primeira promessa de um filho lhe foi feita, e ele ainda esperou vinte e cinco anos até o nascimento de Isaque. Isaque tinha cerca de dezessete anos quando Abraão o levou ao monte Moriá para oferecê-lo a Deus. Isaque casou-se aos quarenta anos e os gêmeos nasceram vinte anos depois. Abraão morreu aos 175. A essa altura seus descendentes consistiam apenas de um filho (setenta e cinco anos de idade) e dois netos gêmeos (quinze anos de idade). Ainda durante sua vida, "não vacilou por incredulidade, antes foi fortalecido na fé, dando glória a Deus, e estando certíssimo de que o que Deus tinha prometido, também era poderoso para o fazer.” (Romanos 4:19-21).
À primeira vista, a fé de Isaque, de Jacó e José, não parece muito notável, da maneira como está descrita brevemente nos três versículos seguintes, 20 a 22. São três exemplos de fé na Palavra de Deus exercida pouco antes de morrer.
Isaque abençoou Jacó e Esaú a respeito do que iria acontecer com eles no futuro, conforme Gênesis 27, versículos 28 a 40. Eram gêmeos, mas Esaú veio à luz primeiro e por isso pensava ser o herdeiro principal das promessas de Deus ao seu avô Abraão e seu pai Isaque. Mas antes deles nascerem, o Senhor já anunciara a Rebeca, sua esposa, que os dois dariam origem a duas nações, e que a do mais velho (Esaú) iria servir a do mais novo (Jacó).
Esaú era o favorito de Isaque e, como o filho mais velho, normalmente receberia a melhor parte da herança do seu pai. Quando Isaque já estava cego por causa da sua idade avançada, e sabendo que estava chegando ao fim da sua longa vida, ele marcou um dia para transmitir sua bênção final aos filhos. Antecipando que Isaque daria a melhor parte a Esaú, Rebeca fez com que Jacó assumisse a identidade de Esaú para recebe-la. Quando Esaú se apresentou mais tarde, o logro foi exposto e Isaque tremeu violentamente. Mas lembrou-se da palavra de Deus que o mais velho serviria o mais jovem, e conformou-se com a vontade de Deus pronunciando sobre Esaú uma bênção inferior e anunciando a sujeição dos descendentes de Esaú aos de Jacó. Sem dúvida doeu-lhe o coração, mas foi obediente por causa da sua fé.
A bênção de Jacó sobre os filhos de José foi um ato de fé, que implica a convicção do cumprimento dos detalhes da bênção de Deus sobre seus netos nascidos no Egito.
Houve muitos episódios inglórios na vida de Jacó mas, não obstante, ele é honrado como herói da fé. Seu caráter melhorou com a idade e ele morreu em uma explosão de glória. Quando abençoou Efraim e Manassés, os filhos de José, ele cruzou suas mãos para que a bênção do filho mais velho caisse sobre Efraim, o mais jovem. Apesar dos protestos de José, Jacó insistiu que as bênçãos deviam permanecer assim porque esta era a ordem que o Senhor tinha especificado. Embora sua visão física fosse fraca, sua visão espiritual estava bem clara.
A cena final da vida de Jacó o apresenta adorando enquanto se inclinava sobre a extremidade do seu bordão, oferecendo homenagem a Deus. Seu bordão tinha sido usado por ele 50 anos antes como um companheiro em sua peregrinação (Gênesis 32:10). C. H. Mackintosh comenta em seu belo estilo habitual:
“O encerramento da carreira de Jacó contrasta de forma mais agradável com todas as cenas anteriores da sua atribulada história. Lembra uma noite serena após um dia tempestuoso: o sol, que durante o dia tinha estado escondido de vista por nuvens, neblinas e nevoeiros, define-se em majestade e brilho, dourando o oeste com os faróis do céu e trazendo a perspectiva de um futuro brilhante. Assim aconteceu com nosso patriarca envelhecido. A suplantação, a pechincha, a astúcia, a manipulação, o desvio, o embaralhamento, os temores incrédulos egoístas, todas aquelas nuvens escuras da natureza e da Terra parecem ter desvanecido, e ele vem para a frente, em toda a elevação calma da fé, para conceder bênçãos e outorgar dignidades, nessa habilidade santa que somente a comunhão com Deus pode transmitir.”
A fé de José também continuou firme até a sua morte. Cria na promessa de Deus que Ele tiraria o povo de Israel do Egito. Mediante a fé ele podia considerar o êxodo como passado. Era tão real para ele, que instruiu seus filhos a levarem os seus ossos com eles para serem enterrados em Canaã. Em sua mente, embora rodeado pelo esplendor e pompa do Egito, o seu coração não estava lá, mas com o seu povo em sua futura glória e benção. Longe de apegar-se ao Egito, José segurou as promessas de Deus, na certeza da retirada do seu povo do Egito, reivindicando a sua quota em seu destino e em sua herança. Suas instruções sobre levarem os seus ossos não eram por simples sentimento, mas expressam sua fé e certeza de ressurreição e, como seus pais, de posse da terra da promessa (que será efetivada no reino milenar de Cristo).
8 Pela fé Abraão, sendo chamado, obedeceu, saindo para um lugar que havia de receber por herança; e saiu, sem saber para onde ia.
9 Pela fé peregrinou na terra da promessa, como em terra alheia, habitando em tendas com Isaque e Jacó, herdeiros com ele da mesma promessa;
10 porque esperava a cidade que tem os fundamentos, da qual o arquiteto e edificador é Deus.
Hebreus capítulo 11, versículos 8 a 10